Título: Expansão da Eletrobras é questionada no mercado
Autor: Polito , Rodrigo
Fonte: Valor Econômico, 17/05/2012, Empresas, p. B6

José da Costa Carvalho Neto, presidente da Eletrobras: holding deve assumir a gestão da CEA até o fim do ano, em uma operação semelhante à da Celg

Os avanços da Eletrobras no setor elétrico levantam dúvidas no mercado com relação aos desempenhos operacional e financeiro da estatal. Segundo analistas ouvidos pelo Valor, a aquisição de 51% da Celg, que possui dívidas de R$ 6 bilhões, e a negociação para assumir a Companhia Elétrica do Amapá (CEA), endividada em R$ 1 bilhão, além de taxas de retorno questionáveis em projetos de geração e transmissão, faz parte da estratégia do governo federal de garantir o abastecimento de energia a preços mais baixos.

Ontem, o valor de mercado da Eletrobras era de R$ 23,097 bilhões, atrás de empresas como Cemig (R$ 27,290 bilhões) e CPFL Energia (R$ 24,884 bilhões), e pouco acima do valor da Tractebel, de R$ 22,650 bilhões.

De acordo com o Plano de Negócios da Eletrobras 2010-2020, o índice de retorno sobre o capital empregado da companhia entre 2005 e 2008 foi de apenas 5%, contra 20% da Cemig e 17% da CPFL Energia.

Em 2008, a estatal lançou um plano para melhorar sua governança corporativa e o seu valor de mercado. Desde então, porém, a relação entre o valor de mercado sobre o patrimônio líquido, considerando as ações ordinárias, caiu de 0,33 para 0,28. Isso quer dizer que, no mercado, a Eletrobras vale menos de 30% do que aquilo que está nos livros contábeis.

A estatal adiou, de 15 para 31 de maio, a divulgação de seus resultados do primeiro trimestre de 2012. A medida tem se tornado comum. No ano passado, a empresa publicou os resultados de 2010 sem os números de Furnas. E, neste ano, o balanço de 2011 foi divulgado sem as informações da Eletrobras Distribuição Acre (Ex-Eletroacre).

Embora a distribuição de energia não faça parte do "DNA" da Eletrobras, a participação da companhia no setor vai subir de 8% para 10% com a aquisição do controle da Celg. Além disso, segundo o presidente da Eletrobras, José da Costa Carvalho Neto, a empresa deve assumir a gestão da CEA até o fim do ano, em uma operação semelhante. Existe ainda a possibilidade de federalização da Companhia Energética de Roraima (CERR), que atravessa pelos mesmos problemas.

Segundo Ricardo Corrêa, analista da Ativa Corretora, os indicadores operacionais das distribuidoras da Eletrobras estão piorando. "Isso quer dizer que a empresa gasta muito para realizar um serviço pior. Ela não consegue fornecer energia com qualidade", afirmou.

Das cinco distribuidoras da Eletrobras que apresentaram o balanço de 2011, quatro delas tiveram piora nos indicadores de continuidade do fornecimento de energia. Os índices de duração equivalente de interrupção por unidade consumidora (DEC) das distribuidoras de Alagoas, Rondônia e Amazonas pioraram 24,8%, 21,2% e 15,4% respectivamente, entre 2010 e 2011. Apenas a distribuidora de Roraima melhorou a qualidade do serviço em 25%.

Corrêa lembrou que a Cemar, distribuidora do Maranhão que em 2002 sofreu intervenção da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e passou a ser controlada por um grupo privado, a Equatorial Energia, em 2004, reverteu prejuízos e melhorou seu desempenho operacional. De 2004 a 2011, o índice de perdas da empresa caiu de 31% para 15,3%. No mesmo período, o DEC melhorou mais de três vezes.

O presidente da Eletrobras, no entanto, garante que as distribuidoras se tornarão rentáveis em 2014. Um sinal positivo foi a melhora no desempenho financeiro da Amazonas Energia, maior distribuidora do grupo, que reduziu o prejuízo de R$ 1,3 bilhão, em 2010, para R$ 625 milhões, em 2011. Com isso, o prejuízo consolidado das distribuidoras do grupo caiu de R$ 1,596 bilhão para R$ 931 milhões, no período.

"Infelizmente, quando você olha para as subsidiárias da Eletrobras, os resultados desse equilibrio-econômico financeiro está longe de ser alcançado [...] Hoje existe um empenho forte de tentar bloquear o uso politico, mas ainda há um longo caminho a ser perseguido", avaliou o presidente do Instituto Acende Brasil, Claudio Sales.

Segundo o presidente da consultoria Andrade & Canellas, João Carlos Mello, as aquisições, pela Eletrobras, de distribuidoras pouco rentáveis e que ainda não possuem mercado robusto têm um lado positivo, considerando o papel social do governo de buscar o desenvolvimento dessas regiões. Ele, contudo, alertou para a necessidade de uma gestão de alta eficiência. "As margens dessas distribuidoras são muito pequenas."

Para Corrêa, os problemas da Eletrobras também se estendem aos setores de geração e transmissão. Segundo outro especialista ouvido pelo Valor, a companhia aceita taxas de retorno até quatro pontos percentuais menores do que às praticadas por concorrentes privados.

O ebitda das empresas de geração e transmissão do grupo Eletrobras - Furnas, Chesf, Eletronorte, Eletronuclear, Eletrosul e CGTEE - caiu de R$ 6,130 bilhões em 2010 para R$ 5,896 bilhões, em 2011. A margem ebitda de Furnas e Chesf, as duas maiores geradoras da holding, com exceção da Itaipu Binacional, caíram de 22,5% para 16,5%, e 51,5% para 40,5%, respectivamente.

"Essa volta do estado como grande investidor do setor de energia elétrica foi uma estratégia tomada desde o governo Lula e que segue até hoje", contou o diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), Adriano Pires. Ele lembrou que o governo Lula retirou as subsidiárias da Eletrobras do Plano Nacional de Desestatização (PND), em 2004.

O secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, discorda da visão de que o estado vai exercer uma presença mais forte no setor. "O Brasil atrai mais investimentos em energia elétrica do que qualquer país da Europa e da América do Norte", ressaltou.