Título: Analistas projetam semestre mais aquecido
Autor: Durão, Vera Saavedra
Fonte: Valor Econômico, 04/08/2006, Brasil, p. A4

O aquecimento da demanda interna - estimulada pelo aumento do rendimento real do trabalho, mais oferta de crédito abundante e queda do juro -, deverá conduzir a economia a uma taxa de crescimento superior a 4,5% no segundo semestre do ano, ritmo acima dos 2,8% a 3% projetados para os primeiros seis meses do ano por economistas ouvidos pelo Valor.

O comportamento do terceiro trimestre deverá contribuir para esse bom desempenho. A expectativa da área de macroeconomia do Bradesco é de que o Produto Interno Bruto (PIB) trimestral do período julho/setembro alcance 1,2% em relação ao segundo trimestre (na taxa com ajuste sazonal), superando os 0,5% estimados para o segundo trimestre em relação aos primeiros três meses do ano. "O impacto favorável da redução de 500 pontos na taxa Selic nos últimos nove meses vai se traduzir em algum crescimento", afirma Octávio Barros, diretor de pesquisa macroeconômica do banco.

No cenário desenhando pela equipe de Barros, o PIB do segundo trimestre, cujo resultado oficial será divulgado no final do mês pelo IBGE, deverá crescer 0,5%, uma taxa bem abaixo da estimada para o terceiro trimestre. Os efeitos da Copa do Mundo - que reduziram o número de dias úteis no mês de junho e assim afetaram tanto a produção como o comércio - justificam essa baixa previsão.

Este percentual é considerado baixo por outros economistas, como Eduardo Velho, da consultoria Mandarim, que trabalha com 1,3% para abril/junho. Mas o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) que projetava uma taxa de 1,2% para abril/junho, já está revendo para baixo esta projeção.

Estevão Kopschitz, economista do Ipea que trabalha com indicadores de nível de atividade no Grupo de Análise Conjuntural (GAC), informou que se o resultado da indústria no segundo trimestre ficar abaixo do esperado pelo Ipea, poderá influir no resultado trimestral e por tabela até mesmo na projeção anual do PIB. O Ipea trabalha com uma taxa de expansão do PIB de 3,8%, em 2006.

Hoje, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulga o dado da produção industrial de junho. O Ipea projeta queda de 0,7% em relação a maio e alta de 1,2% em relação a junho do ano passado. "Se esta previsão se confirmar, a indústria terá crescido 2% de abril a junho, ou um ponto percentual abaixo dos 3% previstos no nosso Boletim e o PIB do segundo trimestre poderá vir abaixo dos 1,2% que prevíamos", calculou Kopschitz.

Eduardo Velho, da Mandarim, desenha um cenário diferente, onde a economia avança mais no segundo trimestre do que no terceiro. Ele prevê taxa de crescimento de 1,35% para o PIB abril/junho e de 1,1% para julho/setembro, com ajuste sazonal. Na sua análise, o que importa nestas projeções é a trajetória da taxa dessazonalizada acumulada em 12 meses. Para ele, esse é o indicador "que sinaliza mais forte a tendência de aceleração da economia".

Nos suas contas, esta taxa acumulada salta de 2,2% no segundo trimestre, para 3,1% no terceiro e chega entre 4% a 4,5% nos últimos três meses de 2006. Velho chama a atenção para um aspecto desse cenário. "Já no terceiro trimestre a taxa acumulada do PIB efetivo estará crescendo mais que o PIB potencial estimado entre 2,7% a 3% por alguns economistas estudiosos do conceito, incluindo ai o próprio Banco Central.

O economista vê neste "hiato negativo" ( diferença entre PIB efetivo e PIB potencial) a razão pela qual a autoridade monetária está cautelosa em relação ao ritmo atual da queda do juro. "Estamos entrando no segundo semestre com uma demanda muito mais forte do que a do primeiro e há algumas dúvidas se o investimento vai continuar crescendo para sustentar esse cenário. Como vai se comportar o efeito defasado da queda do juro em relação aos preços? O BC está olhando para isto e mirando direto 2007".

Eduardo Velho vê a demanda doméstica aumentando muito neste segundo semestre, impulsionada pelo que denomina de fatores propulsores do consumo ou "benesses fiscais eleitorais", tais como reajuste de 16% do mínimo, aumentos salariais com ganhos reais, massa salarial real crescendo entre 5% a 6% no ano, maior gasto público corrente e oferta abundante de crédito. "É preciso constatar que o aquecimento do consumo ocorrerá, em principio, com inflação baixa".

Ele ressalta que o quadro atual é do varejo descolando da indústria devido ao aumento da importação, principalmente de bens duráveis. De janeiro a julho, esta importação cresceu 74%. "Se tem um câmbio baixo que estimula a importação, isso gera um efeito de substituição do fornecedor interno ou seja, a indústria, pelo externo. Isto é negativo para o crescimento do PIB potencial", realça. Ele não crê, no entanto, que tal situação possa ocorrer em 2006.