Título: Congresso e Judiciário se enfrentam por Gurgel
Autor: Magro , Maíra
Fonte: Valor Econômico, 11/05/2012, Política, p. A6

As declarações do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, de que "pessoas com medo do mensalão" estariam interessadas em desmoralizá-lo acirraram os ânimos de integrantes da CPI do Cachoeira e, segundo parlamentares, aumentaram as chances de sua convocação. Enquanto isso, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) saíram ontem em defesa de Gurgel.

O presidente da CPI do Cachoeira, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), disse que a fala de Gurgel "colocou fogo" na CPI e aumentou as chances de sua convocação. Para o relator da comissão, deputado Odair Cunha (PT-MG), o procurador deve explicar por que demorou a abrir investigações em relação à operação Vegas da Polícia Federal. Segundo Cunha, as informações poderiam, no entanto, ser prestadas por escrito. Os requerimentos sobre a convocação de Gurgel serão definidos no dia 17.

O comando do PT recuou em relação à pressão para Gurgel deponha na CPI. O presidente do partido, deputado estadual Rui Falcão (SP), cobrou ontem explicações do procurador, mas desconversou sobre a obrigação de ele ser convocado na comissão.

Falcão disse que "nenhuma pessoa está acima da lei no Brasil" e que, por isso, Gurgel deve responder a algumas perguntas. No entanto, o dirigente afirmou que o PT não dará nenhuma orientação aos petistas que compõem a CPI para convocar Gurgel. Ao ser questionado diretamente se o partido pedirá o depoimento do procurador-geral na comissão, Falcão respondeu: "Essa pergunta deve ser dirigida aos membros da CPI, que têm um plano de trabalho, um roteiro. Eu não sei se eles pretendem, se alguém do PT que participa da CPI ou se outros membros da CPI pretendem convocá-lo. A CPI tem poder de convocação de qualquer autoridade, mas a decisão de convocar ou não é da CPMI", disse Falcão, após reunir-se ontem com a Executiva do PT, em São Paulo.

O ministro do STF Gilmar Mendes defendeu o chefe do Ministério Público Federal, dizendo que os ataques a ele têm relação com o mensalão - já que o procurador-geral é responsável por sustentar a acusação dos 38 réus. "São pescadores de águas turvas, pessoas interessadas em misturar excitações, tirar proveito, inibir as ações dos órgãos que estão funcionando normalmente", disse Mendes, em relação aos autores das críticas a Gurgel. "Ele é um excelente procurador-geral", afirmou na quarta-feira o presidente do STF, Carlos Ayres Britto, durante a sessão que avaliava uma questão de ordem referente à metodologia de julgamento do mensalão. Integrantes do Ministério Público Federal (MPF) também divulgaram notas ontem em apoio a Gurgel.

Apesar disso, na sessão da CPI do Cachoeira, o depoimento do delegado da Polícia Federal Matheus Rodrigues, responsável pela Operação Monte Carlo, poderia enfraquecer as justificativas do procurador quanto a sua conduta em relação ao inquérito da Operação Vegas, que encontrou relações entre Cachoeira e o senador Demóstenes Torres (ex-DEM, sem partido, GO).

Gurgel disse que optou por não abrir inquérito contra Demóstenes em 2009 devido a uma estratégia para permitir a continuidade das operações, sem que os envolvidos tomassem conhecimento delas. Mas delegados da PF rebatem a tese. Eles apontam que, ao invés de gerar mais investigações, a operação Vegas foi interrompida naquele ano, com o envio dos documentos à Procuradoria-Geral da República. Não houve buscas e sequer prisões.

Além disso, segundo delegados da PF, a operação Monte Carlo não foi um desdobramento da Vegas. Enquanto a Vegas começou como operação de contra-inteligência em Anápolis (GO), a Monte Carlo teve início quase um ano depois a pedido do Ministério Público de Goiás, para investigar uma quadrilha de jogos ilegais em Valparaíso. Ambas chegaram aos mesmos alvos, só que paralelamente.

Devido aos protocolos de segurança da PF, os participantes e os chefes de uma operação não tinham conhecimento da outra, inicialmente, segundo delegados que acompanham o caso. Ou seja, em 2009, nem a PGR poderia saber que a operação Monte Carlo teria início em novembro de 2010.