Título: Novos focos de aftosa na Bolívia geram mais apreensão
Autor: Zanatta, Mauro
Fonte: Valor Econômico, 31/01/2007, Agronegócios, p. B8

O governo da Bolívia informou ontem à Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) ter descoberto mais dois focos de febre aftosa no Departamento de Santa Cruz. Os novos casos foram registrados nas províncias de Andrés Ibáñez e de Cordillera, nos arredores da cidade de Santa Cruz de La Sierra "Existem três focos e todos foram informados à OIE", afirmou o diretor nacional de Saúde Animal da Bolívia, Ernesto Salas García, ao Valor.

Na sexta, as autoridades bolivianas já haviam confirmado um foco em Cuatro Cañadas, na província de Ñuflo de Chávez. Até agora, o vírus da aftosa infectou 29 bovinos e um suíno. A região tem 115 mil cabeças de gado, segundo Salas.

Por telefone, da capital La Paz, o diretor do serviço veterinário informou que a origem dos focos está numa fazenda de Andrés Ibáñez, na localidade de Montero Hoyos, de onde saíram 60 animais, sobretudo gado de leite, para vários leilões em Santa Cruz de La Sierra. Os bovinos foram levados a 22 recintos de remate de gado da cidade e foram adquiridos por vários pecuaristas. De lá, os animais seguiram para diferentes áreas, duas delas pertencentes a menonitas canadenses radicados no país - Valle Esperanza e Swift Current.

"Lá, em Montero Hoyos, havia 607 cabeças de gado. Alguns tinham lesões antigas, de 15 ou 20 dias, já curadas. Outros 17 apresentaram os sintomas clínicos. Por isso, não descartamos que venham a aparecer novos animais infectados na zona", disse Salas. O veterinário tentou acalmar os pecuaristas brasileiros. "Não vejo maiores riscos ao Brasil. Mas, claro, é preciso tomar cuidados na fronteira".

Após os novos focos, a avaliação, entre representantes do setor de pecuária no Brasil, é de que houve subnotificação de casos da doença na Bolívia nos últimos meses.

Os animais doentes estão mais perto da fronteira com Paraguai e Argentina do que da zona limítrofe com o Brasil. O foco mais próximo está em Cuatro Cañadas, 130 km ao leste de Santa Cruz de La Sierra e a 600 km da fronteira brasileira. Montero Hoyos (ao leste) e Swift Current (ao sul) estão a cerca de 50 km de Santa Cruz. Ernesto Salas disse que para disseminar-se até a fronteira com o Brasil, o vírus teria que superar a zona livre de aftosa com vacinação da Chiquitanía, uma vasta área boliviana que tem 600 mil cabeças.

O governo boliviano interditou as 22 áreas de leilão em Santa Cruz para evitar a disseminação da doença para outros animais. Ontem, a Argentina fechou sua fronteira para a carne boliviana.

Para o presidente do Conselho Nacional de Pecuária de Corte (CNPC), Sebastião Costa Guedes, o ressurgimento de focos de febre aftosa na Bolívia revela que "temos problemas persistentes" na região do Chaco, na fronteira Brasil-Paraguai e na Bolívia. Ele avalia que a OIE "está perdendo a paciência com a região", já que os casos de aftosa continuam a aparecer mesmo após anos e anos vacinando o rebanho.

Guedes, que participou ontem de almoço para lançamento do Congresso Internacional da Carne, em abril, defende que o Brasil crie zonas-tampão nas regiões de fronteira, ou haverá risco de o critério de regionalização, hoje aceito pela OIE, ser abandonado. "Na Europa, alguns países querem acabar [com a regionalização] porque a região não sai do lugar", disse. Acrescentou que o problema da aftosa é regional e que também "temos culpa". Guedes afirmou que os casos de aftosa no Brasil, em outubro de 2005, ocorreram porque pecuaristas "relaxaram" e deixaram de vacinar.

Antenor Nogueira, presidente do Fórum Nacional de Pecuária de Corte da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA), avalia que o problema, hoje, "é da Bolívia". Mas se os focos "pipocarem, como prevemos que acontecerá, será o caos", já que o país faz fronteira com Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Ele ponderou, contudo, que "desde que não entre nada aqui", o Brasil não será afetado.

Mas o foco na Bolívia pode dificultar as negociações para a venda de carne in natura para os Estados Unidos, admitiram Jim Butler, ex-subsecretário de Agricultura dos EUA e Phillip Bradshaw, membro do Grupo Interamericano para Erradicação da Febre Aftosa (Giefa). Ambos participarão do Congresso Internacional da Carne em abril.