Título: Mais votados não são eleitos
Autor: Jeronimo, Josie; Torres, Izabelle
Fonte: Correio Braziliense, 07/10/2010, Política, p. 7

Quociente eleitoral deixa 49 candidatos a deputado federal fora da Câmara, apesar de terem recebido mais votos do que adversários

Mais de 3,7 milhões de eleitores perderam os votos que destinaram aos escolhidos para o cargo de deputado federal graças ao quociente eleitoral. Esses votos representam o universo dos 49 candidatos de 20 estados que teriam o perfil da bancada modificado se os deputados fossem escolhidos pelo critério da maior votação em vez da regra proporcional. Juntos, eles tiveram 3.794.871 votos. Apenas Acre, Amazonas, Goiás, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Sergipe e Tocantins não registraram casos em que os mais votados perderam o pleito.

Em São Paulo, no Rio de Janeiro, em Minas Gerais, no Paraná e no Rio Grande do Sul, o quociente provocou as maiores distorções eleitorais na bancada eleita. Dos 70 deputados de São Paulo, pelo menos nove não ganhariam a cadeira se não fosse por votos herdados pela coligação. No Rio de Janeiro, oito candidatos derrotados receberam mais votos que os últimos colocados contemplados com uma das 46 cadeiras no estado.

Em Minas Gerais, a regra da proporcionalidade atingiu cinco candidatos. Destaque para Margarida Salomão (PT), que não teve sucesso, apesar da votação expressiva. Ela obteve 79.388 votos, quase o dobro de Dr. Grilo (PSL), que precisou apenas de 40.093 indicações para ser eleito. No Paraná e no Rio Grande do Sul, quatro candidatos em cada estado assistiram aos concorrentes com menos votos ganharem uma vaga na Câmara. O caso mais emblemático dos vencedores que ficaram de foram é o de Luciana Genro (PSol-RS).

O temido quociente eleitoral é calculado levando em conta todos os voto válidos obtidos. A partir daí, estipula-se quantos votos são necessários por cadeira. Mas, se um candidato alcançar mais votos do que o necessário para se eleger, a sobra é transferida para um dos companheiros de partido.

A imprevisibilidade das coligações também deixou o líder do PSDB na Câmara, João Almeida (BA), de fora da próxima legislatura. O tucano recebeu 80.180 votos e não conseguiu se reeleger, apesar de a última cadeira da bancada da Bahia ter ficado com Jânio Natal (PRP), apontado por 41.585 eleitores. Não adianta nada ganhar muitos votos, lamenta Almeida. Com menos de 6 mil votos, Chico das Verduras (PRP-RR) elegeu-se deputado federal deixando para trás Urzeni Rocha (PSDB-RR), que o superou nas urnas.

Anomalias As anomalias criadas pelo sistema proporcional no quadro político já estiveram em discussão no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) há dois anos, quando o candidato derrotado João Caldas (PR-AL) apresentou uma ação propondo o fim do quociente. O pedido foi negado, mas o plenário ainda vai analisar o mérito. Este ano, o mesmo deputado levou o assunto ao Supremo Tribunal Federa (STF). Ao julgar seu pedido, o ministro Gilmar Mendes disse que o assunto é interessante e que deveria ser discutido dentro da proposta de reforma política do Congresso. Mas a decisão sobre o tema poderá ser dada pelo Judiciário, pois outra ação propondo o fim do quociente tramita no Supremo. Apresentada pelo PR, ela tem como relator o ministro Celso de Mello, e pode entrar na pauta a qualquer momento.

"Não adianta nada ganhar muitos votos

João Almeida, deputado do PSDB-BA, que não conseguiu se reeleger

PSol injustiçado Em vez de cinco, três

A bancada eleita pelo PSol para a Câmara na próxima legislatura não faz justiça ao número de votos alcançado pela sigla. O partido continuará com três parlamentares, mas poderia ter feito pelo menos cinco. Se o sistema eleitoral brasileiro levasse em conta apenas o número de votos nominais, Chico Alencar (RJ), Ivan Valente (SP) e o novato Jean Wyllys (RJ) teriam a companhia de Luciana Genro (RS) e de Renato Roseno (CE) a partir de 2011. Luciana conquistou 126.501 votos, mas não foi eleita. Roseno também se destacou, com 113.705 votos.

Aos poucos, o PSol deixa de ser nanico. Randolfe (AP) foi eleito para o Senado e a sigla ainda pode ter outra parlamentar na Casa se a Justiça Eleitoral confirmar a vitória de Marinor Brito (PA). Os candidatos do PSol ao Senado receberam 2,3 milhões de votos este ano em 2006, foram 351.527. O patamar de votos nos candidatos a deputado chegou a 1 milhão.