Título: Cai o endividamento em dólares das companhias abertas
Autor: Góes, Francisco
Fonte: Valor Econômico, 10/08/2006, Empresas, p. B2

As empresas de capital aberto não-exportadoras aproveitaram a valorização da taxa de câmbio nos últimos anos para reduzir a parcela da dívida em dólares sobre o seu passivo total. O ajuste tornou estas empresas menos vulneráveis às variações do câmbio e ampliou a sua capacidade de alavancagem caso o Brasil volte a crescer em ritmo mais acelerado nos próximos anos.

A análise, feita pelo economista Marcelo Nascimento, do BNDES, faz parte da Visão do Desenvolvimento, publicação semanal do banco. O trabalho mostra que o endividamento em moeda estrangeira das empresas não-exportadoras de capital aberto, que representava 20% da dívida total em 2000, caiu para 13% em 2005. Em 2002, quando houve forte desvalorização cambial, esse indicador bateu em 37%.

Em contrapartida, as empresas exportadoras, que têm parte da receita em dólares, aumentaram o endividamento em moeda estrangeira em relação ao seu passivo total de 49%, em 2002, para 51%, em 2005. O trabalho analisou dados de balanços das 227 empresas de capital aberto de setores não-financeiros, disponibilizados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e pela consultoria Economática, para o período 2001-2005. O trabalho também apresenta dados relativos a 2000.

Segundo o estudo, a amostra de empresas abertas analisada reduziu o endividamento líquido (dívida bruta menos aplicações e disponibilidades) de R$ 168 bilhões, em 2000, para R$ 130,7 bilhões no ano passado, uma queda de 22,2%. Nascimento disse que a escolha de uma série histórica restrita tentou privilegiar a estabilidade, ou seja, ter um conjunto considerável de empresas presentes em todos os anos da amostra.

Ele negou que houvesse qualquer propósito político na análise, ao atrelar a forte redução do endividamento das empresas com o período do atual governo. "Em 2000 uma parcela das empresas ainda estava passando por reestruturação de dívida, processo que foi concluído a partir de 2002. Daquele ano em diante, houve melhoria na condição de endividamento das companhias, o que se intensificou em 2003 e 2004", disse Nascimento.

Ernani Torres, chefe da Secretaria de Assuntos Econômicos do BNDES, acrescentou que o trabalho assinado por Nascimento revela uma redução total de 12,2% na participação do endividamento externo das empresas entre 2002 e 2005. A queda é explicada em 75% pela valorização do câmbio e em 25% pelo "efeito quantidade", ou seja, a variação no estoque de dívida externa, medido em dólar. Ao avaliar as empresas não-exportadoras nota-se, porém, que quase 80% da redução da dívida foi motivada pela queda do endividamento em moeda estrangeira.

Torres reconhece que isso não significa, porém, que as empresas vão investir mais. Segundo ele, o banco prepara estudo, que deve ser concluído em setembro ou outubro, mostrando que o investimento das empresas pode estar se acelerando. O banco começou a levantar os projetos em carteira e identificou que há dois grandes blocos de investimento em curso: um no setor de petróleo e gás e outro em mineração e siderurgia. "O que não sabemos é em que medida isso [o investimento em alguns setores] pode gerar um processo generalizado de investimento ou se trata-se de um movimento localizado", afirmou Torres.

Ele reconhece que a redução do endividamento das empresas, por si só, não necessariamente é uma boa notícia. O endividamento ajuda as empresas a crescerem mais, mas torna os agentes (pessoas físicas e empresas) mais vulneráveis, analisou Torres. E acrescentou: "A redução da dívida e, sobretudo, a queda da dívida em dólares das empresas não-exportadoras é uma boa notícia porque se a economia voltar a crescer a ritmo mais forte as empresas estarão com melhor saúde financeira para enfrentar o desafio", prevê Torres.

Dados da Economática mostram que o endividamento das empresas brasileiras era baixo no início da década se comparado ao patamar americano. Em junho de 2000, o endividamento representava 85,5% do patrimônio líquido nas empresas dos Estados Unidos. No Brasil, essa relação era de 48,8%.