Título: Exército no combate ao PCC contraria ministro da Defesa
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 23/08/2006, Especial, p. A16

O Exército brasileiro, apesar da insistência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, não tem condições de combater a onda de violência promovida pelo PCC em São Paulo. Desde que a crise na segurança pública paulista estourou, em maio, o Planalto vem insistindo na oferta de 10 mil soldados ao governo Cláudio Lembo. Mas o ministro da Defesa, Waldir Pires, é o primeiro a afirmar que o Exército não está preparado para esse tipo de enfrentamento. "Não há treinamento específico, não há armamento apropriado", resumiu.

Para o ministro, as Forças Armadas têm a missão de garantir a soberania nacional e não podem transformar-se em esperança da população diante da falência dos órgãos públicos responsáveis por assegurar a paz interna. Entre os militares, o sentimento é o mesmo. O brigadeiro da reserva Eden de Oliveira Asvolins que confirma que, entre os comandantes das tropas, ninguém apóia a idéia de Lula de colocar o Exército na ruas para combater os criminosos. "Isso geraria um desgaste tremendo. Evidentemente, se a ordem for dada, será cumprida, por uma questão de respeito à hierarquia", reconheceu.

Essa é apenas a mais evidente insatisfação que os militares nutrem em relação ao governo. Depois de três anos e meio de gestão petista, a categoria sente-se desprestigiada e, apesar de receber em dia os salários, reclama que os vencimentos estão defasados. "Um general de quatro estrelas, com 45 anos de serviços, repleto de cursos no Brasil e no exterior, recebe hoje R$ 9 mil", reclama o brigadeiro da reserva que, exatamente por não estar na ativa, pode falar mais abertamente das insatisfações.

A ex-presidente da União Nacional das Esposas de Militares das Forças Armadas, Unemfa, Ivone Luzardo, calcula em, aproximadamente, 300% a defasagem de vencimentos recebidos pelos militares da ativa. Ela chega a ironizar, afirmando que o cidadão ingênuo pode até pensar que a redução no orçamento do Ministério da Defesa pode ser decorrente de um corte nos gastos públicos.

Para Ivone, esse argumento extingue-se com o reajuste concedido à Polícia Militar do Distrito Federal, gerando discrepâncias entre os militares das duas forças que ocupam postos semelhantes. "O dinheiro provém da mesma fonte pagadora - a União. Não contestamos os reajustes salariais dados aos PMs ou bombeiros da capital federal, mas o defasado salário dos militares das Forças Armadas".

Asvolins reconhece que o governo Lula concedeu os reajustes salariais que ficaram faltando durante os oito anos de gestão Fernando Henrique. "Mas ele saiu em duas partes (13% ano passado e 10% este ano) e atrasado, já que estava previsto inicialmente para 2004". O brigadeiro afirma que, ideologicamente, não há diferenças de opinião entre tucanos e petistas em relação às Forças Armadas. "As distinções são que os primeiros têm uma origem intelectual e os segundos, vêm da classe trabalhadora. Ambos, contudo, sempre buscam denegrir as Forças Armadas, por conta de um clima de revanchismo em relação ao passado".

O ministro da Defesa não concorda que o governo Lula tenha dificuldades em lidar com as Forças Armadas por conta dos embates vividos entre as duas partes durante os governos militares em passado recente. Waldir Pires afirma que as barreiras são estritamente orçamentárias: "A dificuldade está no que o presidente chama de cobertor curto. O país acumulou uma dívida social gigantesca, insuportável".

Segundo ele, apesar disso, o governo tem conseguido caminhar bem nesse área. "As parcelas de investimentos, de custeio, de munição, de equipamentos são pequenas, mas é o que se tem podido fazer". Pires destaca o aumento no recrutamento de jovens e programas como o soldado-cidadão: "Na medida que este recruta volta à sociedade civil com condições de exercer uma profissão, incorpora-se rapidamente à sua comunidade".

O ministro petista lembra que o governo atualizou parte da Força Aérea Brasileira (FAB), adquirindo os Mirage 2000 C e fortalecendo a Embraer, com a fabricação dos Supertucanos, aeronaves turbo-hélice muito usados na vigilância do espaço aéreo de fronteira, sobretudo nas operações enquadradas na "Lei do Abate".

O próximo passo será atualizar a esquadra de navios e submarinos nacionais. "Parte da produção de petróleo do Brasil está na plataforma oceânica, que a Marinha chama de Amazônia azul. São 4,5 milhões de quilômetros quadrados - mais da metade do território brasileiro. Precisamos de navios ágeis, fortes, capazes", defendeu o ministro Waldir Pires.