Título: PT e PSDB têm programas conflitantes para o agronegócio
Autor: Zanatta, Mauro
Fonte: Valor Econômico, 21/08/2006, Especial, p. A14
Com diagnósticos e propostas radicalmente opostas para a agropecuária, os dois principais candidatos ao Palácio do Planalto nestas eleições têm programas de governo que reforçam a distinção entre agronegócio e agricultura familiar e que devem aprofundar ainda mais as disputas dessas áreas nos bastidores do governo.
Candidato à reeleição, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) privilegia o apoio a pequenos e médios produtores e aos assentados da reforma agrária. E prevê a adoção de "travas" pelo Estado para deter o avanço da monocultura adotada por grandes produtores e dos monopólios e oligopólios de indústrias e tradings do setor. "O Estado tem que corrigir distorções para incentivar a presença maior de atores nas cadeias e arranjos produtivos", defende o coordenador do grupo temático do PT, Valter Bianchini.
O candidato tucano ao Planalto, Geraldo Alckmin, ao contrário, aposta suas fichas na chamada agricultura empresarial. E acena com uma reforma no sistema de defesa agropecuária, o reforço do cooperativismo tradicional e uma unificação dos ministérios da Agricultura e do Desenvolvimento Agrário. "Político tem que ter lado. Vamos unificar as políticas e, se houver condições, uniremos os ministérios", afirma o coordenador do programa setorial tucano, deputado Xico Graziano (PSDB-SP). "Separar orçamentos e equipes é o supra-sumo do equívoco". A separação dos ministérios ocorreu, porém, em 1996, no mandato de Fernando Henrique Cardoso.
Com focos bastante distintos, os programas coincidem apenas nas receitas de ampliação do seguro rural e de reorientação na atuação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). O PT quer unificar os quatro tipos de seguro existentes e o PSDB propõe aumentar subsídios para massificar o benefício no campo. "Podemos tirar R$ 1 bilhão do crédito rural para o Tesouro bancar o prêmio desse seguro, que dá mais lucro que custeio e investimento", diz Graziano.
Para a Embrapa, Lula prega "novas matrizes" tecnológicas para pesquisa e extensão agrícola. "Defendemos maior equilíbrio com diversificação", diz Bianchini. O programa de Alckmin prevê a "redefinição de prioridades" e o "fim da mesmice" nas linhas de pesquisa da Embrapa. "Não falta dinheiro. Faltam gás e engenharia", argumenta.
Divididos em eixos de atuação, os programas de Alckmin e Lula estabelecem vínculos diretos com suas principais "clientelas". E contêm claras diferenças entre os tipos de agricultura, regiões produtoras e os sistemas de produção. O PT aposta no reforço dos laços com os pequenos produtores. Focará ações nos 800 mil produtores incluídos no programa da agricultura familiar (Pronaf) que já são beneficiários do Bolsa Família. "É a inserção da pobreza rural com cidadania. Quem está abaixo da linha da pobreza, já tem o Pronaf e terá uma porta de saída do Bolsa Família ", diz Bianchini, atual secretário de Agricultura Familiar do Ministério do Desenvolvimento Agrário.
O Pronaf atende hoje a 1,8 milhão de produtores, quase metade da população rural, estimada em 4 milhões de pessoas. Graziano ataca a prioridade: "Pronaf é esmola, um esqueleto no armário. Ninguém sabe qual é a inadimplência. O Banco do Brasil ganha dinheiro com isso porque o Tesouro banca as constantes prorrogações".
O programa de Lula também reforça o amparo ao médio produtor, hoje atendido pelo Proger Rural, e aos assentados da reforma agrária. "Vamos ampliar os recursos com juros controlados e instrumentos de seguro e garantia de preços", afirma Bianchini. "A reforma agrária vai continuar com crédito fundiário, reordenamento agrário e titulações, buscando a qualificação dos assentamentos", diz o petista.
O programa de Alckmin tenta atrair os grandes produtores com a reforma da defesa animal e vegetal. Pelo plano tucano, a Secretaria de Defesa Agropecuária será transformada em agência regulatória autônoma, com poderes de fiscalização e sustentada com taxas próprias cobradas dos produtores. "Temos que mudar o modelo de gestão com orçamento independente e agilidade na prestação de serviços", diz Graziano. Segundo ele, o Serviço de Inspeção Federal (SIF) fixará critérios e padrões e auditará o cumprimento. "Não pode botar fiscal do Estado para auditar controle de moscas. Não cumpriu, multa e acabou". O PSDB quer criar um sistema integrado com agências estaduais.
Nos custos de produção, o PSDB prevê "incentivos" para facilitar a produção de biodiesel para uso próprio em cooperativas. "Para cima do Triângulo Mineiro não dá para fazer agricultura. O biodiesel poderia ser produzido para auto-consumo, mas isso esbarra no lobby da Petrobras e da Agência Nacional do Petróleo (ANP)", diz Graziano. O PT propõe cortar custos com mecanismos de sustentação de renda, mantendo recursos para a comercialização da safra nos níveis atuais de R$ 2,8 bilhões por ciclo. "Vamos criar um fundo anti-cíclico que atuará em épocas de baixa", diz Bianchini.