Título: Abertura do Copom divide ex-BCs
Autor: Dias, Camila; Silva, Rosa
Fonte: Valor Econômico, 18/05/2012, Finanças, p. C1

A decisão de tornar públicos os votos dos integrantes do Comitê de Política Monetária (Copom), anunciada na quarta-feira pelo Banco Central, dividiu a opinião de ex-diretores e ex-presidentes do BC.

Alguns consideram a medida positiva para melhorar a comunicação com o mercado, uma vez que cada diretor passará a ter que justificar as suas decisões. Mas há ex-dirigentes que consideram que, antes disso, seria fundamental a garantia de autonomia do BC e o estabelecimento de mandatos fixos para seus dirigentes.

Dada a falta de autonomia formal da autoridade monetária no Brasil, Alexandre Schwartsman, ex-diretor de assuntos internacionais do BC, é contra a medida por considerar que abre margem para maior interferência política. "A abertura dos votos em qualquer governo é ruim porque aumenta a capacidade de pressão sobre os membros do comitê."

Um ex-dirigente do BC que preferiu não ser identificado, lembra que há vários exemplos de bancos centrais independentes formalmente que não abrem os votos dos participantes, como o Banco Central Europeu. Mas não há caso em que não se tenha independência e os votos sejam abertos. "Isso cria um constrangimento a quem vai votar."

A nova regra, adotada em linha com a Lei de Acesso à Informação, que busca trazer mais transparência para o poder público, adia a discussão sobre a independência do BC na visão desse ex-integrante da equipe monetária. "Não vejo disposição do Executivo ou do Legislativo de tocar nesse assunto."

Para Armínio Fraga, presidente do BC entre 1999 e 2003, apesar de a diretoria do BC não ter um mandato formal, de certa forma, já possui autonomia. "É algo que passa pelo Senado, é um mandato informal. O governo não vai demitir alguém do BC com objetivos políticos não declarados", afirmou. De fato, há muitos anos não acontecem demissões com essa motivação. Fraga é favorável à abertura dos votos, uma vez que ela pode trazer maior respaldo para os diretores. "Com a nova medida, num momento em que haja pressão por parte do governo para não aumentar o juro, por exemplo, um diretor pode se sentir defendido sabendo que seu voto vai aparecer".

O argumento contrário à divulgação dos votos é o de que o dirigente ficava mais à vontade, especialmente em decisões consideradas antipáticas. Por outro lado, a ideia de prestar contas é muito boa, acredita o ex-presidente do BC.

Armínio lembra que havia muita discussão na diretoria sobre a abertura ou não dos votos quando as decisões do Copom passaram a ter por objetivo o cumprimento das metas de inflação, em 1999. "Lá atrás, quando discutimos isso, optamos no início do sistema por não divulgar o nome e apenas fazer um trabalho caprichado de divulgar as razões da decisão e dos dissidentes, se fosse o caso, na ata. À época, essa não foi uma decisão fácil, havia uma divisão".

A abertura dos votos dos diretores, na avaliação do ex-diretor de política monetária do BC e atual economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas, deve contribuir para melhorar a comunicação com o mercado em relação ao direcionamento da taxa básica de juros. "As discussões sobre a política monetária devem se tornar mais técnicas, uma vez que os diretores terão que explicar suas decisões."

O mercado passará acompanhar de perto a linha de pensamento de cada integrante do Copom. "Acredito que cada diretor se sentirá mais responsável pelo seu voto pessoal", diz Luis Fernando Figueiredo, ex-diretor de política monetária do BC e sócio da gestora Mauá Sekular.

Para Paulo Vieira da Cunha, ex-diretor de assuntos internacionais do BC, a abertura dos votos dos integrantes do Copom deveria ser acompanhada da divulgação da minuta da reunião sobre a decisão sobre a taxa básica de juros. "É importante que se divulgue essa discussão para mostrar em que contexto essas decisões foram tomadas."

Embora a abertura dos votos traga maior transparência para o processo, Cunha acredita que, no atual cenário, em que o mercado tem questionado a independência do BC, esse benefício pode ser anulado.

A estratégia de política monetária adotada pelo atual BC, de aliar medidas macroprudenciais às decisões sobre juros, tem se mostrado mais dependente de decisões que são de responsabilidade do Ministério da Fazenda, como a adoção de medidas fiscais, o que tem colocado sob questionamento a autonomia da autoridade monetária. "Hoje as decisões são mais compartilhadas", destaca Freitas.

De fato há maior comunicação entre o atual Banco Central, presidido por Alexandre Tombini, e o Ministério da Fazenda que no governo passado. Schwartsman vê uma intervenção maior na política monetária. "Esse diálogo tem sido uniliteral, basta ver o que o BC fala sobre o crédito subsidiado e o que o governo tem feito."