Título: Preço de indenização duplica no São Francisco
Autor: Borges ,André
Fonte: Valor Econômico, 11/05/2012, Brasil, p. A4

A transposição do rio São Francisco, maior obra de infraestrutura do país tocada com recursos da União, ganhou mais um capítulo para a sua coleção de irregularidades. Desta vez, os problemas estão relacionados à desapropriação dos imóveis que estavam ou ainda estão no caminho dos mais de 600 quilômetros de calhas de cimento da obra. Uma auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) identificou indícios de superavaliação na desapropriação de milhares de imóveis. As indenizações analisadas pelos auditores totalizam R$ 69 milhões.

Os indícios são de que os valores globais das benfeitorias pagas às famílias teriam superado em 574% e em 222%, respectivamente, os limites inferiores e superiores usados como referência pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Essa superavaliação, no entendimento dos auditores, é reflexo de defeitos encontrados na metodologia usada para o calculo dos valores de indenização.

"Foram apontadas deficiências metodológicas dos critérios adotados pela Comissão de Avaliação e Desapropriação (CAD) para avaliação das terras nuas e benfeitorias, reprodutivas e não reprodutivas", relatam os auditores do órgão de fiscalização.

Segundo o levantamento, "os valores das indenizações de imóveis foram substancialmente aumentados" no período compreendido entre a avaliação inicial dos imóveis e a reavaliação de laudos, feita posteriormente. O relator do processo, ministro Raimundo Carreiro, recomendou ao Ministério da Integração Nacional que, enquanto não sanar os problemas, suspenda os pagamentos de indenizações dos imóveis desapropriados, se ainda houver pagamentos pendentes. O TCU também pediu explicações para servidores públicos que estiveram envolvidos nos processos de desapropriação.

Ao todo, as indenizações auditadas pelo tribunal atingem 1.889 propriedades. O valor dos pagamentos, conforme o balanço inicial realizado pelo ministério, previa o desembolso de R$ 34,3 milhões, cifra que saltou para R$ 69 milhões. A área inicialmente prevista para ser desapropriada era de 25,2 mil hectares, mas essa extensão cresceu e atingiu 34,9 mil hectares.

Procurado pelo Valor, o Ministério da Integração informou apenas que o relatório já foi encaminhado para a equipe técnica para análise. "Todas as orientações, recomendações e determinações dos órgãos de controle - Tribunal de Contas da União e Controladoria Geral da União"- são rigorosamente assimiladas e implementadas em todos os projetos do Ministério da Integração Nacional", informa a nota.

Desde o ano passado, o Ministério da Integração negocia a retomada de obras em diversos lotes da transposição. Boa parte das obras ficou abandonada por conta dos pedidos de aditivos de contrato apresentados pelas empreiteiras que assumiram as obras. Há inúmeros erros nos projetos básicos de engenharia da obra, além de descompasso na execução de projetos, como o atraso na construção das subestações de energia que irão bombear a água do rio São Francisco.

Em março, o TCU voltou a apontar indícios de superfaturamento no projeto. O preço da transposição, de fato, explodiu. Inicialmente, estimava-se R$ 5 bilhões, mas a Integração já fala em R$ 8,2 bilhões. Hoje há cerca de 3.500 pessoas trabalhando em diversos trechos de obra, segundo o ministério, volume projetado para chegar a 6.500 trabalhadores até o fim do ano.

A transposição prevê a construção de canais para desviar águas do rio São Francisco para o semiárido. Ao todo, quatro Estados do Nordeste são atendidos: Ceará, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte. A complexidade da transposição envolve, além das estações de energia e de bombeamento de água, a construção de 36 barragens, 17 aquedutos, sete túneis, 63 pontes, 35 passarelas e 165 tomadas de água.