Título: Itália relaxa meta de equilíbrio fiscal
Autor: Emsden,Christopher
Fonte: Valor Econômico, 19/04/2012, Internacional, p. A12

A Itália anunciou ontem que não vai equilibrar seu orçamento no ano que vem, como prometido, mas o primeiro-ministro Mario Monti afirmou que não está trocando medidas de austeridade por uma tentativa de aumentar o crescimento da economia.

Seu governo aprovou um plano de três anos que cortou a previsão de crescimento econômico este ano e insistiu que reformas profundas serão necessárias até muito tempo depois que seu governo de tecnocratas encerrar o seu mandato, daqui a um ano.

"O ceticismo quanto à dívida pública da Itália reflete o ceticismo quanto à vontade política de lidar com ela", disse Monti numa entrevista coletiva ontem.

Sua mensagem foi direcionada aos partidos políticos do país, que, segundo ele, tendem a representar lobbies e a ignorar o consumidor comum e os jovens.

Declarando que metade das famílias italianas está às voltas com problemas de emprego, ele divulgou o Plano Nacional de Reforma da Itália, que introduz políticas para criar empregos, fomentar a pesquisa, ampliar a rede de proteção social e desobstruir o sistema jurídico.

O plano, que precisa ser ratificado pelo Parlamento e enviado à Comissão Europeia, em Bruxelas, até o fim do mês, prevê que o Produto Interno Bruto da Itália vai se contrair 1,2% este ano, quase três vezes mais que o previsto em dezembro. Em vez de um orçamento equilibrado em 2013, a Itália terá um déficit de 0,5% do PIB.

Por outro lado, um programa de austeridade com ênfase em impostos está pesando sobre a atividade econômica do país.

No mês passado, a Espanha anunciou que vai adiar algumas de suas metas orçamentárias. Isso, mais o risco de que o ímpeto das reformas na Itália se enfraqueça, têm elevado os custos da dívida soberana de ambos os países e deflagrado o temor de que a crise regional de dívida esteja para entrar novamente em águas turbulentas.

O abandono de metas pela Itália "explica a recente elevação dos spreads", afirmou Analisa Piazza, estrategista da corretora Newedge, de Londres. "Mais volatilidade pode ser esperada para os próximos meses."

Ainda assim, a política fiscal da Itália está se apertando, disse o vice-ministro da Fazenda, Vittorio Grilli. O governo vai apresentar um superávit orçamentário de 0,6% do PIB no ano que vem, em termos estruturais, ajustados ciclicamente, disse ele. "Nossa consolidação fiscal está na verdade sendo reforçada", disse Grilli.

Sua medida, que modela a política fiscal para uma economia operando em todo o seu potencial, é a referência para o novo pacto fiscal da União Europeia, portanto a Itália não deve enfrentar pressões de seus parceiros da zona do euro.

O Fundo Monetário Internacional chegou a conclusão parecida, afirmando na terça-feira que a Itália não iria equilibrar seu orçamento antes de 2017, mas que no ano que vem atingirá um equilíbrio estrutural - sugerindo que a Itália não teria um déficit fiscal se a economia estivesse operando com todo o seu potencial.

Para aqueles que argumentam que a austeridade está estrangulando o crescimento, o rigor subjacente não é algo de se gabar. Usando os cálculos do próprio Tesouro de adversidades cíclicas, o déficit orçamentário "estrutural" de Roma seria € 55 bilhões (US$ 72 bilhões), menor do que os números principais sugerem para 2010 até 2013. Isso basta para cortar o crescimento em quase um ponto porcentual para cada um desses anos.

"Estamos claramente apertando a política fiscal numa recessão, o que piora as coisas", disse um experiente banqueiro italiano, acrescentando: "Infelizmente, não temos escolha".

Desde que Monti assumiu o poder na terceira maior economia da zona do euro, em fins do ano passado, ele deixou claro que seu ato principal - um pacote de € 20 bilhões de consolidação orçamentária - foi feito "para evitar um choque destrutivo". Ele trombou com lobbies poderosos, inclusive o de advogados e despachantes do país, com os maiores sindicatos trabalhistas e com a associação empresarial Confindustria, que ele recentemente descreveu como "só mais um sindicato".

A questão agora é como garantir que o crescimento potencial da Itália não sofra mais com uma crise com raízes nos excessos do sistema bancário mundial, disse ele.

Na Itália, austeridade tem sido a norma há mais de 15 anos. O país tem tido um superávit orçamentário primário - que exclui custos com juros da dívida pública acumulada no passado - em quase todos os anos desde meados da década de 90, graças a altas de impostos e a cortes no serviço público.

As medidas de liberalização e de simplificação aprovadas por decreto este ano vão acrescentar 2,4 pontos porcentuais ao PIB até 2020, segundo o documento aprovado pelo gabinete.

O impacto maior e mais imediato das reformas de Monti chegaram na forma de impostos mais altos. A carga fiscal total vai subir para 45,1% do PIB este ano, um recorde que será quebrado em 2013, segundo o novo planejamento fiscal. Esse número exclui a enorme economia informal da Itália, portanto o peso é bem maior para empregados e companhias que seguem a lei.

Monti já tentou minimizar o fardo sobre a atividade produtiva aumentando o imposto predial, os quais a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico estima serem menos de um quinto do que são nos Estados Unidos ou no Reino Unido.

Contudo, confusões em torno de quanto as famílias devem têm levado a confiança do consumidor a cair num país conhecido por alto índice de propriedade de imóveis e baixos níveis de dívida da casa própria. Giuseppe Roma, diretor do centro de estudos Censis, alertou que os preços de residências na Itália caíram 20% este ano por causa do novo imposto predial.

Com a dívida pública em 120% do PIB, Monti insiste que os políticos se concentrem em assegurar que as atuais políticas de austeridade não caiam em armadilhas que as perpetuem. As previsões do próprio governo põem um cronograma para esse risco. O superávit "estrutural" do orçamento italiano para 2013 deve se repetir em 2014, mas então começa a cair em 2015, o mesmo ano em que o orçamento convencional deve ser equilibrado.