Título: Informalidade no país é "estrutural", diz estudo
Autor: Romero, Cristiano
Fonte: Valor Econômico, 10/08/2006, Primeiro Caderno, p. A5
Desde meados dos anos 90, um novo e intrigante fenômeno vem acontecendo no mercado de trabalho brasileiro: toda vez que a economia cresce e gera empregos, cresce também o número de trabalhadores que atuam no setor informal. A constatação está no estudo intitulado "Estado de uma Nação: Mercado de Trabalho, Emprego e Informalidade", divulgado ontem pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
No passado, quando o Produto Interno Bruto (PIB) expandia e havia geração de empregos, o nível de informalidade diminuía. Uma parcela dos trabalhadores informais era absorvida pelo mercado formal. Nos últimos três anos, segundo dados do IBGE, o número de trabalhadores com carteira assinada aumentou, enquanto o de trabalhadores sem carteira diminuiu.
A análise do Ipea baseia-se, no entanto, num período maior de tempo - de 1992 a 2004. De acordo com o estudo, mais da metade da força de trabalho brasileira ainda atua no setor informal da economia. Entre 1992 e 2004, a Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar (PNAD), do IBGE, constatou que o percentual de trabalhadores do setor informal cresceu de 38,3% para 44,1%, enquanto, na área rural, caiu de 58,5% para 54,6%.
"A combinação desses movimentos assegurou uma estabilidade da informalidade do mercado como um todo e, mais recentemente, acarretou uma ligeira tendência de redução - em 1992 o percentual de informalidade era de 51,9%; cresceu para 53,9% em 1998; caiu para 51,7% em 2003 e continuou caindo, para 51,2%, em 2004", diz o estudo.
Os técnicos chamam a atenção para os fatores que, possivelmente, estimularam a informalidade e lembram que todos eles ainda estão aí, sendo que, em alguns casos, a situação se agravou. "A informalidade passou a ser um traço estrutural do mercado de trabalho no Brasil", comentou, em entrevista, o editor do estudo, Paulo Tafner.
Na avaliação do Ipea, o desempenho do mercado de trabalho nos últimos 18 anos reflete uma inconsistência entre as regras trabalhistas consagradas pela Constituição de 1988, de um lado, e a abertura da economia, a estabilização monetária iniciada em 1994, o aumento da carga tributária desde 1995 e a ocorrência de vários choques externos, do outro. Combinados, esses fatores, na avaliação do Instituto, alimentaram a informalidade e aumentaram o desemprego - embora, entre 1992 e 2004, a população ocupada tenha sofrido incremento de 17,5 milhões de pessoas, o contingente de desempregados cresceu 78,4%.
"A relação entre o total de encargos trabalhistas (FGTS, previdência e contribuições para o Sistema S) e os rendimentos totais do setor industrial aumentou de aproximadamente 43%, em 1986, para 57% em 1995, impondo maior custo para as empresas", aponta o estudo. "O efeito desse aumento é a redução da oferta de vagas devido à perda de competitividade das empresas expostas à concorrência internacional e à busca de tecnologias que utilizem menos mão-de-obra."
A informalidade no mercado de trabalho diminui a produtividade da economia e prejudica a arrecadação previdenciária e tributária do governo, além de penalizar os trabalhadores com salários menores - a diferença, em 2004, era de 122% - e qualidade do trabalho inferior. O estudo do Ipea diz que as regras de funcionamento do mercado de trabalho são incompatíveis com a necessidade que o país tem de aumentar os investimentos e a competitividade das empresas, gerando "empregos em quantidade e qualidade adequadas". A longo prazo, se nada for feito, a economia estará condenada a crescer numa velocidade menor que a esperada.
O estudo mostra que a tendência da população brasileira é parar de crescer dentro de 25 anos. Isto ocorrerá caso a taxa de fecundidade da mulher brasileira, de 2,1 filhos, não se altere nos próximos anos. Nesse caso, o Brasil chegará a 2030 com uma população de 225,3 milhões de pessoas. Se as taxas de mortalidade continuaram caindo, a expectativa de vida dos brasileiros crescerá, atingindo, daqui a 24 anos, cerca de 78 anos para os homens e 85 anos para as mulheres.
A taxa de crescimento da chamada População em Idade Ativa-PIA (acima de 15 anos), que entre 2000 e 2005 foi de 2% ao ano, deverá cair para 0,9% entre 2025 e 2030. Além disso, o Ipea prevê que a participação desse contingente no total da população crescerá de 70% para 81%. Esse processo de redução do ritmo de crescimento da PIA, diz o estudo, já deverá ser perceptível a partir dos próximos 4 a 5 anos.
Esses são indicadores de que a população e, portanto, a força de trabalho envelhecerão. Assim como o problema da informalidade, o envelhecimento dos brasileiros exigirá, na avaliação do Ipea, mudanças nas regras de funcionamento do mercado de trabalho.
"O envelhecimento da população e, particularmente, da PEA (População Economicamente Ativa), exigirá, em futuro não muito distante, indispensáveis ajustes em termos de flexibilidade do mercado de trabalho, de modo a contemplar os requisitos necessários a uma força de trabalho mais madura, mais sujeita a riscos físicos e com menores agilidade e força física, além de, proporcionalmente, menos instruída do que os segmentos mais jovens", adverte o estudo.