Título: Governistas pedem mudanças antes de Orçamento impositivo
Autor: Izaguirre, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 04/08/2006, Política, p. A7

Se depender da base governista, a proposta de emenda constitucional que transforma em impositivos os orçamentos públicos, aprovada recentemente pelo Senado, só terá alguma chance de passar também pela Câmara depois de alteradas as normas internas de tramitação dos projetos de lei orçamentária da União no Congresso. Quem afirma é o presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO) e aliado do governo, deputado Gilmar Machado (PT-MG).

"Sem mudança nas regras de tramitação, não há hipótese de a PEC 22 ser aprovada aqui", disse ele, em entrevista ao Valor. Atualmente, os orçamentos aprovados pelo Poder Legislativo são autorizativos. O Executivo tem a opção de não realizar todos os gastos previstos.

Por causa da PEC, os governistas, que já contam com a reeleição do presidente Lula, temem que o governo seja obrigado a executar toda e qualquer despesa incluída pelos parlamentares sem que haja antes uma moralização do processo de emendas à peça orçamentária. O projeto de resolução número 2/2005 do Congresso Nacional, que busca tal moralização, está, em tese, pronto para ir a plenário. Apesar de exaustivos debates, até agora, porém, não há acordo para sua votação, informa o autor do texto, deputado Ricardo Barros (PP-PR).

A estratégia dos aliados de Lula de condicionar a PEC a outras mudanças é confirmada pela senadora Ideli Salvatti (PT-SC). "Não se pode impor ao governo um Orçamento cujo processo de emenda é viciado. O fato de aprovarmos a PEC aqui (no Senado) não significa que haja compromisso de aprovação lá (na Câmara)". Outro governista que defende a mudança das normas de tramitação antes de o Orçamento tornar-se impositivo é o senador Romero Jucá (PMDB-RR). "Tem que mudar completamente" diz ele, para quem algumas despesas de custeio não podem ser impositivas.

O governo prepara um projeto de lei complementar (PLC) sobre a estrutura e execução dos orçamentos públicos, para substituir a Lei 4.320, de 1964. Com isso, quer compatibilizar a legislação de finanças públicas com a Lei de Responsabilidade Fiscal, que é de 2000, e ainda tornar permanentes regras que vêm se repetindo nas leis de diretrizes orçamentárias (LDOs), de vigência anual. Segundo fontes governamentais, por se tratar de matéria de norma interna do Congresso, regras sobre emendas ao Orçamento não podem ser objeto desse mesmo PLC.

O projeto de resolução interna que altera a intervenção do Congresso no Orçamento visa a combater, entre outros problemas, as chamadas "rachadinhas", isto é, o desvirtuamento do caráter coletivo das emendas de bancadas estaduais e de comissões temáticas. Para assegurar que sirvam a obras de interesse nacional, o texto de Ricardo Barros exige que tais emendas se destinem a projetos de grande vulto e proíbe que contemplem ações orçamentárias genéricas, sem definição precisa do que será feito com o dinheiro. Tal definição hoje não é exigida. Na lei orçamentária, a descrição pode ser genérica (melhoria da infra-estrutura de saúde num Estado ou região, por exemplo). Isso propicia que recursos de emendas coletivas sejam desdobrados em pequenas obras de caráter eleitoreiro.

Outro dos problemas que o texto de Barros visa a combater é o uso de emendas individuais para repassar recursos a entidades cujo verdadeiro propósito é a sustentação política e eleitoral dos próprios parlamentares que as propõe. Ricardo Barros e Gilmar Machado reconhecem que, entre as que recebem verba federal a partir de emendas do Congresso, há entidades filantrópicas e outras organizações não-governamentais controladas por deputados, por intermédio de parentes ou amigos. Se as mudanças propostas forem adotadas, haverá uma seleção e habilitação prévia de entidades. Só poderão ser beneficiadas com emendas aquelas previamente identificadas e submetidas à aprovação da CMO.

O Orçamento impositivo exigiria do Congresso mais responsabilidade sobretudo ao reestimar a receita da União. Essa é outra questão tratada no projeto de resolução do processo orçamentário. Haveria no máximo duas reestimativas em relação ao número original do Executivo, uma delas antes do parecer preliminar do relator-geral. Além disso, todos os anos seria nomeado um relator específico para a receita. A proposta, porém, estaria esbarrando em resistências dentro do próprio PT. O PMDB, por sua vez, não quer o rodízio das relatorias setoriais do Orçamento entre os partidos, também previsto no projeto de resolução. Por ser o maior partido, pelas regras atuais, todos os anos o PMDB é o primeiro a escolher que área do Orçamento relatar.

Embora também o queira aprovado o quanto antes, Ricardo Barros discorda dos governistas quanto à vinculação da tramitação da PEC 22 a seu projeto de resolução. Por outro lado, ele diz que, enquanto uma nova resolução não for votada pelo Congresso, não permitirá a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2007. "Farei obstrução pessoal", afirma.