Título: A Linha 4 do Metrô de São Paulo e as PPPs
Autor: Vidigal, Cecilia e Iazzetta, Rodnei
Fonte: Valor Econômico, 04/09/2006, Legislação & Tributos, p. E2

Com a conclusão do processo licitatório da Linha 4 do Metrô paulista, o governo do Estado de São Paulo inicia a implementação de sua carteira de projetos por meio das Parceiras Público-Privadas (PPPs). Todavia, ainda falta uma definição da ação judicial proposta pelo Sindicato dos Metroviários de São Paulo. Na prática, o consórcio vencedor deverá aguardar o pronunciamento judicial para celebrar o correspondente contrato de concessão com o governo paulista.

Nesse contexto, tem-se questionado o impacto de eventuais greves e medidas judiciais, como a dos metroviários de São Paulo, na atratividade dos projetos de PPP. Sem adentrar no mérito da greve ou mesmo dos eventuais fundamentos que ensejaram a ação proposta pelo Sindicato visando suspender a licitação da Linha 4, o que se revela é uma enorme confusão acerca do conceito das PPP.

As PPP surgiram para viabilizar projetos de infra-estrutura diante do esgotamento da capacidade do governo brasileiro de investir. Os projetos iniciais no âmbito federal e estadual envolvendo a construção e manutenção de rodovias, ferrovias e portos, bem como logística e saneamento, visam diminuir os gargalos que travam o desenvolvimento do país.

As PPPs são uma forma de transferir a exploração da prestação do serviço para o setor privado nas situações em que a remuneração por meio da tarifa e receitas alternativas, complementares, acessórias ou decorrentes de projetos associados não é suficiente para possibilitar taxa de retorno do investimento atrativa para a iniciativa privada. Nessas situações, ao optar pela PPP, o poder público assume parte da remuneração devida ao concessionário mediante o pagamento de uma contraprestação nas modalidades previstas na legislação aplicável.

-------------------------------------------------------------------------------- O atual arcabouço jurídico traz importantes avanços para a consolidação das PPP, com regras claras acerca do objeto da PPP --------------------------------------------------------------------------------

Embora a privatização e as PPP sejam formas de atrair o investimento privado no setor de infra-estrutura, são modalidades de participação privada totalmente distintas. Na privatização, o particular adquire o ativo público e recupera o seu investimento por meio de tarifas pagas pelos usuários, a exemplo das concessões de rodovias. PPP não é privatização, pois o particular não adquire os ativos, mas apenas explora o serviço concedido, por meio de uma sociedade de propósito específico, da qual o Estado participa, ainda que minoritariamente. O poder público participa do projeto, podendo custear parcialmente a concessão, por meio do pagamento ao particular de contraprestações e outorga de garantias a terceiros, em favor do parceiro privado ou em cumprimento de suas próprias obrigações. O poder público, assim, é o responsável pela complementação da tarifa ou da totalidade da remuneração a ser obtida pelo particular.

Em um projeto de PPP, o parceiro privado participa da administração do serviço concedido e se remunera por meio da tarifa, além da contraprestação devida pelo parceiro público. Trata-se da delegação da prestação de serviços públicos ao particular, visando aproveitar a eficiência do setor privado, suprir as demandas de investimento nas áreas de infra-estrutura e viabilizar o investimento privado no projeto. Note-se que as PPP são implementadas através de contratos de concessão em que a titularidade do serviço público concedido permanece do poder público, que continua a atuar com todas as prerrogativas inerentes ao poder concedente.

Vale salientar que o atual arcabouço jurídico traz importantes avanços para a consolidação das PPP, com a definição de regras claras acerca do objeto da PPP, as disposições do contrato de concessão oriundo da PPP, as modalidades da contraprestação devida pelo parceiro público ao privado, a sistemática de garantias, o detalhamento do processo licitatório, as formas de controle do projeto, e, recentemente, as normas de contabilização dos investimentos do parceiro público no projeto de PPP editadas pela Secretaria do Tesouro Nacional.

Mas não apenas a infra-estrutura nacional ganhará com as PPP. Os usuários também serão beneficiados. A experiência internacional tem revelado efetivos ganhos de eficiência, por meio de uma gestão do parceiro privado da prestação do serviço concedido. Nesse sentido, o ganho de eficiência obtido através das PPP em muito se deve à racionalização e otimização da mão-de-obra especializada a ser contratada pelo parceiro privado para operar os serviços que lhe foram concedidos. Grande parte dos profissionais com expertise, hoje ocupantes de empregos públicos na administração pública, certamente serão absorvidos pelo parceiro privado. As contratações de mão-de-obra feitas pela concessionária serão regidas pelo direito privado e pela legislação trabalhista, podendo propiciar ganhos efetivos aos profissionais que atuam na área, mesmo aos que hoje desempenham suas funções na administração pública.

O movimento de algumas categorias em oposição à implementação das PPP se deve em muito ao receio de perder suas prerrogativas. Tais discussões fazem parte da consolidação do entendimento da sociedade e do Poder Judiciário acerca das PPP e não serão impeditivos dos investimentos em infra-estrutura pela iniciativa privada em parceria com o Estado.

Cecília Vidigal e Rodnei Iazzetta são advogados e sócios do escritório Koury Lopes Advogados