Título: Novas iniciativas para reduzir o spread bancário
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 21/08/2006, Opinião, p. A12

É absolutamente bem-vinda a retomada, pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, da iniciativa de adotar medidas para reduzir os custos do dinheiro por meio do estímulo ao aumento da competição entre os bancos e ao maior poder de barganha do cliente. Essa é uma batalha que começou a ser travada pelo Banco Central em 1999, a partir de estudos e medidas para a redução do "spread" bancário, ficou suspensa nos últimos três anos, e agora está sendo resgatada com a promessa de novas providências.

Constam do pacote de medidas que o ministro espera receber da área técnica da Fazenda e do BC, ainda esta semana, a universalização do alcance da Central de Risco do Banco Central (BC), hoje restrita a quem tem financiamento bancário de R$ 5 mil para cima; a extensão da portabilidade do cadastro para todos que estiverem contemplados pelo sistema de informações da Central de Risco; a automatização, através de um instrumento chamado " DOC reverso ", da transferência do pagamento de salário para o banco que o trabalhador indicar; a permissão, por meio de mudança na lei do crédito consignado, para que o funcionário da empresa tenha capacidade de negociar seu crédito com outros bancos; e diminuição do Fundo Garantidor de Crédito (FGC). Este é alimentado por contribuições mensais dos bancos, equivalentes a 0,025% dos saldos médios das obrigações garantidas (depósitos à vista e a prazo, poupança etc).

Algumas dessas possibilidades até já existem, mas não têm funcionado a contento, conforme constata o governo. Um exemplo é o da transferência do salário para o banco da escolha do funcionário, hoje possível, mas em que o sistema financeiro cria uma série de procedimentos burocráticos e operacionais que dificultam muito a realização da operação. O que o BC estuda é torná-la automática, célere, através de uma simples autorização eletrônica.

A ampliação da Central de Risco tende a ser gradual. Hoje essa base de dados do BC, que funciona como um Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) para os bancos, atinge quem tem financiamentos bancários de pelo menos R$ 5 mil. Como, para universalizar o alcance das informações, o BC terá que fazer novos investimentos em software, máquinas e capacidade de transmissão de dados do sistema, é mais provável que a instituição opte por, num primeiro momento, reduzir de R$ 5 mil para uns R$ 3 mil o valor dos empréstimos de cada tomador para que ele conste da base de dados e, sendo bom cliente, possa negociar com qualquer banco melhores condições de crédito.

O spread bancário no Brasil é o maior do mundo. Estudo do BC indica que mesmo tendo a Selic caído 5 pontos percentuais de setembro de 2005 até agora, o "spread" permanece praticamente inalterado tanto para pessoas físicas quanto para as empresas, na casa dos 28%. Ou seja, ignora-se, no país, a forte correlação existente entre a taxa básica de juros e o diferencial de captação e aplicação dos recursos, pelos bancos, ainda que, ao baixar a Selic, o BC esteja reduzindo o custo de captação. Obviamente os especialistas no assunto vão encontrar uma série de explicações para isso, seja o aumento da inadimplência, seja um deslocamento das carteiras de crédito dos bancos para clientes de maior risco, mas que parecem insuficientes. Além do spread, consta da variada lista de singularidades do país a robusta margem de lucro dos bancos que, segundo o último estudo do BC, datado de dezembro de 2004, ronda a casa dos 27% para os empréstimos concedidos no segmento livre.

Duas medidas soam eficientes para induzir o sistema a operar com "spreads" mais compatíveis com os do resto do mundo. Uma, de curto prazo, seria a permissão para que o trabalhador possa escolher onde quer receber seu salário. O Brasil é um dos poucos países onde há clientes cativos de empresas, já que estas escolhem em nome do trabalhador onde depositará a folha de salários e se beneficiam com reciprocidades da casa bancária. Há projetos de lei em tramitação no Congresso, os bancos estrangeiros pressionam o governo para romper com esse esquema e Mantega deve incluir medidas nessa linha no pacote.

Outra iniciativa, esta de mais longo prazo, dada a elevada taxa básica de juros, seria reduzir as alíquotas dos depósitos compulsórios que os bancos mantêm no BC, que, para depósitos à vista, chegam a 45%, algo também incomum no resto do mundo.