Título: CEF afina projeto de TI com lotéricas
Autor: Borges, André
Fonte: Valor Econômico, 21/08/2006, Empresas, p. B3

Na noite do último dia 12, alguns andares do prédio da Caixa Econômica Federal (CEF), em Brasília, serviram de espaço para que funcionários de informática do banco festejassem o fim de uma década de relacionamento entre a Caixa e a Gtech, multinacional que, até então, praticamente monopolizava a tecnologia usada nas quase 9 mil casas lotéricas espalhadas pelo país.

Numa maratona que teve início em março, a CEF tratou de desativar 22 mil terminais lotéricos e de transação bancária e, em seu lugar, instalar outros 25 mil novos equipamentos, preparados para realizar tanto jogos como as operações financeiras.

A operação é resultado de uma batalha iniciada em 2002, época em que o banco público já tentava encontrar meios de realizar licitações para contratar outros fornecedores, iniciativas que eram barradas por medidas judiciais da própria Gtech. Só em agosto de 2004, depois de virem à tona divergências sobre sua contratação com a CEF e o escândalo Waldomiro Diniz, é que o Superior Tribunal de Justiça (STJ), finalmente, liberou as licitações.

"Decidimos desenvolver nosso próprio sistema para realização dos jogos e contratar empresas só para o que é commoditie", diz a vice-presidente de tecnologia do banco, Clarice Coppetti.

Com orçamento de R$ 1,39 bilhão em caixa para o projeto, valor que se baseava em aferições de mercado e no contrato que mantinha com a Gtech, o banco realizou pregão eletrônico para contratar quatro parceiros. O pacote, que acabou sendo fechado em R$ 679 milhões, tem a participação da Wintech na produção de volantes e bobinas térmicas; Correios, com a distribuição do material; Vicom , responsável pela rede que conecta as lotéricas à Caixa via satélite; e Procomp, que fabricou as novas máquinas.

Paralelamente, a CEF tratou de mobilizar uma equipe para se encarregar do desenvolvimento de seu sistema central, um complexo repositório de dados que, em um único dia, chega a suportar picos de até 20 milhões de transações.

O projeto, que começou com 30 pessoas, foi concluído com a participação de 160 profissionais, os quais foram mobilizados da equipe de 2,3 mil funcionários que hoje trabalham na área de informática da CEF. Apenas no desenvolvimento do sistema, Clarice calcula que a CEF tenha desembolsado R$ 100 milhões, recursos que também foram usados para cobrir serviços prestados por fábricas de software contratadas. "O importante é que tudo foi desenhado pela Caixa. Temos o domínio da tecnologia", diz.

Agora, com o sistema no ar, a executiva calcula que a CEF passe a desembolsar cerca de R$ 27 milhões por ano para prover manutenção, suporte e atualização do programa. Além de independência tecnológica, o superintende nacional de loterias e jogos da CEF, Paulo Campos, chama a atenção para vantagens financeiras do projeto. Ao citar um estudo do banco, o executivo afirma que, em um período de cinco anos, o novo sistema irá gerar um retorno líquido R$ 400 milhões para a CEF, dinheiro que, até então, ia para a Gtech, que também recebia por número de transações realizadas. No contrato original de 25 meses que a Caixa mantinha com a Gtech - entre abril de 2003 e maio de 2005 - o acordo era de R$ 650 milhões.

Pouco mais de uma semana após a estréia do sistema, a CEF começa a aparar as arestas da migração. Nos últimos meses, o banco foi alvo de uma série de reclamações por parte dos proprietários de casas lotéricas, que se queixavam de inoperância do software e lentidão. No momento, admite Clarice, ainda há reparos a serem feitos. "A criança já nasceu e estamos tomando os primeiros cuidados. Mas o fato é que nosso desempenho já começa a superar o do sistema anterior", diz.

Com um orçamento anual de R$ 1,9 bilhão nas mãos, a executiva de tecnologia reconhece que, mesmo com o desenvolvimento interno do software, a CEF tende a ir ao mercado licitar a contratação de novos serviços. A Gtech viria a ser contratada, novamente? "Não temos restrições quanto a fornecedores", garante. E acrescenta: "Não vamos mais abrir mão da inteligência. Essa fica dentro de casa."