Título: Europa tem poucas opções para estimular a economia
Autor: Fidler ,Stephen
Fonte: Valor Econômico, 27/04/2012, Internacional, p. A12

O perfil político da zona do euro está mudando. Países estão se afastando da coalizão liderada pela Alemanha, que promove a agenda de austeridade e que até agora tem dominado a abordagem da zona do euro para sua crise de dívida.

A coalizão da austeridade perdeu um grande apoio esta semana com a queda do governo do premiê conservador Mark Rutte na Holanda. No mês passado, a Eslováquia, um membro mais novo, debandou depois da vitória eleitoral socialista. O reduzido time da Alemanha conta agora só com a Finlândia e a pequena Eslovênia.

Por outro lado, a deterioração da economia da zona do euro deu munição para quem argumenta que é preciso mudar de curso.

Os dissidentes também ganharam força com a substituição, em novembro, de Silvio Berlusconi por Mario Monti como primeiro-ministro da Itália. Monti, um economista respeitado, pode passar sermões nos seus colegas da região sobre as desvantagens de uma dieta de austeridade sem ser suspeito, como era seu predecessor, de estar fugindo de seus compromissos.

Eleição após eleição vem derrubando governos nos últimos 15 meses. Na França, o socialista François Hollande é o favorito para suceder o atual presidente, Nicolas Sarkozy, no mês que vem. Em decisões-chave, Sarkozy, que tenta a reeleição, tem seguido a linha da premiê alemã Angela Merkel.

"A periferia tem sido reforçada numa época em que o norte foi enfraquecido", diz Mujtaba Rahman, analista do Eurasia Group em Nova York. "Monti provou ser capaz de articular, com credibilidade, as dificuldades de ajustes pró-cíclicos no sul, enquanto que a aliança alemã vem sendo debilitada pelos desdobramentos na Holanda e a ascensão de Hollande."

Esses acontecimentos já mudaram a retórica do debate econômico na Europa. Uma leva de luminares, como Merkel e o presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, começou a adotar lições da cartilha do crescimento, num aparente esforço de reduzir o hiato retórico entre eles e Hollande.

A grande questão, porém, é se essa mudança de tom vai levar a mudanças fundamentais nas políticas da zona do euro. E há muitas razões indicando que não vai, ou que só o fará muito lentamente.

Em primeiro lugar, como as políticas mudariam? Em discurso ontem, em Bruxelas, Monti enfatizou que a fórmula atual - de cortes de gasto público junto com reformas estruturais para facilitar a criação de empregos e os investimentos - "nunca vai gerar crescimento".

"Todas as reformas que estamos realizando não estão gerando crescimento, elas são deflacionárias", disse ele, acrescentando que "precisamos que haja demanda". Monti afirmou que não estava propondo gastos fiscais de "keinesianismo à moda antiga", que dariam um impulso "efêmero" à demanda, mas sim um aumento do investimento "privado, público-privado ou só público", por exemplo, em infraestrutura.

Não está claro como isso seria na prática. A Alemanha pode estar perdendo aliados, mas continua sendo a líder política e econômica da zona do euro. Retóricas de crescimento à parte, Merkel não tem mostrado sinais de que pretende mudar de curso.

Além disso, a ação alemã já imiscuiu austeridade nas estruturas da zona do euro e na lei dos países do bloco, por meio de mudanças introduzidas desde o início da crise de dívida. A Eslováquia e a Holanda podem mudar governos, mas o compromisso de manter as novas regras de orçamento continua.

A Alemanha poderá, a um certo ponto, estar tão segura quanto às novas regras fiscais que se tornaria disposta a considerar medidas mais radicais, como a emissão de dívida comum da zona do euro. Mas não vai fazer isso se a nova estrutura fiscal pela qual tanto lutou for por água abaixo no primeiro ano de existência.

Governos nacionais também poderiam transformar alguns de seus atuais gastos em investimento. Mas nem todos os governos têm margem de manobra para elevar os gastos em geral. E realocar gastos de outras áreas para investimentos não tem se mostrado fácil.

A Alemanha tem a capacidade orçamentária de elevar gastos, mas não tem mostrado vontade de usá-la. Os sinais da parte de Hollande sugerem que ele tampouco embarcaria numa febre de gastos - ele se arriscaria pagar o preço em custos bem mais altos de financiamento do governo se o fizesse.

A questão não é se Hollande "vai mudar radicalmente para a esquerda em política econômica", disse Nicholas Spiro, da consultaria de crédito soberano Spiro Sovereign Strategy. "É quase certo que não vai, nem pode. A questão é até que ponto se sentirá encorajado a desafiar a Alemanha e o BCE, sob o risco de espalhar temor sobre a qualidade de crédito da França."

Há outra possibilidade: aumentar os investimentos da UE.

Mas o escopo para isso também parece limitado. As propostas da Comissão Europeia para aumentar o seu próprio orçamento já foram criticadas pelos países que mais contribuem. Reorganizar gastos de modo a gastar menos em, digamos, subsídios agrícolas e mais em infraestrutura parece politicamente impossível.

As propostas da Comissão para aumentar o capital do Banco de Investimento Europeu da própria UE para que possa emprestar mais é algo que terá de primeiro superar a resistência de países como a Alemanha e o Reino Unido, que garantem a maior parte dos empréstimos. De toda forma, é improvável que seja um aumento grande o bastante para mudar a trajetória econômica da zona do euro.

Resumo da ópera: mudanças no curto prazo parecem improváveis. A corrente de mudança na constelação política "só vai mudar o tom, não o conteúdo, do gerenciamento da crise", diz Rahman, do Eurasia Group. "Mas vai tornar o gerenciamento da crise mais acrimonioso."