Título: Pioneiro propõe incentivo fiscal
Autor: Adachi, Vanessa
Fonte: Valor Econômico, 08/08/2006, Especial, p. A16

Jayme Garfinkel é um homem de fala mansa e que se expressa com grande humildade a respeito dos resultados de 15 anos de parceria com escolas públicas da favela de Paraisópolis, em São Paulo. "Não acho que acertamos em tudo e, portanto, não dá para dizer ´sigam a Porto Seguro´." Mas, com extremo senso prático, ele manda o seu recado: "também não adianta ficar querendo criar o modelo ideal antes de agir".

E, mesmo sem saber muito bem como começar, ele agiu. Sua empresa investe R$ 3 milhões por ano para dar suporte a três escolas estaduais em Paraisópolis e para custear integralmente um projeto de educação pré-escolar para crianças de 4 a 6 anos da comunidade. O orçamento anual da Associação Crescer Sempre é de R$ 3 milhões, metade aplicada nas escolas estaduais, que têm 6,7 mil alunos, e a outra metade na escola infantil, com 617 alunos. O início de tudo foi em 1991. Decidido a se envolver com a educação pública, seu primeiro impulso foi construir uma escola do zero. "Ao buscar informações, descobri que não faltavam escolas, mas que o problema era a deficiência do ensino."

Procurou a diretora da Escola Estadual Etelvina de Góes Marcucci e disse que queria ajudar. "Fiquei horrorizado ao descobrir que numa série estavam ensinando a independência do Brasil e que duas séries adiante os alunos aprendiam sobre o descobrimento do país. Isso tudo porque os professores não se coordenavam", recorda.

Em 1997, veio a parceria com a escola Homero dos Santos Fortes. e, em 2003, com a Maria Zilda Gamba Natel. No meio disso tudo, ainda nasceu a escola de educação infantil Crescer Sempre, criada do zero. "Nossa idéia foi fazer uma escola modelar, como se fosse para os nossos filhos", diz Garfinkel, que viu na Crescer Sempre a realização do sonho original de ter a sua escola.

O empresário diz que gostaria de ver uma espécie de "Lei Rouanet" para a educação, como forma de estimular mais empresas a fazer parcerias com escolas. "Seria excelente poder atrelar o tamanho do incentivo fiscal dado às empresas a uma avaliação de performance dos alunos", sugere.

Garfinkel diz que considerará suas iniciativas em Paraisópolis um sucesso no dia em que puder se ausentar. "O meu ideal é que a comunidade se envolva e se mobilize a tal ponto que a gente possa sair daqui." Ele quer doar os imóveis para a comunidade, que passaria a tocar o projeto sozinha.

A história do ex-inspetor de alunos Cláudio Fernandes da Costa ilustra o que Garfinkel quer dizer com envolvimento e mobilização da própria comunidade. Depois de montar um projeto de escolinha de futebol para os alunos da Escola Estadual Professora Etelvina de Góes Marcucci, ele foi sondado pela direção sobre seu interesse em cursar uma faculdade de educação física.

Com uma bolsa concedida pela Associação Crescer Sempre, ele cursou a Universidade Adventista, na Estrada de Itapecerica. A mensalidade de R$ 500 era superior aos R$ 450 que correspondiam ao seu salário da época. "Ter me formado mudou minha vida, melhorou meu nível social e influenciou a vida de toda a minha família", diz ele, hoje com 35 anos. Sua renda mensal é de R$ 2,2 mil, Costa está casado e tem duas filhas, conseguiu comprar um imóvel próprio financiado pela Caixa Econômica Federal e ainda ajuda os pais.

Mesmo depois de formado, Costa procurou não se afastar da comunidade de Paraisópolis. Ele trabalha como professor de educação física do próprio Etelvina e também da escola de educação infantil Crescer Sempre. Além disso, é voluntário em outros projetos como o Cidadanópolis, que visa estimular o exercício da cidadania . "Foi aqui que me fiz e quero continuar ajudando. Acho importante dar o exemplo de que é possível vencer as dificuldades." (VA)