Título: Regime automotivo muda projetos de montadoras
Autor: Laguna,Eduardo
Fonte: Valor Econômico, 09/04/2012, Empresas, p. B8

Conhecido o teor do novo regime automotivo, que passa a valer no próximo ano, empresas que anunciaram planos de produzir carros no Brasil começam a redimensionar seus projetos para atender às exigências do governo.

Junto com regras de transição para abrigar novos investimentos, as medidas anunciadas na semana passada incluíram maior rigor no processo de nacionalização dos veículos, o que terá implicações em custo, escala e taxas de retorno das fábricas que vierem a ser instaladas.

Devido a isso, desde que o ministro Fernando Pimentel (do MDIC - Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior) anunciou na terça-feira as linhas gerais do programa, montadoras interessadas em fabricar veículos no Brasil discutem uma nova formatação para seus projetos.

Novas regras alteram custos, volume de produção e taxas de retorno para fábricas que vierem se instalar

A definição de uma fase de transição - para que as marcas novatas pudessem gradualmente alcançar as exigências fixadas aos fabricantes já instalados - era uma condição para levar os planos adiante. Essa demanda foi contemplada, mas, por outro lado, o governo também apresentou exigências adicionais em relação a processos industriais, investimento em inovação e eficiência energética.

Além disso, ao vincular incentivos tributários ao uso de componentes regionais, fechou as portas para as montadoras que desejavam entrar no país a partir da montagem dos kits de peças enviados do exterior, no sistema conhecido como CKD.

Nos próximos dias, representantes da CN Auto - importadora que planeja produzir veículos utilitários no Espírito Santo - vão para a China discutir a adequação do projeto com potenciais sócios do país, casado da Hafei, fabricante da van Towner.

Esse não é um caso isolado. A fabricante de caminhões chinesa Foton - assessorada no Brasil pelo ex-presidente do BNDES Luiz Carlos Mendonça de Barros - também voltou a se debruçar sobre o projeto de sua fábrica no país, cuja localidade ainda não foi definida.

"As medidas dão mais prazo para a nacionalização do produto, mas o projeto de fábrica fica bem diferenciado em relação à concepção inicial, inclusive em termos financeiros", diz Ricardo Strunz, diretor da CN Auto.

"Começamos um estudo sobre o que era o projeto e o que vai ser a partir de agora", acrescenta o executivo, que espera bater o martelo sobre a construção da nova fábrica até maio.

As mudanças também vão atingir as montadoras já instaladas, dado que a própria Anfavea - entidade que representa a indústria nacional de veículos - reconheceu que nem todos os fabricantes estão preparados para atender ao programa, batizado de Inovar-Auto.

Um dos pontos críticos são os dispêndios em inovação - de 0,15% do faturamento para pesquisa e desenvolvimento e 0,5% para engenharia, tecnologia industrial e desenvolvimento de fornecedores -, estipulados em patamares bem superiores ao que a indústria nacional está acostumada a investir.

Já em relação aos processos industriais, o novo regime determina a realização no Brasil de pelo menos oito de doze etapas de produção de carros, subindo para dez etapas a partir de 2016. No formato atual, exige-se o cumprimento de apenas seis etapas fabris, como montagem, estampagem, fabricação de motores e pintura. Na impossibilidade de cumprir com essa parte do regime, a montadora será obrigada a realizar os percentuais mínimos de investimento em pesquisa e tecnologia, além de aderir ao programa de etiquetagem do Inmetro, que atesta a eficiência energética dos carros.

Para ter acesso aos descontos no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), as montadoras ficarão obrigadas a cumprir com três dos quatro requisitos elencados em decreto que regulamenta o regime automotivo.

No caso das montadoras com planos de produzir no país, a principal flexibilização vem da geração, por dois anos, de crédito tributário que poderá ser usado para abater o IPI após a inauguração da fábrica. Elas também poderão aumentar gradualmente os investimentos em inovação e engenharia, de forma a cumprir 100% das exigências apenas no terceiro ano de produção no país.

Atendidos todos os requisitos, tanto os fabricantes nacionais quanto aqueles que vierem a se instalar no país vão abater o aumento de 30 pontos percentuais do IPI com o crédito gerado pelas compras de autopeças regionais - adquiridas no Brasil ou demais países do Mercosul.

Quanto maior o volume de compras, maior será o desconto, até a totalidade da majoração do tributo. Se fossem mantidas as regras atuais, todas as montadoras com conteúdo regional inferior a 65% teriam que pagar os 30 pontos adicionais, sem qualquer desconto.

Assim, o novo formato mantém barreiras a importações, mas acomoda reivindicações das montadoras interessadas na produção local, que pediam melhores condições para desenvolver a marca durante a construção das fábricas e diziam não conseguir atender tão rápido as atuais exigências de nacionalização.