Título: SDE pede punição a frigoríficos por suposta formação de cartel
Autor: Basile, Juliano e Zanatta, Mauro
Fonte: Valor Econômico, 22/08/2006, Agronegócios, p. B12

Mais da metade da exportação de carne bovina brasileira é realizada por indústrias frigoríficas participantes de um cartel formado no mercado interno, concluiu a Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça ao recomendar, ontem, ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) a condenação de oito empresas e de 13 dirigentes do setor por cartelização. Estão na lista os frigoríficos Minerva, Mataboi, Estrela D'Oeste, Marfrig, Friboi, Bertin, Frigol e Franco Fabril.

O processo, aberto a pedido da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA) e da Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados, é a maior investigação já realizada contra a formação de cartel nos preços das carnes no país. A SDE afirma ter obtido provas de que os frigoríficos tabelaram os preços pagos aos pecuaristas. As tabelas continham, inclusive, deságios que deveriam ser praticados nas operações.

As indústrias realizavam, segundo a SDE, reuniões freqüentes para discutir o tabelamento dos preços no mercado interno. "O presente processo (...) evidencia a existência de um acordo entre as empresas frigoríficas com a finalidade de restringir e prejudicar a livre concorrência no setor de abate de gado bovino nas diversas regiões brasileiras", diz o parecer do secretário de Direito Econômico, Daniel Goldberg.

Diante das evidências recolhidas ao longo de 17 meses de investigação, a SDE recomendou ao Cade a condenação de administradores e gerentes comerciais dos oito frigoríficos. Os 13 acusados podem ser proibidos de atuar no mercado, além de responder a ação penal do Ministério Público. A pena por formação de cartel vai de 1% a 30% do faturamento de cada uma das empresas. O Cade definirá os percentuais, segundo a gravidade do cartel e as provas obtidas pela SDE. Os frigoríficos Boifran, Tatuibí e Bom Charque foram investigados pela Secretaria e absolvidos por falta de provas.

No Cade, a tendência é uma decisão pela condenação definitiva dos frigoríficos, já que o órgão antitruste tem acolhido os pareceres da SDE em grandes investigações de cartel. Nos últimos anos, com base em pareceres da SDE, o Cade condenou desde pequenos postos de gasolina que cartelizaram o mercado em suas cidades até grandes siderúrgicas e empresas do setor de construção civil.

Sete dos oito frigoríficos investigados produzem 725,7 mil toneladas de carne bovina por ano - ou 49,8% do total do país, estimado em 1,46 milhão de toneladas. Somada a produção do Frigol, o cartel responderia por mais da metade da produção brasileira, afirma a SDE.

Os dados feitos pela da SDE indicam que os frigoríficos investigados têm quase 50% do mercado de São Paulo e Goiás. As indústrias respondem por 43% do mercado em Minas Gerais e Rondônia, 34% no Mato Grosso e 30% no Mato Grosso do Sul.

O parecer afirma que o cartel afetou não apenas os produtores de gado, mas também grandes redes varejistas e consumidores. A partir dos dados do Sindicato das Indústrias Varejistas de São Paulo, que estima que 70% das vendas de carne bovina no mercado interno ocorrem nos supermercados, a SDE concluiu que a cartelização prejudicou as redes, que adquiriam o produto dos frigoríficos, e os consumidores, que compraram a carne com preços mais altos em função da cartelização.

As investigações contra os frigoríficos começaram após denúncia feita pela CNA, com apoio da Câmara dos Deputados, em março de 2005. A CNA revelou que uma reunião entre frigoríficos, em 24 de janeiro de 2005, em São José do Rio Preto (SP), determinou os preços que deveriam ser pagos pelo boi gordo. Os frigoríficos alegam que o encontro era para discutir efeitos do novo regime tributário previsto pela Medida Provisória nº 232 no mercado de carnes.

A SDE concluiu, porém, que o encontro serviu para fixar preços. Segundo a secretaria, nenhum advogado ou consultor jurídico das empresas participou do encontro. Apenas responsáveis pelas áreas comerciais. A secretaria obteve cópia da tabela de preços e, após ouvir as empresas, concluiu que o encontro de Rio Preto não foi um fato isolado no mercado de abate de gado bovino. "Muito pelo contrário, de acordo com diretores e até mesmo proprietários de alguns frigoríficos representados, reuniões como a de São José do Rio Preto, são comuns e ocorrem com certa freqüência", diz o parecer do secretário Goldberg.