Título: Construção abre portas para empresas brasileiras
Autor: Murakawa, Fabio
Fonte: Valor Econômico, 23/05/2012, Especial, p. A14

O "Gran Misión Vivienda" não tem despertado o interesse das grandes empreiteiras brasileiras, mas empresas menores estão usando o principal programa social de Hugo Chávez como porta de entrada para fazer negócios na Venezuela.

É o caso da HH Industrialized Engenharia e Projetos, que deve assinar nas próximas semanas um convênio para a construção de 5.000 moradias no sistema Steel Frame - uma espécie de casa pré-moldada com estruturas em aço. Segundo Johnny Reis, que representa a empresa no país, o contrato deve girar em torno de US$ 250 milhões, entre fornecimento e mão-de-obra. "O programa já está aprovado há 90 dias, estamos esperando ser chamados para assinar o contrato a qualquer momento."

Nesse caso, as casas serão importadas do Brasil para serem montadas no país. Mas Reis afirma que a empresa negocia a instalação de uma fábrica dessas estruturas na Venezuela. "Ainda não sabemos como será o modelo de negócio. Se vamos transferir tecnologia ou entrar como parceiros", diz.

Segundo Reis, além disso, caso o programa atinja suas metas, a Venezuela necessitará importar muito material de construção. "A indústria aqui é diversificada, mas não conseguirá atender à demanda, se o país realmente quiser zerar o déficit habitacional", diz. Para ele, isso pode abrir espaço para exportações brasileiras de fechaduras, esquadrias, máquinas para a produção de tijolos, entre outros.

Outra empresa que está usando o programa para crescer no país e a construtora Consilux. A empresa já havia construído cerca de 5.000 moradias "pré-Gran Misión", que renderam à construtora US$ 200 milhões contratuais, "mais alguns incrementos". Agora, a empreiteira está prestes a assinar um novo contrato, já dentro do programa, para erguer outras 5.000 casas, que deve girar entre US$ 200 e US$ 260 milhões.

Segundo Espartano da Fonseca, representante da Consilux em Caracas, os contratos com o governo venezuelano representam hoje cerca de metade do faturamento da empresa - que no Brasil, entre outras coisas, opera radares e lombadas eletrônicas. Para ele, no entanto, fazer negócios na Venezuela não é uma tarefa das mais fáceis. "Espaço [para empresas brasileiras] tem, demanda tem, recurso tem", diz ele. "Mas aqui precisa de um ano, dois anos, para fechar negócio. É muito mais complicado e burocrático do que no Brasil."

Outro problema que ele aponta é que "às vezes não tem fluxo de caixa". No ano passado, funcionários de uma das obras da Consilux no país chegaram a fazer uma greve de fome em frente à Embaixada do Brasil em Caracas por falta de pagamento. A empresa reponsabilizou à época o governo venezuelano, que não fez os devidos repasses. "Aqui já ficamos dois, três, seis meses sem receber pagamento", diz Fonseca. "Apesar disso, as coisas parecem ter melhorado muito depois do "Gran Misión Vivienda". Antes, mudava o ministro, nós ficávamos os pagamentos atrasavam. Agora, eles [o governo] estão mais organizados."

Uma fonte brasileira, familiarizada com a Venezuela, diz que "quase sempre há problemas de caixa, mas o governo venezuelano não dá calote". "Historicamente, o último calote do governo venezuelano foi em 1903", afirma. Para Fonseca, da Consilux, o risco político de fazer negócio no país não é grande. "O cenário político só pode intervir se houver mudança do presidente. Caso contrário, não."

Segundo diferentes fontes, o principal programa social do governo de Hugo Chávez não despertou o interesse das grandes empreiteiras com negócios bilionários no país, caso da Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez. "Os contratos [do "Gran Misión Vivienda"] não são bilionários, mas dá para ganhar dinheiro", diz Álvaro Hall, chefe da Caixa Econômica Federal na Venezuela. (FM)