Título: Hedging-Griffo diz que alugou ações ON como proteção
Autor: Pavini, Angelo
Fonte: Valor Econômico, 04/09/2006, Finanças, p. C4

Sabe quem alugou e vendeu aquele monte de ações ordinárias (ON, com direito a voto) da Tele Norte Leste Participações (TNLP3) - holding do grupo Telemar - nos dias 17 e 18 de agosto, pouco antes de a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) divulgar um parecer que fez os papéis desmoronarem no dia 21? Ele mesmo, Luis Stuhlberger, um dos maiores e mais respeitados gestores independentes de recursos do país, sócio da Hedging-Griffo. "Fomos nós, nossas operações responderam por 80% do aluguel de ações daqueles dias", diz ele, com naturalidade. Nada de estranho, não fosse a suspeita levantada por uma carta anônima que circula pelo mercado de que quem fez os negócios teria ficado sabendo antes do comunicado, informado pela própria CVM. A redação do Valor também recebeu uma carta, postada dia 30, no Centro de São Paulo.

Foram justamente as denúncias anônimas que irritaram Stuhlberger e o levaram a querer contar tudo que aconteceu naqueles dias que antecederam a decisão da CVM que pode interromper uma das maiores operações de reestruturação do mercado acionário brasileiro e que deve influenciar uma série de outras que estavam a caminho. "E não teve nada de 'insider'", adianta.

Segundo Stuhlberger, as operações de aluguel e venda de ações TNLP3 feitas pelos fundos de investimento da Hedging-Griffo foram normais. Elas serviram para proteger uma aplicação muito maior que os fundos tinham em ações ordinárias de uma controlada da empresa, a Telemar Operadora, ou TMAR3. Stuhlberger decidiu vendê-las depois que a Telemar divulgou fato relevante no dia 17 confirmando a reestruturação. Como TMAR3 tem baixíssima liquidez no mercado, a saída foi alugar e vender o papel da holding, TNLP3, muito mais líquido.

A Hedging-Griffo tinha desde 2004 uma aplicação grande em ações ordinárias da Telemar Operadora por segurança, afirma Stuhlberger. "Não gostamos quando a holding da Telemar fez a operadora comprar dela a empresa de celulares Oi sem passar por assembléia, transferindo junto uma dívida de R$ 5 bilhões, por isso quis ter ações com direito a voto", diz Stuhlberger, que admite ter uma longa história de desavenças públicas com a operadora.

No total, os fundos da Hedging-Griffo tinham, no dia 17, R$ 60 milhões em ações TMAR3. Nesse mesmo dia, eles alugaram no mercado 350 mil ações da holding TNLP3 e, logo em seguida, venderam 380 mil delas. No dia seguinte, alugaram mais 50 mil e não venderam mais nada. "Alugamos 400 mil ações TNLP3 e vendemos 380 mil, no valor de R$ 27 milhões", diz Stuhlberger. "Consegui reduzir minha exposição líquida em Telemar ON para R$ 33 milhões", explica.

No final das contas, porém, os fundos da Hedging-Griffo acabaram perdendo com as ações que sobraram. "Fiquei com R$ 33 milhões que perderam 20% do valor, ou seja, R$ 6 milhões, no dia 21", diz ele. "Poderíamos ter vendido mais, mas seguimos nosso ritmo, de fazer as operações com calma, não imaginávamos que o cenário iria mudar tão rápido."

A questão, porém, é por que Stuhlberger resolveu vender justamente na véspera da divulgação do comunicado da CVM. Ele responde, chamando a atenção para a carta anônima. "A carta fala que a operação foi feita antes da nota da CVM, mas não fala que ela ocorreu depois do fato relevante da Telemar", diz ele. O comunicado saiu no dia 16 à noite e, no dia 17, o papel ON da Telemar subiu 5%, e a diferença (spread) entre a ação preferencial (PN) atingiu o ponto máximo em dois anos."Com isso, a relação risco-retorno mudou, eu poderia ter um ganho estimado de 10% com o papel ON se o negócio desse certo ou uma perda de mais de 30% se desse errado", explica.

Outro motivo para a venda foi que o comunicado da Telemar deixou mais claro que a operação criaria uma disputa jurídica terrível diante da perda que provocaria para os donos de PN. A própria Hedging-Griffo e outros investidores, aqui e no exterior, após discutirem o comunicado em reunião na Associação Nacional dos Investidores do Mercado de Capitais (Amec) no dia 17, estudavam ir à Justiça contra o que chamaram de confisco de patrimônio dos acionistas preferencialistas que os controladores da Telemar estariam promovendo, trocando uma ação ON por 2,6 ações PN, afirma Stuhlberger . "Diante disso, a possibilidade de a operação não ser bem sucedida era alta e decidimos sair da posição", diz. "Não precisaria ser 'insider' para pensar assim, outros fundos e gestores também fizeram isso olhando o potencial de ganho da ação e a briga por vir."

Stuhlberger não descarta a possibilidade de que possa ter havido vazamento de informação - como suspeitou a própria CVM, o que levou ao afastamento do diretor Sérgio Weguelin - e uso de informação privilegiada, e diz que isso deve ser investigado pela autarquia. Mas destaca que não dá para olhar apenas para a venda de ações para concluir isso. O fundamento econômico era muito forte, por isso a lógica é que haveria um volume grande de ações ON vendidas normalmente nos dias 17 e 18. "Não era preciso ter alugado as ações, outros podem ter vendido posições já compradas há tempos", diz ele, lembrando que ele mesmo vendeu as TMAR3 após dois anos, com ganho de 140%.

Stuhlberger diz que a carta anônima tem sinais claros de que seu autor tentou atingir a ele, a Amec - da qual é diretor - e a CVM. A carta faz referência às operações "short", de aluguel e venda de ações, e diz que "os vendedores participam de uma confraria recentemente formada para defender seus interesses, e tem gente muito importante no mercado envolvido". Sobre quem ele suspeita ser o autor, o gestor responde com outra pergunta: "Quem seria beneficiado ao prejudicar a ele e a essas entidades nesse processo?" Ele lembra que a decisão da CVM sobre a Telemar foi uma das mais importantes da história do mercado brasileiro ao evitar que os donos de ações PN ficassem à mercê dos controladores das empresas.