Título: Agronegócio pode perder fatia no PIB global
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Fonte: Valor Econômico, 23/08/2006, Agronegócios, p. B12

A crise de renda nos segmentos de grãos e da pecuária atingiu em cheio os setores ligados ao agronegócio. Estimativas divulgadas ontem pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) mostram que o PIB do setor deve recuar 1,91% em 2006 e o faturamento bruto da agropecuária cairá 4,3%. As projeções, baseadas no desempenho registrado até maio, indicam que o PIB da indústria de insumos, por exemplo, deve ter baixa de 2,16% neste ano.

O segundo mau resultado consecutivo do PIB do agronegócio, que já registrou retração de 4,66% em 2005, pode levar o setor a reduzir sua fatia no PIB global do Brasil em 1,4 ponto percentual, segundo CNA/Cepea. Se a economia brasileira crescer os 3,5% estimados pelo Banco Central, a fatia do agronegócio cairá de de 27,9% para 26,4%.

Confirmado o resultado, seria o pior desempenho desde o início do Plano Real em 1994. No auge dos "anos dourados" do setor em 2003, a fatia no PIB global chegou a 30,6%. "Isso é resultado direto de uma valorização cambial de 8,4% só neste ano. O câmbio continua a ser um problema sério", resume o superintendente-técnico da CNA, Ricardo Cotta. "Além disso, a indústria já sente os efeitos da queda das cotações internas e da redução na produção de culturas como algodão, arroz e trigo".

A CNA estima que o desempenho desfavorável deste ano causará um impacto negativo de 0,4 ponto percentual no cálculo do PIB global do país. "Se não fosse esse resultado do agronegócio, a economia brasileira poderia crescer acima do projetado", diz Cotta.

Em contraste com o ápice registrado entre 2002 e 2004, o PIB do agronegócio deve somar R$ 527,4 bilhões este ano - em 2005, foram R$ 537,6 bilhões. Ou seja, a atual crise de renda deve significar uma perda de R$ 10,25 bilhões ao setor. Sozinho, o PIB do setor primário da agropecuária deve cair R$ 6,1 bilhões (-4%), de R$ 153 bilhões para R$ 146,9 bilhões. "A crise de rentabilidade resultou num desestímulo no campo, queda de 10% sobre a produção na próxima safra", diz. De 2004 a 2006, o setor perdeu R$ 36,5 bilhões em renda.

Na avaliação da CNA, os resultados refletem a baixa remuneração dos produtores e a elevação dos custos na formação da renda, ambos transmitidos ao longo da cadeia para indústrias de insumos, de transformação e de distribuição. "A infra-estrutura continua precária. O custo de frete de Mato Grosso a Paranaguá, por exemplo, subiu 36% em dois anos", afirma Cotta.

Os maus resultados são confirmados pela queda significativa do valor bruto da produção (VBP), que mede o faturamento dos 25 principais produtos agropecuários. O recuo de 4,3% neste ano será puxado pela pecuária (7,2%), sobretudo no segmento de suínos (14,8%), e pelas lavouras de soja (15,3%), arroz (28,9%), algodão (31,5%), trigo (25%) e uva (30%).

A crise do setor tem ajudado, entretanto, o governo a controlar a inflação e a ampliar a oferta de alimento barato nas cidades, segundo a CNA. Um estudo da entidade revela que a inflação geral medida pelo IPCA do IBGE chegou a 4,03% nos últimos 12 meses até junho. No mesmo período, porém, o IPCA da alimentação registrou deflação de 2,77%. "Ou seja, sem a ajuda dos baixos preços agrícolas, a inflação oficial chegaria a 4,59% nos últimos 12 meses, um impacto significativo".(MZ)