Título: Oposição ameaça novo impasse fiscal nos EUA
Autor: Ribeiro , Alex
Fonte: Valor Econômico, 16/05/2012, Internacional, p. A10

O risco de um eventual calote da dívida pública americana deve assombrar de novo o mercado financeiro entre fins deste ano e começo do próximo. Um importante líder da oposição ao presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, indicou ontem que não aceitará aumentar o teto de endividamento do governo sem que sejam feitos profundos cortes de gastos.

"Permitir que os Estados Unidos deixem de pagar a sua dívida seria irresponsável", disse o presidente da Câmara dos Deputados, o republicano John Boehner, num importante seminário sobre política fiscal em Washington. "Mas seria ainda mais irresponsável aumentar o teto da dívida sem adotar medidas para reduzir a dívida pública."

No mesmo evento, o secretário do Tesouro, Timothy Geithner, disse que o governo deverá atingir seu limite de endividamento, atualmente de US$ 16,4 trilhões, no fim deste ano. Com algumas manobras contábeis, o Tesouro conseguirá tomar recursos emprestados até começo de janeiro. A partir de então, corre o risco de entrar em "default". "Cumprir as obrigações da nação é um compromisso fundamental", alertou Geithner. "Você não pode ameaçar colocar isso a serviço da agenda partidária."

O aumento do teto da dívida costumava ser um ato apenas burocrático do Congresso, até os republicanos fazerem a maioria na Câmara, em 2010, com um discurso de austeridade. Em julho, o mercado entrou em pânico porque os republicanos bloqueavam o aumento do teto da dívida para forçar o governo a cortar gastos. O impasse foi superado apenas na última hora.

O teto da dívida é mais uma incerteza dentro de um quadro fiscal já bastante nebuloso. Se nada for feito, em janeiro entram em vigor cortes de gastos e aumentos de impostos que podem jogar para baixo a já fraca atividade econômica. Ao mesmo tempo, o país tem sido cada vez mais pressionado para tomar medidas de médio e longo prazos para conter a trajetória insustentável de sua dívida.

Ninguém espera nenhuma solução até começo de novembro, quando Obama disputa sua reeleição contra o ex-governador de Massachusetts Mitt Romney, virtual candidato republicano. Isso significa que os parlamentares - muitos dos quais não serão reeleitos - terão menos de dois meses para chegar a um acordo.

Analistas políticos preveem que, apesar das divisões, os dois lados acabarão se entendendo, mas apenas para uma solução provisória. Assim, seriam obrigados a voltar às negociações mais adiante, provavelmente na discussão do orçamento do ano fiscal que começa em outubro de 2013. Também é possível que Boehner esteja somente usando de retórica eleitoral para mobilizar a base mais conservadora de seu partido.

Toda essa incerteza contribui pouco para reforçar a confiança de consumidores e investidores. Há alguns dias, o presidente do Fed (Federal Reserve, o banco central americano), Ben Bernanke, afirmou numa reunião fechada com parlamentares democratas, segundo relatos da imprensa americana, que os Estados Unidos se aproximam de um "abismo fiscal" em janeiro, quando entram em vigor medidas de contenção fiscal que devem prejudicar a economia.

No acordo para aumentar o teto da dívida no ano passado, ficou acertado que, se o Congresso não chegasse a um entendimento sobre como reduzir o déficit público até fins de 2011, haveria um corte automático de US$ 1,2 trilhão nas despesas a partir de janeiro. Na mesma data, também expira um corte temporário na contribuição previdenciária, uma iniciativa do governo Obama para estimular a economia, e uma redução de imposto cobrado dos contribuintes de alta renda, uma medida adotada ainda no governo republicano de George W. Bush.

O Fundo Monetário Internacional (FMI), por outro lado, vem alertando que os Estados Unidos devem adotar medidas para conter a crescente dívida pública, que chegou a 103% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2011. O organismo recomenda manter estímulos à economia no curto prazo, ao mesmo tempo em que o país toma medidas estruturais de médio e longo prazos para reduzir o déficit público.