Título: Estratégia do Bird muda e desembolsos sobem
Autor: Izaguirre, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 11/09/2006, Brasil, p. A6

Os desembolsos de empréstimos do Banco Mundial (Bird) ao Brasil atingiram, nos primeiros sete meses deste ano, volume superior ao dobro do verificado em 2005 inteiro. Foram US$ 1,739 bilhão, o que garante, pela primeira vez em quatro anos, fluxo financeiro líquido favorável ao país no ano calendário de 2006. Refletindo ajustes implementados pelo organismo multilateral em sua estratégia de assistência ao país a partir de 2004, o ritmo de contratação de novas operações de crédito também se acelerou, o que gera perspectivas de desembolsos líquidos também para os próximos anos.

Considerados juros e amortizações de empréstimos anteriores, o Brasil mais pagou do que recebeu recursos do Bird nos últimos três anos. Com o aumento de amortizações decorrente do auxílio prestado nos anos de crise até 2002, o fluxo líquido foi negativo em US$ 719 milhões em 2003 e em US$ 399 milhões em 2004. Em 2005, os vencimentos de dívida principal com o organismo caíram. Mas, por causa da queda nos desembolsos, que foram de apenas US$ 781 milhões, o fluxo líquido continuou negativo, em US$ 602 milhões.

Em 2006, até julho, a situação foi inversa. Em sete meses, houve desembolso líquido de R$ 1,15 bilhão, quantia suficiente para cobrir os US$ 591 milhões de vencimentos previstos de agosto a dezembro perante o organismo. Até dezembro, o Banco Mundial prevê liberar mais US$ 1 bilhão referente a contratações já realizadas, informa Paulo de Sá, chefe da equipe de implementação de projetos do organismo no Brasil. Mesmo que isso não ocorra, entretanto, o fluxo líquido de desembolsos fechará o ano positivo, o que não acontece desde o ano de 2002.

As contratações de crédito novo não chegaram a atingir os patamares de 1999, 2001 e 2002, anos em que os empréstimos de ajuste estrutural concedidos pelo Bird ajudaram o Brasil a atravessar o encarecimento e a escassez de oferta de crédito ao país no mercado internacional. Mas subiram muito em relação a 2005 e 2004, atingindo US$ 1,503 bilhão nos primeiros sete meses de 2006. No ano passado inteiro, o valor contratado foi de apenas US$ 852 milhões, segundo o Ministério do Planejamento.

Paulo de Sá explica que esse incremento no volume de novos negócios reflete, em grande medida, as mudanças na estratégia de assistência ao país a partir de 2004. Uma delas foi a maior atenção às demandas dos Estados. Essa foi uma forma de compensar limitações do Orçamento federal, cuja execução tem sido contingenciada nos últimos anos.

"No início da década, a carteira de financiamentos do Bird no Brasil era composta basicamente por projetos federais. Hoje, os financiamentos aos Estados representam cerca de metade do número de projetos em andamento e um terço do saldo", diz Sá.

A utilização de novas modalidades de empréstimo para o governo federal também ajudou, pois deu aos processos de análise, aprovação, contratação e desembolso agilidade semelhante à das operações de ajuste estrutural utilizadas na época de crise para auxiliar no equilíbrio do balanço de pagamentos externos do país.

Assim como os de ajuste estrutural, os Empréstimos para Políticas e Desenvolvimento, conhecidos como DPL, iniciais em inglês, demandam menos tempo porque são de desembolso único e não estão vinculados à implementação física de projetos de investimento. Servem para financiar grandes programas do governo federal brasileiro, como o Bolsa-Família, ou apoiar reformas microeconômicas, como a da legislação do crédito habitacional, explica Sá.

A opção por Empréstimos de Abordagem Setorial Ampla, cuja sigla em inglês é SWAp, também dará maior velocidade às liberações de recursos do Banco Mundial. Embora se destine a financiar a execução de obras físicas, essa nova modalidade exige menos tempo porque permite incluir num único contrato - e, portanto, num mesmo processo de análise e aprovação - diferentes projetos em todo o país.

Já aprovado pela direção do Banco Mundial, o primeiro contrato desse tipo com o Brasil aguarda aprovação do Senado para ser assinado. São aproximadamente US$ 500 milhões, destinados a financiar investimentos em infra-estrutura de transportes, inclusive no âmbito do Projeto Piloto de Investimentos (PPI), cujas despesas não impactam resultado fiscal primário da União. Devido ao esvaziamento decorrente do processo eleitoral, os senadores dificilmente aprovarão o empréstimo a tempo de o Bird desembolsar os recursos ainda em 2006.

A expressiva elevação dos fluxos de 2005 para 2006 é explicada também por uma mudança nos procedimentos operacionais de liberação dos recursos referentes aos DPLs. Inicialmente, o governo primeiro pegava o dinheiro do Bird para depois aplicá-lo nos programas financiados. Por opção do próprio governo, no entanto, essa sistemática mudou e agora o Banco Mundial libera os recursos de acordo com as despesas já executadas.

Isso afetou negativamente os números de 2005, deprimindo a base de comparação, pois, num primeiro momento, o fluxo de desembolsos caiu, explica Sá.