Título: "Quem? Não trabalha aqui"
Autor: Vaz, Lúcio
Fonte: Correio Braziliense, 28/10/2010, Política, p. 14

Deputados derrotados demitem em massa logo após as eleições, mas nos gabinetes e nos estados ninguém conhece os exonerados

Assim que saiu o resultado das eleições para a Câmara, foram exoneradas dezenas de funcionários dos gabinetes dos deputados, a maioria deles não reeleitos. Só na primeira semana, houve 138 dispensas de funcionários, contra apenas 22 nomeações. Alguns parlamentares chegaram a exonerar 10, 11 servidores num único dia. A maior parte desses secretários parlamentares, como são chamados, estavam lotados nos escritórios dos deputados nos seus estados de origem. Nos gabinetes em Brasília, muitos dos assessores que atenderam o telefone nem sabiam da existência desses servidores. Disseram que os exonerados trabalhavam no estado. Mas no escritório estadual, muitos também eram desconhecidos.

William Leonardo? Não tem ninguém aqui com esse nome, informou um funcionário do gabinete de Jairo Ataíde (DEM-MG), quando questionado sobre um dos exonerados. O deputado não se reelegeu e dispensou cinco secretários parlamentares. O funcionário informou o telefone do escritório do deputado em Montes Claros (MG), mas lá o ex-servidor também é desconhecido. William? Tem algum William aqui? (O assessor pergunta a outro colega). Tem nenhum William aqui não. É a respeito de quê? Questionado sobre Cynthia, responde prontamente: Tem nenhuma Cynthia aqui também não. Ela passa o telefone para Humberto, um funcionário mais antigo. O repórter informa o nome de quatro pessoas demitidas, mas ele não conhece nenhum. Daqui de Montes Claros não é, não. Humberto indica o nome da assessora de Brasília que teria a informação. A assessora Vivian ouve uma relação de cinco nomes, mas diz não conhecer nenhum deles.

O deputado Paulo Lustosa, que também não se reelegeu, exonerou nove funcionários no dia 6 deste mês. No seu gabinete, em Brasília, na quinta-feira de manhã, o assessor é questionado sobre o ex-funcionário Cássio, que foi exonerado. A gente tinha um funcionário, Cássio, mas era lá no estado, respondeu o assessor, informando o número do telefone do escritório em Fortaleza. Questionada sobre Cássio Pacheco, a funcionária Marina responde: Tem ninguém com esse nome aqui, não. Não sei nem quem é. Ela diz que trabalha há um ano no escritório. Tem um rapaz que trabalha aqui com a gente e também não conhece, não. O repórter pergunta sobre outro nome. Gislaine também não conheço. Não tem ninguém com esses nomes aqui. Deve ser engano. À tarde, outro assessor do escritório, Marcelo, também afirma não conhecer Cássio. Não tem nenhum Cássio Pacheco aqui, não. Faz quatro anos que a gente está aqui. Esse nome, eu nunca ouvi falar.

Coisa de campanha O deputado Laerte Bessa (PSC-DF) foi o oitavo mais votado de Brasília, com 51,7 mil votos, mas perdeu a vaga por causa do quociente eleitoral. Exonerou nove secretários parlamentares no dia 6 e mais um no dia 7. A reportagem procurou pelos demitidos no gabinete. Questionada pela ex-servidora Emídia de Jesus, a secretária responde com outra pergunta: Emídia trabalha aqui no gabinete do deputado? Ela pergunta a um colega que está próximo e logo responde: Não, a gente não conhece essa Emídia aqui, não.

Encontrado pelo Correio, o ex-servidor Marcos Vinícios Cavalcante parece conformado: É coisa de campanha, porque a equipe estava muito desmotivada. Então, precisava haver uma renovação. Acontece. Foi mais uma decepção de um ou de outro. Quando acontece um tipo de insucesso, você faz uma análise para ver o que aconteceu e vê que as pessoas não produziram aquilo que poderiam produzir. Não tem para onde fugir, o resultado fala por si. Numa eleição ele teve uma votação acentuada, na outra, uma queda de produção. É natural que tenha havido problema com a equipe.

Ex-funcionário do deputado Gervásio Silva (PSDB-SC), que perdeu a eleição e demitiu três assessores, Felipe Henchen parecia confuso com a dispensa: Não sei dizer. Acabou para ele, não foi eleito. Disse que, como não tinha sido eleito, teria que cortar o pessoal.

Cada deputado conta com uma verba de R$ 60 mil para contratar secretários parlamentares. Esses servidores fazem o atendimento do público, recebem telefonemas do estado, encaminham reivindicações de prefeitos, vereadores. Eles também podem trabalhar no escritório dos deputados nos estados, onde atendem o público.

O deputado e empresário José Tatico (PTB-GO) mudou a sua base eleitoral nesta eleição. Disputou por Minas Gerais. Não foi reeleito e exonerou oito funcionários. No gabinete do deputado, a assessora Vanderleia é questionada sobre o ex-servidor Rodrigo. Rodrigo de quê? Mesmo com a citação do sobrenome ela diz desconhecer: Não tem Rodrigo nenhum aqui.

Colaborou Josie Jeronimo