Título: Risco-Brasil cai mais que a média
Autor: Lucchesi, Cristiane
Fonte: Valor Econômico, 10/08/2006, Finanças, p. C1

O risco-Brasil despencou ontem, para 207 pontos básicos, seu menor nível na história. É o efeito pós-Fed, o banco central dos Estados Unidos, que anteontem manteve em 5,25% os juros básicos americanos, a primeira pausa em mais de dois anos, trazendo alívio aos mercados emergentes.

Os analistas acreditam que há espaço para maiores quedas no risco-Brasil e que a barreira psicológica dos 200 pontos básicos será testada em breve. A principal razão: uma enxurrada de dólares vai continuar a ingressar no país com os juros estáveis nos EUA, o crescimento econômico internacional em níveis ainda razoáveis, os preços dos commodities elevados e os juros reais no Brasil entre os maiores do mundo. Os dólares de sobra ajudam o governo a reduzir sua dívida cambial e o risco de um calote da dívida externa se torna cada vez menor, com queda no risco-Brasil.

Devem entrar no país US$ 11,3 bilhões líquidos no mercado de câmbio no terceiro trimestre e mais US$ 3,4 bilhões no quarto trimestre, segundo estima Alexandre Lintz, estrategista-chefe para América Latina do BNP Paribas. Isso já descontados os US$ 6 bilhões que serão adquiridos pelo Tesouro Nacional. Esses US$ 14,7 bilhões deverão ser adquiridos pelo Banco Central para evitar que o dólar "derreta" e o real se valorize ainda mais. Em julho, o BC comprou US$ 5,1 bilhões e mais US$ 1,8 bilhão já foi adquirido em agosto. As reservas internacionais do país podem terminar o ano em US$ 80 bilhões.

Esse é o tamanho do poder de fogo do governo para pagar antecipadamente a dívida externa que só venceria no futuro. Ao entrar comprando títulos da dívida no mercado secundário, o BC, atuando como agente do Tesouro Nacional, acaba pressionando os preços para cima. Neste ano, até junho, foram recomprados US$ 12,2 bilhões. E o mercado sabe que as compras continuam: o Tesouro anunciou programa de US$ 20 bilhões para 2006.

Se a demanda pelos papéis da dívida brasileira cresceu, a oferta se tornou cada vez menor. As recentes especulações de que o governo brasileiro lançaria um título novo foram negadas pelo Tesouro. Das necessidades de financiamento de US$ 9 bilhões para o biênio 2006/2007, faltam apenas US$ 3,7 bilhões para o Tesouro captar. Mas, com reservas crescendo, talvez nem os US$ 3,7 bilhões serão necessários. A própria expectativa de redução do total de títulos em poder do mercado ajuda a derrubar o risco-Brasil. Lintz calcula que o governo já tenha posições ativas em dólar em cerca de US$ 18 bilhões considerando-se a dívida interna e externa, "swaps" e reservas.

Os dólares que têm entrado no país vêm principalmente dos exportadores. A balança comercial de setembro, de US$ 5,6 bilhões, foi um recorde histórico. O superávit em conta corrente esperado para julho também deverá ser um recorde, de US$ 3,6 bilhões, assim como os US$ 7,6 bilhões previstos por Lintz para o trimestre.

O Departamento de Economia do Bradesco está "com viés de alta" para o superávit da balança comercial neste ano, segundo seu diretor, Octavio de Barros. "Nossa projeção é de US$ 43,4 bilhões, mas não nos surpreenderíamos se este número bater nos US$ 45 bilhões", afirmou ele. Isso significa que o saldo positivo da balança comercial neste ano poderá passar os US$ 44,8 bilhões do ano passado - contrariando todas as expectativas, que previam inicialmente um número bem menor para 2006. "Os preços dos commodities estão mais elevados do que prevíamos e as exportações brasileiras continuam a crescer para todas as regiões", diz Lintz. Ele se surpreendeu também com os números das vendas de etanol e de açúcar.

Os investimento direto externo também vem se mantendo estável e o ingresso de recursos para investimento em ações, títulos do governo e renda fixa dos estrangeiros acumulou US$ 8,1 bilhão até junho.

Não é à toa que o risco-Brasil vem caindo mais do que a média dos países emergentes, excluídos o próprio Brasil e a Argentina. A diferença entre o risco brasileiro e a média, que chegou a seu pico em 27 de setembro de 2002, a 1.936 pontos básicos, foi a 209 pontos no início de agosto de 2005 e despencou para cerca de 70 pontos, segundo o BNP Paribas. Nos cálculos do Bradesco, o risco-Brasil ficou abaixo da média em sete pontos básicos ontem.