Título: Mercados ignoram aperto europeu
Autor: Guimarães, Luiz Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 04/08/2006, Finanças, p. C2

O mercado americano rechaçou logo a interpretação de que o Federal Reserve (Fed) poderia seguir a orientação de maior aperto monetário sugerida ontem pelos bancos centrais europeus. Para os analistas, ocorre o contrário: atrasados, são o BCE e o Banco da Inglaterra (BOE) que correm atrás do Fed. Por isso, só causou um leve tremor matinal as decisões do BCE de elevar a taxa da zona do euro em 0,25 ponto, para 3%, e do BOE de descongelar a taxa básica dos 4,5% em que se mantinha há dois anos, elevando-a para 4,75%. Afinal, para núcleos de inflação parecidos (2,5% ao ano), a Europa ainda pratica juros modestos frente aos 5,25% americanos. Por si mesmas, as decisões do BCE e do BOE não pesam na que o Fed irá tomar na próxima terça-feira. Esta interpretação autorizou a continuidade do processo de recuperação dos mercados.

-------------------------------------------------------------------------------- BC persiste com mão pesada no câmbio --------------------------------------------------------------------------------

A nova bússola financeira mundial - o mercado de ações de Nova York - desprezou as visões de crise. O Dow Jones avançou 0,38% e o Nasdaq, 0,65%, permitindo à Bovespa valorizar-se 0,43%. Os juros dos treasuries de 10 anos ignoram qualquer coisa ao seu redor e não saem de 4,96%. O indicador americano que será divulgado hoje tem mais potencial de mexer com os mercados do que qualquer aperto monetário europeu. Sai hoje o payroll, o relatório oficial sobre emprego. O dado é fundamental porque, por estatuto, o Fed persegue o pleno emprego com o mínimo possível de inflação. Na mediana, o mercado espera a criação de 143 mil novas vagas em julho. O indicador pode selar a sorte da reunião de política monetária do dia 8. Número aquém de 140 mil novos postos irá exigir imediata interrupção do ciclo de alta dos juros. Informe mais perto dos 150 mil pode determinar novo avanço de 0,25 ponto, para 5,5%. Este degrau mais elevado ainda não está inteiramente precificado, por meio de mecanismos de proteção, pelos fundos.

Os indicadores divulgados ontem não foram conclusivos. Enquanto o índice de atividade não manufatureira caiu de 57,0 para 54,8, ante expectativa de que permaneceria em 57,0, contraditoriamente os novos pedidos de bens manufaturados cresceram 1,2% em junho frente a 1% em maio.

Os mercados domésticos acompanharam a melhora externa. O dólar caiu 0,18%, para R$ 2,1780, apesar de o Banco Central persistir com mão pesada nos seus leilões diários de compra. Só nos três primeiros pregões de agosto já teria adquirido cerca de US$ 800 milhões. Em julho, se ao superávit cambial de US$ 2,492 bilhões for acrescida a redução de US$ 2,61 bilhões ocorrida nas posições compradas dos bancos chega-se a um total de compras diretas pelo BC de US$ 5,102 bilhões. Não deve ser diferente em agosto.

No mercado monetário, a surpresa foi a fria acolhida dada pelos bancos ao primeiro leilão de títulos prefixados pelo Tesouro Nacional. Dos 5,1 milhões de papéis, ele vendeu 4,51 milhões e a juros mais elevados. O juro da LTN com resgate em abril de 2007 subiu de 14,454% para 14,485%. A taxa do lote com vencimento em janeiro de 2009 avançou de 14,847% para 14,959%. O motivo não tem nada a ver com alguma suspeita de que o BC terá de elevar o juro a partir do ano que vem. A justificativa é a superoferta de papéis prefixados este mês, incompatível com o apetite dos bancos.