Título: Crédito direcionado tem peso de 7,5% no "spread"
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 22/08/2006, Finanças, p. C10

O Banco Central calculou, pela primeira vez, em quanto o crédito direcionado encarece os empréstimos bancários com recursos livres. A conclusão, apresentada no recém divulgado Relatório de Economia Bancária e Crédito de 2005, é que os subsídios cruzados embutidos no crédito direcionado rural e imobiliário respondem por 7,57% do "spread" bancário, que é a diferença entre os custos de captação dos bancos e as taxas cobradas nos empréstimos aos clientes.

No seu diagnóstico anual para a redução dos juros e do "spread" bancário, o BC defende que seja flexibilizado o direcionamento obrigatório de crédito para os setores rural, imobiliário e microcrédito. Segundo o BC, já foram discutidas em grupo interministerial alternativas para extinguir o crédito rural, mas a proposta não andou porque não foram achadas opções de mercado para substituir esse financiamento.

No seu estudo, o BC usa dados bancários de dezembro de 2001, que concluem que o crédito rural responde por 2,55% do "spread" bancário, que naquele ano era estimado em 28,7 pontos percentuais (pp.). Já o crédito imobiliário respondia por 5,02% do "spread" bancário. Os subsídios cruzados tinham peso maior no "spread" do que, por exemplo, a soma dos tributos indiretos e contribuições ao Fundo Garantidor de Crédito (FGC), que tinham uma representatividade de 7,1%.

A teoria por trás dos cálculos do BC é que, quando os bancos cumprem os direcionamentos obrigatórios de crédito, cobrando juros abaixo dos valores de mercado, eles perdem dinheiro - e essa perda deve ser recuperada por meio da cobrança de juros maiores no chamado crédito livre, que não tem restrições em termos de taxas e de volumes.

No conceito usado pelo BC, existem três tipos de crédito direcionado: o rural, o imobiliário e o microcrédito. Este último, que foi criado em 2003, também impõe custos, mas não entrou nos cálculos porque seu volume é pequeno. Os repasses de recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) não são considerados direcionamento de crédito porque os recursos não são captados sob a forma de depósitos do público.

No caso do crédito rural, os bancos estão obrigados a destinar 25% das captações sob a forma de depósitos à vista a essa modalidade de empréstimo, com juros limitados a 8,75% ao ano. Bancos que não cumprem essa exigência são obrigados a recolher os valores ao BC, sem receber remuneração alguma.

"Para se ter um retrato do cumprimento dessa exigibilidade, observe que apenas 34 das 120 instituições captadoras de depósitos à vista em 2004 cumprem o direcionamento com aplicações efetivas", diz o estudo do BC, assinado pelos economistas Ana Carla Abrão Costa e Márcio Nakane. "O total aplicado em crédito rural gira em torno de 15%, o que mostra que em muitos casos os bancos preferem depositar os recursos no BC, mesmo sem remuneração, a conceder empréstimos subsidiados ao setor." No caso do direcionamento imobiliário, os bancos estão obrigados, como regra geral, a destinar 65% das captações em caderneta de poupança ao segmento. Desse total, 80% devem observar as regras do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), cumprindo teto para os juros, prazos e limites de valor.

No caso do microcrédito, os bancos estão obrigados a destinar 2% dos saldos captados sob a forma de depósitos à vista. Nos empréstimos de varejo, os juros estão limitados a 2% ao mês, e no financiamento de atividades produtivas, a 4% ao mês.

O estudo do BC não nega que, em alguns casos, há justificativa para a intervenção governamental nos mercados. "Quando o governo considera que algumas camadas da sociedade têm acesso limitado a crédito e que, do ponto de vista de avaliação social, isso tem efeitos negativos no bem-estar, pode-se justificar a presença governamental nesse mercado", diz o documento.