Título: Bancos europeus guardam cada vez mais dinheiro
Autor: Enrich ,David
Fonte: Valor Econômico, 07/05/2012, Internacional, p. A10

Alguns dos maiores bancos da Europa estão guardando mais e mais dinheiro em bancos centrais. Seu receio é que a crise no continente europeu possa se agravar e deixá-los com problemas ainda maiores.

No fim de março, dez dos maiores bancos europeus tinham depositado um total de quase US$ 1,2 trilhão em dinheiro em bancos centrais ao redor do mundo, segundo análise do "The Wall Street Journal" a partir de informes das instituições. São US$ 128 bilhões a mais do que a cifra de dezembro - um salto de 12% e 66% a mais do que no fim de 2010.

Depois de três meses de certa normalização no início do ano, o mercado de financiamento bancário dá sinais de que voltará a parar. Ao depositar dinheiro em bancos centrais, em vez de emprestá-lo a clientes ou usá-lo para outros fins, bancos europeus estão garantindo que terão acesso imediato a fundos se tiverem dificuldade para rolar dívidas ou se outras emergências - como o rebaixamento da nota de crédito - levarem clientes a fazer grandes saques.

Boa parte do aumento de US$ 440 bilhões pelos dez bancos europeus de setembro para cá foi um subproduto do US$ 1 trilhão em empréstimos baratos de três anos liberado pelo Banco Central Europeu (BCE) a centenas de bancos nos últimos meses.

A ideia era esvaziar uma iminente crise de liquidez devido à dificuldade dos bancos para obter fundos. Autoridades monetárias e governantes também esperavam que a infusão fosse levar os bancos a emprestar mais e a comprar títulos de dívida de seus governos, o que por sua vez ajudaria a aliviar problemas econômicos e financeiros na Europa.

Mas isso não ocorreu. Informes recentes divulgados pelos bancos examinados pelo "The Wall Street Journal" mostram que essa turma está, basicamente, jogando na defesa.

O Banco Santander tomou emprestado cerca de € 40 bilhões (US$ 52,3 bilhões) do BCE. No mês passado, o maior banco da Espanha (pela maioria dos critérios) declarou em um informe às autoridades ter "depositado a maior parte dos recursos captados no BCE, o que aumentou consideravelmente sua reserva de liquidez, melhorando ao mesmo tempo sua estrutura ao substituir [títulos de dívida] com vencimento no curto prazo por outros, [de prazo] mais longo".

No fim de março, o Santander tinha cerca de € 112 bilhões depositados em diversos bancos centrais. Três meses antes, eram € 97 bilhões. Um ano atrás, € 86 bilhões. Um porta-voz do Santander não quis se pronunciar.

O WSJ analisou a reserva em dinheiro do Banco Santander e do Banco Bilbao Vizcaya Argentaria, da Espanha; do Deutsche Bank, da Alemanha; do UBS e do Credit Suisse Group, da Suíça; do BNP Paribas e do Société Générale, da França; e dos britânicos Barclays, Lloyds Banking Group, e Royal Bank of Scotland Group.

"A grande prioridade é garantir a segurança do banco durante um período turbulento", disse Bruce Van Saun, diretor-financeiro do Royal Bank of Scotland, cujas reservas em bancos centrais subiram para 82 bilhões de libras esterlinas (US$ 132,4 bilhões) no fim de março. "O mercado de financiamento ainda está melhor do que no segundo semestre do ano passado, mas começa a ficar meio nervoso na Europa."

Nos três primeiros meses do ano, investidores aplaudiram o programa de financiamento do BCE. Bancos europeus correram de volta a mercados de dívida, lançando uma média de cerca de € 86 bilhões em títulos por mês, segundo a provedora de dados Dealogic.

Esse furor evaporou com a volta do nervosismo na zona do euro nos últimos meses. Em abril, os bancos europeus venderam um total de cerca de € 24 bilhões em títulos de dívida, segundo a Dealogic. Tirando o esquálido total de € 12,8 bilhões de dezembro, a emissão de títulos de dívida em abril foi a menor em mais de um ano.

A tendência é particularmente gritante entre bancos espanhóis e italianos. Depois de desovar um total de quase € 9 bilhões em títulos não garantidos no primeiro trimestre, bancos italianos não conseguiram vender nada em abril, segundo a Dealogic. Na Espanha, os bancos venderam apenas € 18 milhões desses títulos de dívida em abril; no primeiro trimestre do ano, o total foi de quase € 8 bilhões.

E não é só o investidor de títulos de dívida que está com o pé atrás na hora de emprestar a certos bancos europeus. Outras instituições financeiras tampouco estão abrindo a carteira. Segundo analistas da RBC Capital Markets, o volume de empréstimos interbancários para bancos espanhóis caiu cerca de € 51 bilhões em março; bancos italianos perderam € 29 bilhões desses fundos.

"A contração é de proporções alarmantes e indica a velocidade com que fluxos interbancários podem afetar a situação de liquidez de um sistema bancário", afirmaram os analistas da RBC em um relatório de pesquisa com data de 2 de maio.

A situação está levando os bancos a agir de forma conservadora. Daqui até o fim de 2012, vão vencer cerca de € 61 bilhões em títulos de dívida de bancos espanhóis; no caso dos italianos, serão aproximadamente € 43 bilhões. Ao manter o grosso do dinheiro captado no BCE estacionado em bancos centrais, essas instituições podem recorrer a essas reservas se o mercado seguir fechado.

O Lloyds registrou um dos maiores aumentos no volume de dinheiro que tem depositado em bancos centrais como o Banco da Inglaterra. Nos três primeiros meses de 2012, o caixa do banco cresceu cerca de 30%, para 78 bilhões de libras.

O Lloyds pegou 11,4 bilhões de libras emprestados do BCE. O diretor-presidente do banco, Antonio Horta-Osorio, disse que a instituição decidiu usar os fundos, pelo menos por ora, para blindar o Lloyds de qualquer efeito de uma queda em sua classificação de crédito.

O Lloyds advertiu que um rebaixamento poderia provocar o saque de bilhões em recursos de clientes. A Moody"s Investor Services está considerando cortes na classificações de crédito de bancos por toda a Europa.

"Dado o exercício geral de avaliação que as agências de classificação de crédito, e em especial a Moody"s, estão fazendo com todos os bancos na União Europeia, achamos prudente deixar [os fundos emprestados] no BCE", disse Horta-Osorio. Segundo ele, o Lloyds Bank vai reavaliar a decisão quando a Moody"s anunciar os resultados da revisão das notas.