Título: Gastos correntes do Orçamento de 2007 ultrapassam teto definido pelo governo
Autor: Izaguirre, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 28/12/2006, Brasil, p. A2

O orçamento federal para o próximo ano é uma prova de que o governo Lula não se empenhou, até agora, em conter o crescimento dos gastos correntes primários da União. O plano anunciado pela equipe do ex-ministro da Fazenda, Antonio Palocci, em abril de 2005, previa que esses gastos subiriam no máximo a 17% do Produto Interno Bruto (PIB). Principalmente em função de decisões tomadas pelo próprio Executivo desde então, na lei orçamentária de 2007, porém, as dotações para despesas correntes chegam R$ 428,562 bilhões, 18,98% do PIB estimado.

O cálculo é da economista Márcia Rodrigues Moura, consultora da Câmara dos Deputados. O percentual já desconsidera as transferências por repartição de receita a Estados e municípios, excluídas pela Fazenda quando propôs o teto de 17% do PIB no projeto da lei que estabeleceu as diretrizes para o orçamento de 2006, a LDO.

Márcia também desconsiderou a correção complementar retroativa paga a trabalhadores que tinham FGTS no início dos anos 90, excluída pelo Congresso ao alterar o projeto original da LDO 2006. Se for considerado esse item, os gastos correntes chegam a 19,05% do PIB no orçamento para 2007, que ainda aguarda sanção presidencial.

Para efeitos de aferição do cumprimento do limite, que acabou ficando superior ao originalmente proposto em abril de 2005, a LDO para 2007 manda desconsiderar outros itens, além desses dois. Mesmo nesse conceito mais restrito, que exclui, por exemplo, subsídios agrícolas, as dotações para despesas correntes em 2007 ultrapassam muito o teto inicialmente pretendido, chegando a 18,32% do PIB, pelos cálculos da consultora.

Em qualquer dos critérios, alerta Márcia, o crescimento nos últimos anos é preocupante. Excluídas apenas transferências de receita e complementação do FGTS, o nível previsto para 2007 representa um salto de 2,55 pontos percentuais em relação a 2003, ano em que o volume executado de gastos correntes alcançou 16,4% do respectivo PIB. E em 2006 ele deve chegar no mínimo a 18,5% do produto, prevê a economista, considerando créditos orçamentários adicionais pedidos até outubro.

O próprio governo inviabilizou a meta anunciada em abril de 2005 ao fazer opções políticas que elevariam despesas correntes obrigatórias de caráter continuado. A principal delas é a política de aumentos reais anuais para o salário mínimo. Sobretudo por esse impacto, os gastos da União com benefícios da Previdência Social pulam de 6,93% para 8,05% do PIB, entre 2003 e o previstos para 2007.

Já decidido, só o próximo reajuste do mínimo, de R$ 350,00 para R$ 380,00, implica para a União aumento líquido de despesas primárias de R$ 5,1 bilhões em relação a 2006. A maior parte já estava prevista no projeto original de orçamento do Executivo, que pressupunha elevação do mínimo para R$ 375,00 em abril de 2007.

A política salarial adotada para o funcionalismo público federal, que também vem ganhando aumentos acima da inflação, é outro ponto de contradição entre a prática e o discurso inicial do governo Lula em relação ao controle de despesas correntes. Influenciados pelos reajustes de salário, os gastos da União com pessoal, que foram de 4,93% do PIB em 2003, chegarão a 5,28% do PIB em 2007.

O governo aposta no crescimento da economia para obter uma queda das despesas correntes em relação ao PIB nos próximos anos, mesmo que elas cresçam nominalmente. Mas, além de demandar uma política de aumentos reais menos generosos para o mínimo e os servidores públicos, o plano esbarra na falta de regulamentação da Emenda Constitucional 29. Sem regulamentação, a emenda impede que os gastos federais com saúde, quase todos correntes, caiam como proporção do PIB.

Depois de ter-se dado conta que o limite anunciado em abril de 2005 era incompatível com suas promessas e decisões na área social, o governo Lula não só abriu mão da meta de 17% do PIB como ainda vem tendo dificuldades para cumprir o limite mais flexível fixado pela LDO para 2006. Dependendo do nível de receita considerado, o teto de gastos correntes para este ano será de 18,21% ou 18,33% do PIB, pelos cálculos de Márcia. Mas tudo indica que tais despesas chegarão no mínimo a 18,54% do PIB.

Para 2007, a LDO aprovada pelo Congresso manda reduzir os gastos correntes em 0,1% do PIB em relação ao nível que for registrado em 2006. Mas ao estabelecer que isso vale apenas para a fase de execução orçamentária, o Congresso se eximiu de fazer um orçamento compatível com tal redução. No projeto original do orçamento, a incompatibilidade entre o volume previsto de despesas correntes e essa regra da LDO era de R$ 5,6 bilhões. Se, por um lado, as dotações aumentaram com as alterações no projeto, de outro, a base de cálculo, que são as despesas de 2006, também cresceram desde então, o que facilita cumprir o limite em 2007.