Título: Reunião do G-20 no Rio vira miniministerial
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 31/08/2006, Brasil, p. A8

A reunião do G-20, grupo coordenado pelo Brasil, nos dias 9 e 10 de setembro, no Rio, se transformará na prática numa mini-conferência ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), a primeira depois da suspensão da Rodada Doha, em fins de julho. Durante o encontro, o grupo que inclui Índia, China, Indonésia e Argentina, conclamará os principais parceiros a retomarem o mais rapidamente possível a Rodada Doha, insistindo que a primeira negociação internacional focada no desenvolvimento e na liberalização agrícola não pode ser interrompida.

O evento tomará uma dimensão maior pela participação dos principais atores da negociação. Além do diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Pascal Lamy, confirmaram presença a representante americana de Comércio, Susan Schwab, o comissário europeu de Comércio, Peter Mandelson, e o ministro de Agricultura do Japão, Shoichi Nakagawa - que é por onde passará qualquer entendimento.

"Essa participação é muito importante porque mostra o engajamento dos principais parceiros na continuidade da rodada", comentou ao Valor o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, ao anunciar a transformação da reunião do G-20 em uma espécie de mini-ministerial. "Mostra que houve um colapso sério das negociações em Genebra, mas não a paralisação da rodada", avaliou Amorim.

Representantes de todos os grupos de países em desenvolvimento nas negociações da OMC, como G-33, ACP (países da África, Caribe e Pacífico), Caricom (América Central) e países africanos produtores de algodão, vão estar presentes no Rio. Pelo formato da reunião, os representantes desses países participarão da reunião com os ministros do G-20, e, no dia seguinte, haverá o encontro com os emissários dos Estados Unidos, União Européia e Japão. O próprio governo brasileiro tomou a iniciativa de informar aos parceiros dos países desenvolvidos que seria bem vinda sua participação no encontro.

Nesse cenário, os ministros do G-20 divulgarão um comunicado mostrando que ninguém está satisfeito com a paralisação da rodada. A diplomacia brasileira quer evitar o interregno que ocorreu depois do fiasco da conferência de Cancún, em 2003, quando a negociação ficou congelada por mais de seis meses.

O objetivo é "remobilizar" e então discutir passos concretos a fim de reativar a rodada. Para um negociador asiático, não será uma surpresa se algum país manifestar o desejo de ter um pacote até dezembro sobre modalidades agrícolas e industriais (a maneira de fazer a liberalização), mas sem os percentuais de cortes.

Apesar da eleição legislativa nos Estados Unidos em novembro, certos negociadores notam que a representante comercial americana, Susan Schwab, está viajando pelo mundo também se mobilizando em favor da retomada de Doha. E o engajamento dos outros países pode ajudar a administração Bush a buscar no Congresso a renovação da chamada Trade Promotion Authority (TPA), lei que permite ao Executivo dos EUA fechar acordos de comércio sem risco de emendas no Congresso, que expira em julho de 2007.

Schwab admitiu a dificuldade para recolocar Doha nos trilhos, em visita a Pequim. Ela acha que "talvez seja necessário examinar outros processos e players" fora do G-6, o grupo dos países-chaves (Estados Unidos, União Européia, Brasil, Índia, Japão e Austrália).

A representante americana conclamou a China a ter um papel mais importante na rodada, compatível com seu poder na economia, dizendo estranhar que Pequim aceite ter sua posição articulada por Brasil e Índia em grupos restritos na OMC. A China já deixou claro que quer integrar grupos mais restritos, como o G-6, onde estão apenas Brasil e Índia como países em desenvolvimento. Mas há dois problemas. Primeiro, participar no centro da negociação significa ser cobrado a contribuir mais para abrir o comércio mundial. E a China ainda não parou de exigir exceções à abertura comercial, estimando que já liberalizou bastante quando entrou na OMC.

Além disso, o ministro de comércio, Bo Xilai, nunca aparece em reuniões. Manda um vice-ministro, que por mais competente que seja, não tem a dimensão política do chefe para influenciar Amorim, Mandelson ou Schwab.

O secretário de Agricultura dos EUA, Mike Johanns, e o ministro de Comércio do Japão, Toshihiro Nikai, também estão quase confirmados para a reunião no Rio. O ministro australiano, Mark Vaile, manifestou interesse em participar, mas ainda tinha problemas com as datas.