Título: Ação ordinária perde R$ 2,8 bilhões de valor de mercado em um dia
Autor: Magalhães, Heloisa e Vieira, Catherine
Fonte: Valor Econômico, 22/08/2006, Empresas, p. B3
O parecer emitido pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) na sexta teve o efeito imediato de derrubar as ações ordinárias da Tele Norte Leste, holding da Telemar listada em bolsa, em 18,83% ontem, a maior queda da história da empresa. Os papéis perderam em apenas um dia R$ 2,8 bilhões em valor de mercado.
A desvalorização representou uma reversão do ganho acumulado nos últimos meses e que refletia justamente o prêmio atribuído aos ordinaristas na relação de troca de suas ações pelos papéis da nova empresa. Mas indicou também a reação dos investidores a uma mudança de equilíbrio de forças entre as ações ordinárias e preferenciais determinada pelo parecer.
A CVM quis evitar situações em que o controlador arbitre preços a seu favor, impondo condições desfavoráveis aos minoritários detentores de ações preferenciais - uma queixa antiga no mercado brasileiro e que pedia uma solução. Ao fazer isso, porém, mexeu com o direito básico das ações ordinárias, que é o voto, e abriu um debate.
Na transição para uma bolsa em que todas as ações terão direito a voto, modelo para o qual o mercado brasileiro está caminhando, alguém terá que pagar a conta. A questão é quem.
"A decisão da CVM é irretocável. Se o controlador quiser criar uma relação de troca em que terá um prêmio, quem tem de aprovar são os acionistas que perdem na operação", comentou um especialista.
Por outro lado, há quem acredite que o minoritário que detém ONs não pode ser prejudicado em seus direitos, já que não participou da decisão de reestruturar a empresa, tomada pelos controladores. "Os detentores de ONs recebem o prêmio na operação porque o tag along é um direito deles previsto em lei. A CVM dizer que isso causa um conflito de interesse e retirar o direito de voto desse acionista é muito estranho", disse outro especialista.
No Brasil, as ações preferenciais têm algum tipo de vantagem no recebimento de dividendos, mas só têm direito a voto nas assembléias quando o tema em questão altera direitos seus.
O diretor da CVM Pedro Oliva Marcílio disse que a autarquia está aberta a ouvir argumentos de quem possui opiniões contrárias à interpretação da lei feita pela autarquia no parecer. "Se esses argumentos jurídicos forem apresentados, vamos analisá-los", destacou.
O advogado Luiz Leonardo Cantidiano, ex-presidente da CVM, afirmou discordar da posição da autarquia. "Não concordo em estabelecer um parecer de orientação genérico para todas as incorporações. Questões de conflito de interesse e benefício particular deveriam ser analisadas caso a caso", disse. Para ele, muitas vezes só é possível avaliar a posteriori se houve vantagem para alguma parte. Cantidiano não quis comentar especificamente o caso da Telemar.
A generalidade do parecer também provocou a queda, ontem, das ações ordinárias da Brasil Telecom e da TIM, operadoras que o mercado aposta que dariam uma solução parecida com a da Telemar para o conflito societário que enfrentam há anos.
Em contrapartida, as ações preferenciais da Telemar e da BrT subiram. "O parecer da CVM transferiu quase todo o poder de barganha para as PNs", ressaltou o analista-chefe do HSBC, Fábio Zagatti.
Para o analista-sênior da americana Brandes Investment Partners, Luiz Guilherme Sauerbronn, a medida é um passo "muito importante para a proteção dos acionistas minoritários no Brasil". A gestora já havia se queixado à Securites and Exchange Commission (SEC, a CVM americana) sobre a operação da Telemar e a estrutura de voto atribuída aos acionistas.
Apesar da avaliação positiva sobre o voto, Sauerbronn disse que a Brandes continua contra o modelo da reestruturação da Telemar porque ele embute uma diluição significativa dos preferencialistas. "Somos a favor da ida para o Novo Mercado, mas não desse jeito."
Na interpretação dele, a questão do voto não emergiu em outros casos de pulverização do controle - como Embraer e Perdigão - porque a diluição dos preferencialistas foi bem menor.