Título: Alckmin resiste nos redutos agrícolas
Autor: Felício, César
Fonte: Valor Econômico, 21/08/2006, Especial, p. A14

A soja, o milho e o arroz em baixa sustentam a candidatura à Presidência de Geraldo Alckmin (PSDB) na região Centro-Sul do país. Nos seis Estados em que o agronegócio é o pilar da economia local, o cenário da sucessão é outro em relação ao quadro nacional: Alckmin lidera nas pesquisas locais no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Goiás. Perde para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva por seis pontos percentuais no Mato Grosso e por sete pontos percentuais no Paraná. Nos demais Estados do país, com exceção de São Paulo, Lula ganha.

O desempenho de Lula nestes Estados sempre foi abaixo do que consegue nacionalmente, mas nunca na proporção que se avizinha. Em 1994, 1998 e 2002, Lula ficou abaixo da média nacional em quatro destes seis Estados. A se confirmarem as pesquisas, este ano Lula ficaria aquém do resultado nacional nos seis Estados.

A crise deste ano tem razões estruturais em que o poder de intervenção do Estado é limitado. O mercado externo e a apreciação cambial são os principais fatores. No caso da soja, o produtor recebeu menos pelas vendas ao exterior e viu o preço dos insumos subir em real. A crise, porém, se distribui desigualmente: a laranja e cana têm lucro.

O clima também pesou negativamente, com a estiagem no Rio Grande do Sul e no Paraná. Na conta direta de Lula é debitada a febre aftosa: ainda que a demanda internacional tenha mantido as exportações de carne bovina em alta, os produtores do Mato Grosso do Sul, Estado atingido pela doença, perderam renda e o aumento da oferta interna baixou o preço da carne. "A logística dos frigoríficos fez com que a arroba estagnasse", disse o diretor da Câmara de Pecuária da Confederação Nacional da Agricultura, Antenor Nogueira.

A crise nas zonas produtoras de grãos afeta o emprego. No Brasil como um todo, a geração de empregos formais registrados no Ministério do Trabalho (Caged) subiu 3,55% este ano e 4,7% em doze meses. Em Sinop (MT), zona produtora de soja, caiu 11,23% em um ano e 3,63% em 2006. Em Uruguaiana (RS), pólo arrozeiro, a queda este ano foi de 1,85% e em doze meses, 0,02%. O mesmo quadro se repete em campeões da produção como Dourados (MS), Jataí (GO) e Campo Mourão (PR).

As lideranças rurais se afastaram do governo por entender que Lula as prejudicou na luta por espaço político com a agricultura familiar, beneficiada com a triplicação dos recursos para o financiamento dos pequenos agricultores (Pronaf) e a aceleração da reforma agrária, programas do Ministério do Desenvolvimento Agrário.

"Antes tínhamos comando unificado. Agora os problemas do agronegócio são discutidos em quatro ministérios: Agricultura, Desenvolvimento Agrário, Pesca e Meio Ambiente. Perdemos força para lutar por verbas e densidade para fazer valer pontos de vista em questões como transgênicos, comércio exterior e outros", diz o presidente da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), Márcio Freitas. "Não houve R$ 70 milhões para a defesa sanitária, mas houve R$ 700 milhões para reequipar o Incra", disse o presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB) João Sampaio Filho, fazendo uma concessão. "Este ano saiu o melhor plano de safra dos últimos tempos, mas veio tarde", diz.

Segundo dados oficiais, deve ser colhida este ano uma safra de 119,6 milhões de toneladas. A SRB aposta em 111 milhões. Caso os números se comprovem, o desempenho das safras no governo Lula lembrará o do primeiro mandato do governo Fernando Henrique, em que a taxa de câmbio virtualmente fixa descapitalizou o setor. A produção de grãos caiu 5,5 % nas quatro safras colhidas entre 1995 e 1998. Nas últimas quatro safras, incluindo esta, caiu 2,7%. Já vai distante a bonança do segundo mandato Fernando Henrique, em que a safra de grãos pulou de 82,4 milhões para 123 milhões de toneladas.

O mais novo fantasma entre os dirigentes rurais é a revisão dos índices de produtividade para a desapropriação para reforma agrária, que deve ser anunciada depois das eleições. Se os índices vierem altos, os produtores terão pouca margem para reduzir a produção sem correr o risco de serem enquadrados em latifúndio improdutivo. "Será uma espada permanente em nossa cabeça", diz o presidente da Associação Brasileira do Agronegócio, Carlo Lovatelli, um diretor do grupo Bunge.

Já no setor sucroalcooleiro, prevalece a neutralidade. "Em 30 anos, nunca houve um clima tão favorável para a nossa atividade. O Lula tem sido o mais atuante embaixador do álcool no exterior, eficiente e empenhado. Mas se isso vai levar ao voto na reeleição é uma incógnita porque o Alckmin teve papel significativo ao reduzir o ICMS para o álcool hidratado", diz o presidente da União da Agroindústria Canavieira de São Paulo, Eduardo Carvalho.

A articulação entre Alckmin e os dirigentes é maior, graças à rejeição a Lula e à proximidade de seus coordenadores de campanha com a área. O coordenador geral de programa de governo, João Carlos de Souza Meirelles, foi secretário da Agricultura. O coordenador adjunto, Pratini de Moraes, foi ministro do setor no governo Fernando Henrique e o coordenador executivo, Antonio Marcos Buainaim, é estudioso do agronegócio na Unicamp. Desde o início da campanha, Alckmin fez um roteiro pelas principais feiras agropecuárias do país, expondo-se como candidato do setor produtivo. Já com Lula a aproximação é menor, não tendo havido um único encontro com as entidades do setor este ano.