Título: Crise e ausência de dinheiro novo limitam efeito do pacote
Autor: Safatle, Claudia; Izaguirre, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 23/05/2012, Brasil, p. A3

O pacote de medidas anunciado pelo governo na segunda-feira deve ter efeito modesto sobre o nível de atividade. O incentivo fiscal do IPI para a redução dos preços dos automóveis terá duração de apenas três meses porque avalia-se que esse é o prazo para que haja um desfecho mais claro da crise na Europa. "Nós próximos 90 dias saberemos se a Grécia saiu ou não do euro, se houve uma corrida aos bancos e o que aconteceu com a Espanha", disse uma graduada fonte oficial. Conforme o desenrolar desses acontecimentos é que o Palácio do Planalto decidirá sobre a dosagem da reação do governo à crise, sempre mirando o crescimento econômico.

A redução do IPI sobre veículos e a realocação de uma parte dos depósitos compulsórios para os bancos usarem como linhas de financiamento para a compra de automóveis foram medidas específicas, divulgadas pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, e pelo Banco Central "para dar uma resposta às demandas da Anfavea [Associação nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores]", disse a fonte. As montadoras querem se desfazer de um estoque de 360 mil veículos para os quais não há demanda.

Com menor tributação, os preços dos automóveis podem cair 10% e isso dará uma ajuda, ainda que temporária, no controle da inflação. Com essa redução de preços a expectativa da área econômica é de haja um ganho de 0,3 ponto percentual para a inflação medida pelo IPCA. Mas esse é um ganho que se reverterá assim que as alíquotas do IPI voltarem ao normal, a partir de setembro.

Já a realocação gradativa de R$ 18 bilhões em depósitos compulsórios não representará aumento da liquidez na economia e pode não se traduzir em expressiva ampliação do crédito para a compra de automóveis. O BC, em uma medida pouco usual porque dirigida a apenas um setor, tirou uma parte do uso do compulsório destinado à compra de carteiras de bancos de pequeno e médio porte para encorpar os financiamentos para aquisição de veículos, mantendo a liquidez global neutra.

A grande dúvida é se os bancos que relaxaram seus critérios de análise de risco para expandir o crédito a automóveis e amargaram elevação da inadimplência vão, justamente no momento em que estão limpando seus balanços, voltar a emprestar mais.

Parte das ações macroprudenciais adotadas pelo BC para conter a expansão do crédito em dezembro 2010, porém, permanecem em vigor inclusive para limitar os financiamentos de veículos. É o caso do aumento da exigência de capital mínimo requerido dos bancos para fazer frente ao risco de calote em algumas modalidades de crédito. O aumento de 50% atingiu as operações de crédito direto ao consumidor (CDC) com prazo superior a dois anos e as de consignado de pelo menos três anos.

O capital requerido, antes de 11% do valor da operação, subiu para 16,5% para financiamentos de veículos com prazo superior a cinco anos. Nos financiamentos com prazo entre dois e cinco anos também houve elevação, dependendo do valor da entrada paga pelo comprador do automóvel.

Em novembro de 2011, quando a expansão do crédito já tinha perdido ritmo, algumas restrições foram afrouxadas, mas só para operações com prazo de até cinco anos. O capital mínimo exigido continuou em 16,5% para financiamentos mais longos de veículos e dobrou, chegando a 33%, no caso de operações de CDC e de consignado superiores a cinco anos.

Além da maior exigência de capital para o crédito ao consumo de prazo mais longo, o BC manteve as alíquotas mais elevadas de compulsório que passaram a vigorar em dezembro de 2010, quando o compulsório sobre depósitos a prazo subiu de 15% para 20% e o a adicional sobre depósitos à vista e a prazo passou de 8% para 12%.