Título: Analistas esperam efeito pequeno do câmbio no IPCA
Autor: Lorenzo , Francine De
Fonte: Valor Econômico, 16/05/2012, Brasil, p. A3

A escalada do dólar nas últimas semanas deve ter efeito reduzido sobre a inflação ao consumidor neste ano, pelas contas de economistas consultados pelo Valor. A moeda americana abandonou o nível de R$ 1,85, que vigorava até meados de abril, e chegou a bater R$ 2 nos últimos pregões. O movimento brusco não preocupou o governo. Muito pelo contrário. Satisfeito, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou na segunda-feira que a valorização do dólar "beneficia a economia brasileira".

A tranquilidade do Planalto, afirmam analistas, se justifica, ao menos no âmbito da inflação. "Grande parte do IPCA deste ano já está encomendada. Não teremos fortes pressões de administrados e indexados, além do quadro de atividade econômica modesta e do alto endividamento da população, que dificultam os aumentos de preços", diz Fabio Romão, da LCA Consultores.

Para ele, ainda que o câmbio deixe de contribuir para uma inflação mais baixa, não há espaço para disparadas de preços. "Algum repasse poderá acontecer quando a economia começar a se recuperar com mais vigor, o que é esperado no segundo semestre. Mas seria um aumento marginal, por uma questão de oferta e demanda", diz.

Por enquanto, ressalta Romão, o cenário internacional incerto, com a crise na Europa ganhando novos contornos a cada notícia que se apresenta, mantém as commodities comportadas e ajuda a sustentar a inflação em 12 meses em trajetória decrescente. Nos 12 meses encerrados em abril, o IPCA acumulou alta de 5,1%, a menor taxa desde setembro de 2011. Até o fim do ano, a LCA acredita que o indicador oscilará entre 5% e 5,2%, baixando para 4,8% em dezembro. Esse percentual, acrescenta Romão, já embute a expectativa de retomada econômica no segundo semestre. "Se não fosse por isso, a inflação seria ainda menor", afirma.

Mesmo acreditando que o câmbio produzirá algum impacto sobre a inflação, Pedro Paulo Silveira, da Tov Corretora, não alterou sua previsão de alta de 5,2% para o IPCA em 2012. "Um patamar de câmbio a R$ 2 não gera mudança de expectativa. Ninguém vai disparar preços por isso. Mas se o dólar continuar subindo nesse ritmo, o quadro poderá mudar", alerta.

Até um certo nível, lembra o economista, as empresas acomodam a valorização da moeda americana em suas margens de lucro. Por isso, quanto mais intensa a alta do dólar, maior o potencial de reajuste de preços.

Segundo Silveira, o repasse da variação cambial aos preços geralmente varia de 5% a 8%, dependendo de sua magnitude e das condições do mercado de trabalho. A demanda global também influencia a conta, já que, dependendo da gravidade da situação, as empresas aceitam reduzir seus preços, permitindo que os produtos cheguem às prateleiras sem reajustes, mesmo com a valorização do dólar.

Nas commodities, observa Silveira, é possível notar essa compensação. Apenas neste mês, o índice CRB de commodities caiu 5,7%, enquanto a valorização da moeda americana no período foi de 4,8%. Pelo menos até o fim de 2012, de acordo com o economista, não há pressões à vista sobre os preços das matérias-primas.

A maior preocupação de Brasília no momento, diz Fernando Fix, economista-chefe da Votorantim Wealth Management, é com a atividade doméstica e o desempenho da indústria. Ainda que exista o risco de maior pressão inflacionária por conta do câmbio, ele destaca que o IPCA em 2012 deverá ficar muito abaixo do teto da meta, de 6,5%. "Por isso, o governo não está preocupado com a inflação."

Pelas suas estimativas, o IPCA fechará o ano com alta de 5,3%. Embora não descarte a permanência do dólar na casa de R$ 2 por alguns meses, Fix trabalha com um cenário de arrefecimento até o fim de 2012, quando a moeda americana voltaria a ser cotada a R$ 1,85.