Título: Dilma cobra Obama por valorização de moedas de emergentes
Autor: Ribeiro ,Alex
Fonte: Valor Econômico, 10/04/2012, Brasil, p. A3

A presidente Dilma Rousseff cobrou ontem o líder americano, Barack Obama, pela valorização das moedas dos países emergentes, causada pela política monetária de países desenvolvidos. Para ela, os Estados Unidos têm uma responsabilidade maior em relação aos desequilíbrios cambiais globais porque o dólar é a principal moeda internacional de reserva.

Ontem, Dilma reuniu-se com Obama por uma hora e meia na Casa Branca, discutindo pontos de uma agenda positiva que incluiu um novo acordo na área de aviação, parceria em energias limpas e cooperação em ciência e tecnologia. Num pronunciamento no Salão Oval, Dilma saiu do tom ameno típico desses pronunciamentos e atacou a política monetária de economias avançadas, que, segundo ela, "compromete o crescimento dos emergentes". O mundo, afirmou, está diante de uma forma de protecionismo cambial.

Ao lado de Obama, Dilma disse que o problema principal são os países que adotam políticas monetárias expansionistas e que não usam seu espaço fiscal para estimular a economia, apesar de superavitários. Os Estados Unidos não parecem se encaixar nessa descrição porque têm um déficit fiscal projetado em 8% do Produto Interno Bruto (PIB) para 2012. Mais tarde, numa entrevista coletiva, Dilma esclareceu que se referia também aos americanos. "A diferença é que você emite moeda", afirmou, referindo-se ao papel internacional do dólar. Para ela, isso cria uma obrigação a mais dos Estados Unidos perante ao mundo.

A guerra cambial tem sido um tema recorrente nas viagens recentes de Dilma. Ela reclamou do "tsunami monetário" na Alemanha e voltou a atacar os bancos centrais de países desenvolvidos num encontro dos Brics na Índia. Ontem, Dilma foi questionada se a China, sempre poupada por ela nessas ocasiões, não seria uma peça importante nos desequilíbrios. "Acho que é diferente, até porque a China atrelou a sua moeda ao dólar", afirmou. "A moeda chinesa varia quando o dólar varia."

Dilma prometeu reagir à valorização do real. "O governo tem tomado e continuará tomando todas as medidas necessárias para neutralizar os efeitos nocivos do afrouxamento monetário que ocorre nos países desenvolvidos", disse, em um evento com empresários no fim da tarde.

No sua declaração ao lado de Obama, Dilma não citou barreiras comerciais aos produtos brasileiros - apenas agradeceu Obama pela derrubada das tarifa de importação sobre o etanol. Na entrevista, Dilma indicou que conversou com o presidente Obama sobre o cancelamento da licitação do Departamento de Defesa para a compra de aviões Super Tucano da Embraer -, mas não há novas indicações de solução para a questão. "O Brasil é o único dos Brics que tem um saldo comercial negativo com os Estados Unidos", afirmou. "Não se pode colocar barreiras diante de um volume de comércio tão expressivo."

No encerramento do encontro, Obama fez uma declaração de apenas dez minutos, metade do tempo ocupado por Dilma, afirmando que o Brasil está se tornando "um líder não apenas na região, mas também no mundo". Relatou também ter conversado com Dilma sobre "assuntos globais", como a situação no Oriente Médio.

Na entrevista, Dilma disse que a crise nuclear do Irã, ponto de atrito entre Brasil e os Estados Unidos no governo Lula, não foi discutida. Dilma relatou ter dito a Obama que o encontro de cúpula da América Latina em Cartagena, na Colômbia, na sexta-feira, deve ser o último sem a participação de Cuba. Na conversa, não foi discutida a pretensão brasileira de ter um assento no Conselho de Segurança da ONU - o comunicado do encontro renova o "apreço" americano a esse desejo.

Os resultados concretos da visita são o reconhecimento da cachaça brasileira nos Estados Unidos, o que significa que só o produto do Brasil poderá ser vendido lá como tal, e alguns acordos e parcerias, sobretudo na área de ciência e tecnologia, dentro do projeto do governo Dilma de levar 100 mil brasileiros a estudar no exterior. Foi anunciado ainda a abertura de dois novos consulados no Brasil para processar vistos, em Belo Horizonte e Porto Alegre. (*Especial para o Valor)