Título: Oferta de energia e baixo investimento limitam alta do PIB
Autor: Romero, Crristiano
Fonte: Valor Econômico, 11/09/2006, Brasil, p. A5

A economia brasileira não tem como crescer acima de 4% nos próximos quatro anos em decorrência de duas restrições: a baixa taxa de investimento, hoje em torno de 20% do Produto Interno Bruto (PIB), e o risco de desabastecimento de energia. Para expandir acima desse patamar, o país teria que passar por uma nova onda de reformas econômicas, segundo advertem, na nota técnica intitulada "Uma Agenda Macroeconômica para 2007", os economistas Paulo Levy e Fábio Giambiagi.

O estudo consta do último Boletim de Conjuntura do Ipea. Veio à tona no momento em que pesquisa Ipespe/Valor mostrou que a maioria dos brasileiros rejeita, por exemplo, novas mudanças nas regras das aposentadorias e desaprova o fim da gratuidade do ensino nas universidades federais.

Na avaliação de Levy e Giambiagi, o Brasil tem condições hoje de crescer em torno de 4% ao ano, um pouco acima, portanto, dos 3,5% de expansão média verificada entre 2003 e 2006. Essa taxa é inferior, mas próxima da média alcançada nos últimos dez anos por outros países em desenvolvimento, como Coréia do Sul (4,4%) e Chile (4,2%). O problema é que essas economias apresentam taxas de investimento (formação bruta de capital fixo) bem superiores à brasileira - respectivamente, 32% e 23,3% do PIB.

A tarefa do próximo governo (2007-2010) será criar as condições para que o Brasil passe a crescer, na década seguinte, a taxas entre 4,5% e 5%, levando o PIB a reviver a expansão anual média ocorrida entre 1950 e 1980. Segundo os dois economistas do Ipea, destravar a taxa de investimento será o grande desafio da próxima administração. "No cerne desse desafio, está o enfrentamento das questões fiscais ainda pendentes, que são um componente obrigatório da agenda macroeconômica dos próximos anos", diz o estudo.

Na opinião de Giambiagi e Levy, que é o diretor de Estudos Macroeconômicos do Ipea, para que ocorra uma mudança de patamar na taxa de crescimento, o governo terá que perseguir, entre 2007 e 2010, quatro pilares: a forte redução da relação dívida pública/PIB, hoje em torno de 50%; a diminuição consistente, mas gradual, dos juros (a taxa Selic está em 14,25% ao ano); a retomada do investimento público, atualmente num dos menores níveis da história (0,5% do PIB); e a redução da carga tributária, que, em 2005, chegou a 37,37% do PIB, a mais alta do mundo em desenvolvimento.

O foco das atenções dos dois pesquisadores do Ipea são os gastos correntes, que explodiram desde o início do processo de estabilização da economia, em 1994. "A queda da relação entre as despesas correntes e o PIB será o elo que permitirá a ocorrência em simultâneo desse conjunto de fenômenos", sustentam Levy e Giambiagi. Eles acreditam que isso pode ser perfeitamente consistente com o incremento do gasto em termos absolutos, a uma velocidade que, porém, seja inferior ao ritmo de crescimento da economia - exatamente o oposto do que ocorreu nos últimos 15 anos.

Para reduzir os gastos correntes, os dois economistas não têm dúvida: será preciso fazer novas mudanças na previdência social e promover uma reforma fiscal focada não só nas receitas, mas principalmente nas despesas públicas. "O aumento das despesas do INSS é o problema fiscal mais importante do país", afirmam Levy e Giambiagi.

Eles revelam que foram as despesas do INSS e não os gastos com juros reais da dívida os principais responsáveis pela deterioração das contas públicas depois de 1994. "A idéia de que não haveria condições políticas para implementar uma reforma profunda da previdência enquanto continuam sendo promovidas transferências crescentes de renda aos detentores de títulos públicos se baseia num equívoco", dizem eles no estudo.

A sugestão é que o novo governo, seja qual for, arregace as mangas imediatamente, anunciando um plano de longo prazo (dez anos). O plano teria cinco etapas. A primeira consistiria em anunciar, em 2007, medidas fiscais que reduzam os gastos públicos e viabilizem a continuidade da queda dos juros. A segunda seria anunciar meta de "déficit nominal zero", a ser atingida até 2010, último ano do mandato do próximo governo.

A terceira seria reduzir a relação dívida/PIB para 40% também nesse período. A quarta etapa consistiria em viabilizar a geração de superávits nominais - e não primários, como acontece hoje - entre 2011 e 2014, a exemplo do que está fazendo o Chile. A última etapa seria diminuir de forma substancial a dívida líquida do setor público também na próxima década.

Tudo isso permitiria, na avaliação de Levy e Giambiagi, a queda dos juros, o que, por sua vez, autorizaria, já a partir de 2010, a redução gradual do superávit primário, de modo que, dez anos depois de iniciado o ajuste, a meta pudesse ser diminuída para 1% do PIB. Dessa forma, o governo abriria espaço para cortar a carga tributária e ampliar o investimento público - os dois especialistas acreditam que, seguindo esse roteiro de austeridade fiscal, seria possível à União chegar a 2017 investindo o equivalente a 3% do PIB, com a taxa de investimento da economia atingindo 25% na segunda metade da próxima década.