Título: Governadores resistem à Selic como indexador das dívidas
Autor: Oliveira,Ribamar
Fonte: Valor Econômico, 11/04/2012, Política, p. A3

Governadores de partidos da própria base aliada já fizeram chegar ao Congresso a informação de que não aceitam a proposta do governo federal, revelada pela ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, na semana passada, de usar a Selic em substituição ao IGP-DI como indexador das dívidas estaduais renegociadas pela União. Entre eles, estão os governadores do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, e do Rio Grande do Sul, Tarso Genro.

Na sexta-feira da próxima semana, Tarso Genro quer reunir alguns colegas para chegar a uma proposta comum e apresentá-la ao governo. Para esta reunião - que acontecerá um dia depois de alguns governadores irem à comissão especial da Câmara que discute a renegociação das dívidas -, Genro já convidou também alguns parlamentares.

Dois senadores do Rio também se manifestaram ontem contrários à troca do IGP-DI pela Selic como indexador. "A Selic é um instrumento de política monetária e ela poderá voltar a subir no futuro, se o Banco Central decidir que é necessário para controlar a inflação", argumentou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ). "Não faz sentido, portanto, utilizá-la como indexador, pois o próprio governo está tentando reduzir o estoque de seus títulos remunerados por essa taxa." Ele defende que o custo financeiro das dívidas seja dado pela Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP).

Para o senador Francisco Dornelles (PP-RJ), ex-ministro da Fazenda, o uso da Selic como indexador dos contratos é completamente inadequado. "Não se pode admitir que a dívida dos Estados seja balizada por uma taxa que é fixada pelo próprio credor", afirmou, numa referência ao fato de que é o Banco Central que defini a Selic. Ele acha que não se deve mais utilizar um índice para corrigir monetariamente as dívidas. "Precisamos acabar com a indexação da economia", defendeu.

Dornelles apresentou ontem um projeto de lei complementar autorizando a União a fazer uma nova renegociação dos débitos estaduais. De acordo com o projeto, o estoque da dívida de cada Estado existente até o momento da assinatura do atual contrato com a União seria corrigido pelo IPCA mais juros de 6% a 9% ao ano até o momento da aprovação da nova lei. A partir de então, os Estados passariam a pagar juro fixo de 3% ao ano sobre o estoque dos débitos, sem uso de índice para correção monetária.

O senador carioca disse que essa correção retroativa das dívidas, prevista em seu projeto, não afetará o cálculo da dívida líquida do setor público, que hoje é um dos principais indicadores da saúde financeira do governo brasileiro. Segundo Dornelles, a correção retroativa afetará os débitos dos Estados e, por conseguinte, os créditos da União, na mesma proporção. "Ela será, portanto, neutra no que se refere à dívida líquida", explicou.

Na conversa com os senadores e deputados de seus Estados, os governadores estão deixando claro também que desejam uma redução dos pagamentos dos juros que são obrigados a fazer mensalmente por conta das dívidas renegociadas e não apenas uma mudança do indexador. Atualmente, os Estados pagam de 11,5% a 15% de suas receitas líquidas reais por mês. Um projeto de autoria de Lindbergh Faria reduz o comprometimento atual da receita em dois pontos percentuais, o que, na opinião dele, abriria espaço para mais investimentos dos Estados.

O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, deverá ir ao Senado ainda esta semana para discutir essa questão e a proposta de nova repartição do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas compras feitas pela internet, o chamado comércio eletrônico. De acordo com fontes do governo, Barbosa será o principal interlocutor da área econômica com o Congresso sobre esses assuntos.

Há uma discussão intensa no Congresso para saber se há necessidade de mudar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para alterar os atuais contratos de renegociação. Isto porque o artigo 35 da LRF proíbe nova renegociação de débitos de Estados e municípios pela União. O governo acha, no entanto, que é possível mudar o indexador sem mexer na LRF.

Alguns políticos governistas manifestaram ontem preocupação sobre a capacidade do governo de controlar este processo, depois que aceitou abrir essa negociação sobre as dívidas. A proposta de trocar o atual indexador das dívidas (IGP-DI) pela Selic está sendo vista por alguns no Congresso como uma espécie de "bode", que poderá ser retirado da sala pelo próprio governo ao longo das negociações.