Título: TCU suspende leilão de banda larga sem fio
Autor: Rittner, Daniel e Basile,Juliano
Fonte: Valor Econômico, 05/09/2006, Empresas, p. B3

De forma inesperada, o Tribunal de Contas da União (TCU) suspendeu temporariamente o leilão em que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) pretendia vender o direito de uso de faixas de freqüência para o serviço de acesso à internet por banda larga sem fio. Uma medida cautelar expedida pelo ministro Ubiratan Aguiar determinou, à agência reguladora, a paralisação do processo de licitação por causa de "inconsistências" nos estudos de viabilidade econômica que deram origem ao edital.

A interrupção ocorreu pouco depois da entrega, ontem pela manhã, dos envelopes com propostas e documentos de habilitação para prestar serviços nas freqüências de 3,5 GHz e 10,5 GHz, que incluem a tecnologia WiMax. Cem empresas apresentaram ofertas. Protegidas por liminares, praticamente todas as operadoras de telefonia fixa e móvel participaram do leilão.

Os próprios técnicos da Anatel reagiram com surpresa à notificação do TCU. Na medida cautelar, Aguiar ressalta que os estudos estão "desatualizados" porque usam, em seus cálculos, a cotação do euro em novembro de 2004 - R$ 3,54. Segundo o ministro, a conversão cambial errada jogou para baixo os preços mínimos do leilão. Ele argumenta que, se fosse adotada a taxa de câmbio atual do euro, seria verificado um aumento superior a R$ 23 milhões no preço mínimo total da licitação - um acréscimo de 76% sobre o valor previsto no edital.

Além do equívoco na conversão para a moeda brasileira, o ministro do TCU afirma ter "detectado inconsistências" nos estudos. De acordo com Aguiar, elas levaram à determinação de preço mínimo de R$ 655,71 para blocos de 7 MHz na faixa de 3,5 GHz nas áreas que englobam os municípios de Santos e Ribeirão Preto. "Os preços mínimos de outras áreas com cidades de porte semelhante a estas foi superior a R$ 200 mil", afirma nota do TCU.

O conselho diretor da Anatel terá 15 dias para apresentar explicações ao tribunal. Se fizer os ajustes no edital, a licitação poderá prosseguir. Por enquanto, os técnicos da agência ficam impedidos de analisar a documentação das empresas interessadas nas concessões. A medida cautelar irá hoje ao plenário do TCU, mas é raro ver os ministros contrariando decisões desse tipo tomadas por um de seus colegas.

O ministro das Comunicações, Hélio Costa, negou qualquer tipo de interferência política no processo. Ele vinha defendendo o adiamento do leilão, mas teve seu pedido recusado pela diretoria da Anatel. Costa não escondeu, porém, sua satisfação. "Eu acho que foi a melhor decisão, até porque nós vamos ter tempo realmente de corrigir vícios de origem do edital e torná-lo melhor, mais eficiente", afirmou.

Enquanto o processo estiver suspenso, o ministério vai se apressar para publicar uma política de inclusão digital. Argumentando que o leilão ia contra as intenções do governo, Costa cogitou intervir na agência por meio de uma portaria. O ministro adiantou que a proposta deverá trazer uma política definida para uso da tecnologia WiMax, com a possibilidade de criação de obrigações para as empresas vencedoras, como reserva de freqüências para programas de inclusão digital, ou prazos encurtados para a instalação do serviço.

Fontes do TCU também descartaram reiteradamente qualquer influência do governo na decisão. "O tribunal atua dessa forma, em cima da hora do leilão, ainda mais quando se trata de cautelar. Todas semanas são suspensas licitações, é algo normal", disse um assessor do tribunal. "Foi uma discussão eminentemente técnica. Se a Anatel corrigir o preço mínimo amanhã, pode fazer o leilão ainda nesta semana."

A posição do TCU bate de frente com as declarações feitas na semana passada por um dos conselheiros da agência, Pedro Jaime Ziller, para quem o edital está "perfeito". Em nota, o tribunal informou que não visa fazer qualquer mudança nas cláusulas do edital, mas apenas corrigir "distorções e desatualizações identificadas na determinação dos preços mínimos, que poderiam trazer prejuízos aos cofres públicos e à própria lisura da licitação".

Uma das polêmicas do edital está na participação das operadoras de telefonia fixa. As regras da Anatel impediam que elas entrassem na disputa em suas áreas de concessão, com o objetivo de estimular a concorrência, mas as teles obtiveram na Justiça o direito de apresentar suas propostas.

Praticamente todas as operadoras entregaram ofertas - inclusive empresas-espelho (como a GVT) e celulares. As empresas vão disputar 20 licenças para operar nas regiões correspondentes às das concessionárias de telefonia fixa e 1.036 blocos divididos nas 67 áreas de numeração (áreas de cada DDD). As concessões para uso de freqüências nas faixas de 3,5 GHz e 10,5 GHz vão durar 15 anos, renováveis por outros 15 anos. A tecnologia WiMax permite conexão sem fio a uma distância de até 50 quilômetros da antena de retransmissão. O Wi-Fi, usado atualmente, também propicia o acesso à internet sem fio, mas em uma área bem mais restrita que o WiMax. (Com Folha News)