Título: UE diverge e cúpula acaba sem medidas anticrise de impacto
Autor: Moreira , Assis
Fonte: Valor Econômico, 24/05/2012, Internacional, p. A13

A premiê alemã, Angela Merkel, bloqueou de novo avanço sobre a criação de eurobônus, a emissão comum de títulos de dívida, apesar de o chefe do governo italiano, Mario Monti, estimar que a maioria dos líderes europeus apoiou a iniciativa, na cúpula que terminou na madrugada de hoje em Bruxelas.

Sobre a Grécia, os líderes reafirmaram compromisso para proteger a estabilidade financeira na zona do euro, e manifestaram o desejo de ver uma novo governo de maioria na Grécia que continue a implementação dos programas de austeridade e reformas.

No entanto, funcionários europeus preparariam planos para conter as consequências de uma eventual saída de Atenas do euro. O primeiro-ministro de Luxemburgo, Jean-Claude Juncker, que preside o grupo de ministros de Finanças, insistiu que os governos trabalham com a hipótese de permanência grega, mas que devem estar preparados "para todo tipo de eventos".

A 14ª cúpula europeia para tratar da crise foi antecedida por uma queda generalizada nas bolsas de Ásia, Europa e EUA. O euro caiu a seu mais baixo nível em quase dois anos em relação ao dólar, o que pode ajudar a competitividade e as exportações do bloco.

Em entrevista à 1h30 de hoje, horário europeu, transmitida ao vivo pelos canais de TV de notícias, o presidente francês, François Hollande, disse que houve consenso sobre os bônus de projetos para financiar infraestrutura, sobre o aumento de capital do Banco Europeu de Investimentos (BEI), e sobre a flexibilização no uso de fundos estruturais para países em dificuldades como a Grécia - medidas de alcance limitado para atenuar a crise e estimular crescimento.

O confronto foi mesmo sobre a criação de eurobônus, que atenuaria os problemas de financiamento para os países em crise, mas aumentaria os custos de financiamento de países como a Alemanha, ao diluir sua melhor nota de crédito na zona do euro.

Hollande defendeu o mecanismo. "Não falei sozinho sobre isso, mas alguns países pensam diferente", disse. Mas Merkel foi incisiva na sua rejeição ao mecanismo. Holanda, Suécia e Finlândia também qualificaram os eurobônus de ideia prematura e contraproducente. Para nações com triplo A, eurobônus sob as regras atuais da UE significa exigir que a Alemanha e outros países solventes subscrevam as dívidas do sul da Europa, sem contrapartida dos vizinhos para controlarem seus gastos.

Segundo Hollande, para Merkel os eurobônus não são elemento para crescimento, e sim uma perspectiva distante de integração. Já para a França, é um ponto de partida para atenuar a crise da zona do euro. A Áustria faz parte de uma terceira categoria de países, que vê opção em alguma forma de eurobônus, com várias condicionalidades.

Merkel insistiu também em reformas estruturais como a do mercado de trabalho, lentas e mais difíceis de implementar num ambiente de recessão.

O presidente francês sofreu também oposição firme do Reino Unido na sua proposta de taxar as transações financeiras para obter dinheiro para um fundo de investimento. "É uma ideia ruim", disse o primeiro-ministro britânico, David Cameron.

No entanto, a ideia faz seu caminho. Antes da cúpula, os deputados europeus, que só têm papel consultivo em questão fiscal, aprovaram por ampla maioria as modalidades de uma taxa sobre as transações financeiras, aumentando a pressão sobre Reino Unido, Irlanda, Suécia, Malta e República Tcheca. A taxa pode render € 55 bilhões por ano, segundo a Comissão Europeia.

A França defendeu mais ação do Banco Central Europeu (BCE) e recapitalização do sistema bancário através do fundo de resgate europeu, algo que a Alemanha tampouco aceita. O chefe do governo espanhol, Mariano Rajoy, insistiu que o BCE precisa fazer mais para ajudar a baixar o custo dos financiamentos dos países da zona do euro - ou seja, que a autoridade monetária volte a comprar dívida soberana dos países em dificuldades.

Nenhuma decisão formal foi tomada pelos líderes. Tudo ficou para a cúpula do final de junho. Significa que o mercado pode ter mais turbulências até lá.