Título: Brasil diz que México faz o jogo dos ricos
Autor: Moreira ,Assis
Fonte: Valor Econômico, 05/04/2012, Brasil, p. A5

Faltando duas semanas para a reunião de ministros de Comércio do G-20 no México, o Brasil rechaça enfaticamente a agenda proposta pelos mexicanos, considerando que ela é um enfeite para empurrar objetivos de liberalização de países ricos.

"A agenda proposta pelos mexicanos não nos agrada e atende essencialmente aos interesses dos países desenvolvidos"", afirmou ao Valor o subsecretário de Assuntos Econômicos e Comerciais do Ministério das Relações Exteriores, Valdemar Carneiro Leão. "Parece uma agenda da OCDE [formada pelos países ricos] e não atende aos interesses do Brasil.""

A reunião de ministros de países desenvolvidos e emergentes, que respondem por mais de 80% da produção mundial, está marcada para dias 19 e 20 em Puerto Vallarta. Será o primeiro grande debate sobre o impacto de cadeias globais de produção no comércio internacional, novas maneiras de medir fluxos comerciais e o impacto nos desequilíbrios globais.

O México preside o G-20 este ano. Na agenda mexicana, obtida pelo Valor, os ministros deveriam buscar uma "nova narrativa comercial"", e levar em conta que serviços e facilitação de comércio são "lubrificantes"" para as cadeias globais de produção e abastecimento.

Para os mexicanos, um dos "resultados desejados"" do encontro é que os ministros se comprometam, no curto prazo, a "simplificar procedimentos aduaneiros e remover outros custos desnecessários ao comércio, promover abertura de serviços que apoiem cadeias de valor agregado e assegurem financiamento comercial"".

Para o Brasil, essa agenda é desequilibrada, ignora a liberalização agrícola, tema central da Rodada Doha, e as demandas dos países mais pobres. Na prática, apenas beneficiaria os interesses exportadores dos países desenvolvidos, que enfrentam crescimento lento e precisam vender mais.

O Brasil e outros países em desenvolvimento advertiram o México desde o mês passado sobre a agenda do encontro. Para alguns países, o que está por trás do tema de cadeias globais de produção, na prática, é mostrar que um déficit comercial não é exatamente o que parece, e não haveria necessidade de reagir para frear importações que causam prejuízos sérios à indústria nacional. Ou seja, é a busca de uma ""bandeira antiprotecionista"" para a OMC.

Existe interesse econômico e político para se contabilizar as cadeias global de abastecimento e suprimento nas estatísticas do comércio internacional. A China, por exemplo, acha que isso pode ajudar a atenuar as pesadas criticas dos EUA sobre o enorme superávit comercial chinês com os americanos.

Um exemplo é o iPhone, da Apple. Pela estatística tradicional, a China teve saldo comercial de quase US$ 2 bilhões com os EUA apenas na exportação do aparelho em 2009. Mas, se os números levassem em conta que vários componentes foram importados de outros países, o saldo chinês com os EUA declina para US$ 74 milhões.

Para representantes brasileiros e também dos demais integrantes dos Brics (Rússia, Índia, China e África do Sul), esse é um debate teórico importante e que pode ter papel relevante em futuras rodadas de negociação. Mas acham que não pode ter implicações práticas e diretas para se tentar acelerar liberalizações seletivas na OMC no momento.

É que a agenda feita pelo México dá ênfase a "serviços e facilitação de comércio como essenciais para lubrificar as cadeias globais de produção"". Argumenta que o comércio de serviços pode elevar o valor agregado na produção industrial e competitividade. Atualmente, EUA e União Europeia tentam lançar uma negociação especifica entre países que aceitarem participar. Os Brics estão fora.

Os mexicanos afirmam que medidas para facilitação de comércio vão melhorar o funcionamento das cadeias globais. Estimam que atrasos e ineficiência nas aduanas tendem a elevar os custos das transações em até 15% do valor da mercadoria. Para vários emergentes, incluindo o Brasil, negociação de serviços e facilitação de comércio não estão na agenda no momento.