Título: Quem cuida tem
Autor: Camba, Daniele
Fonte: Valor Econômico, 22/08/2006, EU & Investimentos, p. D1

No início desta década, quando a expressão "tag along" soava estranha até para os mais enfronhados no mercado de capitais, Ultrapar e Saraiva inovaram ao colocar esse direito - de dar aos minoritários parte do prêmio pago aos controladores em caso de venda - em seus estatutos. Isso só foi possível graças ao trabalho de fundos que compram ações de empresas e participam ativamente de sua gestão.

Naquela época, esses gestores - como Dynamo, Investidor Profissional (IP) e Bradesco Templeton - ainda eram desconhecidos, mas nos últimos anos ganharam destaque, já que ficou cada vez mais nítida a vantagem de se investir em uma carteira que atue de maneira ativa para garantir os direitos de seus cotistas. O número de fundos com esse perfil vem aumentando, com a entrada de novos gestores, como a Rio Bravoe Tarpon, e que agora são acessíveis a investidores pessoas físicas de menor porte. Já o Fator Sinergia recentemente lançou sua terceira edição, confirmando o interesse por essa estratégia, recomendada a aplicadores que busquem, no longo prazo, retornos maiores, com menos risco de ver seu dinheiro minguar de uma hora para outro. Até há alguns anos, essa gestão próxima das empresas era privilégio das carteiras de private equity, destinadas apenas a investidores qualificados.

É exatamente no longo prazo que uma gestão ativa faz a diferença. Os resultados do tradicional quarteto Dynamo, IP, Fator e Bradesco Templeton, hoje transformada em Franklin Templeton, comprovam essa vantagem. Desde 2002, até o último dia 16, o fundo Dynamo Cougar acumula uma rentabilidade de 385,50%, segundo dados do site financeiro Fortuna, frente a uma alta de 177,50% do Índice Bovespa no período. Os fundos IP Participações Institucional e o IP Participações acumulam retornos de 244,17% e 219,86%, respectivamente. No mesmo período, o Bradesco Templeton Fundo de Valor e Liquidez, que agora leva o nome da nova asset Franklin Templeton, também apresenta um ganho polpudo: 234,74%.

"É no longo prazo que a estratégia de contribuir para a gestão da companhia, geralmente tendo um representante no conselho de administração ou fiscal, começa a dar resultados no dia-a-dia da empresa", diz Mário Fleck, sócio da Rio Bravo, que há dois anos lançou o fundo RB Fundamental. A política é investir em poucas companhias (entre cinco e sete), para conseguir acompanhar de perto a gestão delas. No ano, esse fundo lidera o ranking de rentabilidade dessas carteiras, com ganhos de 34,53% frente a 12,62% do Ibovespa. "Procuramos sempre companhias em que possamos agregar algo com a nossa experiência de gestão", afirma Fleck. Entre os principais investimentos que contribuíram para esse retorno estão as ações da Eternit. "Acompanhamos todo o processo de pulverização de capital e desde o ano passado conseguimos um assento no conselho de administração", diz.

No início da década de 90 surgiu o primeiro fundo da categoria, o IP Participações. Depois vieram outros cujos principais investidores eram o BNDES, com o objetivo de aumentar a liquidez de sua vasta carteira de participações, e os fundos de pensão, que possuem o perfil de longo prazo. Nos últimos anos, no entanto, a estratégia se disseminou e passou a conquistar a simpatia das pessoas físicas mais abonadas, já que a aplicação mínima varia entre R$ 50 mil e R$ 300 mil. O primeiro fundo desse tipo da Fator Administração de Recursos, o Fator Sinergia, começou em 1997 com apenas cinco cotistas, todos fundos de pensão, diz o gestor, Fernando Tendolini.

A aprovação da nova Lei das Sociedades Anônimas (S.A.), em 2001, e a criação do Novo Mercado e os níveis diferenciados de governança corporativa da Bovespa, em 2000, foram dois eventos importantes que levaram o investidor de menor porte a se preocupar mais com a sua proteção como minoritário, lembra Tendolini. O reflexo apareceu no Sinergia II, aberto em setembro de 2002, com 14 pessoas físicas e apenas 11 institucionais.

A virada definitiva se deu no Sinergia III, aberto em fevereiro deste ano, cujo primeiro cotista foi uma pessoa física. A retomada do mercado de capitais, a partir de 2004, com a nova onda de aberturas de capital das empresas no Novo Mercado, na visão de Tendolini, foi a cereja que faltava no bolo para o investidor entender a importância de estar em um fundo em que o gestor se preocupa em encontrar empresas que darão mais retorno se passarem a adotar as boas práticas de governança. "A queda da taxa de juros fará o investidor olhar com ainda mais atenção para os fundos de ações de longo prazo", completa ele.

Seguindo essa tendência de popularização de estratégias mais sofisticadas, no próximo mês, a Franklin Templeton deve abrir para investimentos de pessoas físicas o Fundo Valor e Liquidez, até agora voltado para institucionais.

Essa nova fase pró governança não beneficiou esses fundos apenas do lado da demanda. "Antes pregávamos no deserto falando com as companhias", diz o sócio da IP, Pedro Rudge. "Hoje, depois dos casos de sucesso como Natura, Dasa e Gol, o controlador já é muito mais receptivo a ter um acionista profissional que o ajude a concertar os erros da companhia."

Esses fundos também tiveram uma participação importante na retomada do mercado de capitais. Antes da Natura - a primeira empresa a abrir o capital nessa nova fase -, a Marcopolo foi quem reabriu o mercado, aderindo ao Nível 2 de governança da Bovespa e captando R$ 100 milhões, em setembro de 2002, no meio da crise com a eleição para presidente da República. "Convencemos o controlador que faltavam ativos de qualidade na bolsa e que os investidores saberiam premiar esses papéis que chegassem ao mercado", diz o gestor da Franklin Templeton Mauro Cunha.

As carteiras voltadas para governança costumam investir em empresas de pequeno e médio portes ou mesmo grandes, com ações com pouca liquidez, baixa transparência, mas que após algumas mudanças, poderão se valorizar muito. Normalmente, começam comprando pequenas quantidades e depois, à medida que conhecem melhor a companhia e o controlador, passam a ser acionistas importantes. "Começamos tendo 2%, 3% do capital e aumentamos gradativamente, chegando a ter 10%, 15% do capital", diz Rudge, da IP. Para facilitar o contato com a diretoria e os controladores, os gestores também procuram sempre ter um representante no conselho de administração, ou no mínimo no conselho fiscal.

Assim como os fundos de private equity, essas carteiras de ações também possuem um prazo de aplicação, em que os cotistas não podem fazer resgates. E os ganhos ocorrem na fase final, quando o fundo começa a vender suas participações. "É um investimento de longo prazo, para alguém que não vai precisar desse dinheiro no mínimo pelos próximos cinco ou seis anos", diz Cunha, da Franklin