Título: Baixa renovação deve favorecer governadores reeleitos
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Fonte: Valor Econômico, 12/09/2006, Especial, p. A14

As novas regras eleitorais deverão beneficiar os deputados estaduais que tentam a reeleição nas 27 Assembléias Legislativas em todo o país. Proibidos de distribuir camisetas, bonés e brindes e de espalhar outdoors para fazer campanha, os parlamentares acreditam que a taxa de renovação não será muito diferente dos anos anteriores, apesar da crise de credibilidade que atinge a vida parlamentar.

Sem profundas alterações nos quadros do Legislativo, pelo menos sete governadores que tendem a ser reeleitos ou elegerão sucessor continuarão a dominar suas Assembléias. No Paraná, brigas com grandes grupos econômicos, criticas ao pedágio nas rodovias e ataques à soja transgênica marcaram o governo de Roberto Requião (PMDB). Como ele tem o apoio da grande maioria dos deputados, a Assembléia seguiu no mesmo ritmo. "A agenda foi dada pelo Executivo e tivemos conflitos permanentes, nem tanto políticos, mas econômicos", diz o petista André Vargas.

Dos 54 deputados paranaenses, apenas nove são da oposição. A força de Requião na Assembléia ficou evidente no primeiro semestre deste ano, com a derrubada de um projeto anti-nepotismo pelo governador. Mesmo sob críticas, Requião manteve parentes em cargos de alto escalão, como na secretaria da Educação e no Porto de Paranaguá. Algumas proposições foram bem-vistas pela maioria, como o pagamento de R$ 100 para quem devolvesse armas de fogo e a isenção de impostos sobre itens da cesta básica e para microempresários.

Em outubro, 47 deputados tentarão a reeleição e cinco são candidatos a deputado federal. Historicamente a renovação da Assembléia paranaense é de cerca de 20%, mas em 2002 ela chegou a 44%. Nesta eleição, os deputados não esperam que passe de 30%. "Haverá muita reeleição", afirma André Vargas, que é presidente do PT no Paraná. "As novas regras eleitorais vão dificultar a eleição dos novos", diz o tucano Hermas Brandão, presidente da Casa, vice na chapa de Requião.

Em São Paulo, com ampla base aliada, o então governador Geraldo Alckmin (PSDB) - candidato à Presidência - conseguiu aprovar todos os principais projetos, como as Parceiras Público Privadas, a venda da CTEEP e a reestruturação da dívida da Cesp. Também aprovou a redução do ICMS em setores como o têxtil e o calçadista, o Simples (para reduzir a cobrança de impostos de micro e pequenas empresas), a regulamentação da cobrança do uso da água.

Mas o bloqueio da abertura de Comissões Parlamentares de Inquérito pela base governista foi um dos aspectos mais reveladores da força do Executivo sobre o Legislativo em São Paulo. Durante a gestão de Alckmin e de seu sucessor, Cláudio Lembo (PFL), nenhum dos 70 pedidos de investigação feito pelos deputados prosperou na Casa.

"Os deputados não cumpriram o papel de fiscalizadores. A principal tarefa de um deputado é a fiscalização e eles deixaram de cumprir isso. Essa legislatura foi muito fraca", analisou Rosangela Torrezan Giembinsky, coordenadora da ONG Movimento Voto Consciente, que acompanha os trabalhos na Assembléia.

O forte apoio do Legislativo também marcou o governo de Luiz Henrique (PMDB), em Santa Catarina. Caso consiga a reeleição, ele não terá grandes dificuldades para seu segundo mandato. A Assembléia é composta de forma majoritária por PMDB, PP, PFL, PSDB e PT. Dos 40 deputados, 34 fazem parte desse grupo, sendo 20 da bancada governista.

A base aliada no Legislativo catarinense poderá ser reforçada com o apoio de dois outros fortes partidos em Santa Catarina: PSDB e PFL. E daqueles que migrarão de forma oportunista, em especial os eleitos por partidos enfraquecidos pela cláusula de barreira. "Os partidos que dominam o Executivo serão atraentes para parte daqueles que foram afetados pela medida, especialmente os partidos de aluguel", acredita Angela Albino, candidata a deputada estadual pelo PCdoB.

Assim como em Santa Catarina, o PMDB também não deverá ter problemas com a governabilidade no Rio de Janeiro, caso Sérgio Cabral, candidato pelo partido, vença as eleições. Nos últimos oito mandatos, quando o Estado foi governado por Anthony Garotinho e sua mulher, Rosinha Matheus, as mudanças de partidos dos deputados seguiram, na sua maior parte, as trocas de legenda do casal.

Garotinho apóia Sérgio Cabral, candidato ao governo do Estado por seu partido e o PMDB tem hoje a maior bancada na Alerj, com 21 parlamentares. O PSC, aliado de Garotinho, tem a terceira maior bancada de deputados estaduais, com seis integrantes. Cabral, que também conta com o apoio do PP, PTB, PL, Prona, PMDB, PSC, PTC E PAN, exerceu três mandatos na Assembléia e foi presidente da Casa por oito anos.

Na Assembléia do Rio, pelo menos 51% dos 70 deputados estão no segundo mandato. Em 2002, a renovação foi de 54% das cadeiras. Neste ano, apenas nove dos 70 deputados da atual legislatura não vão concorrer à reeleição.

A expectativa de ampla base governista no Rio é a mesma na Bahia. Em disputa pela reeleição, o governador Paulo Souto (PFL) deve garantir o apoio dos deputados para aprovar seus projetos em um provável novo mandato.

Tanto a chapa encabeçada pelo PT quanto a comandada pelo PFL - os dois partidos com mais chance de vitória na disputa pelo governo baiano - assumiram o discurso de que, na pior das hipóteses, suas bancadas permanecerão com o mesmo número de deputados. A Assembléia Legislativa do Estado tem 63 vagas.

O PT ocupa hoje nove cadeiras na Casa. Com 45 candidatos, pretende eleger pelo menos mais dois, afirma a coordenação da campanha da legenda. Eraldo Tinoco, coordenador da campanha pefelista, diz ter "absoluta segurança" de que a base aliada do governador Paulo Souto, candidato à reeleição, não será menor que os 41 de hoje. PFL, PP e PL, que compõem a coligação, lançaram, somados, 55 candidatos, mas a base aliada é composta ainda por outras legendas.

O governador gaúcho Germano Rigotto (PMDB) contou com uma base de apoio formada por 38 dos 55 e aprovou 78% dos 502 projetos enviados. Com a Assembléia ao seu lado, Rigotto teve sucesso na votação de propostas polêmicas, como o aumento das alíquotas de ICMS da gasolina e do álcool combustível, da energia elétrica comercial e residencial e das telecomunicações de 25% para até 30% no fim de 2004. O Legislativo aprovou a Consulta Popular do Estado, que substituiu o Orçamento Participativo adotado pelo governo do PT, além de ampliações dos benefícios fiscais concedidos a empresas que investem no Rio Grande do Sul.

Em 2004 foram aprovadas, por unanimidade, mudanças administrativas no Instituto de Previdência do Estado e em julho o governo conseguiu o aval para uma emenda constitucional que elimina a necessidade de plebiscito para promover a desverticalização da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), como estabelece o novo modelo do setor elétrico nacional.

Além do PMDB, os partidos que dão sustentação a Rigotto no Legislativo gaúcho incluem o PP, o PDT, o PTB, o PFL e o PSDB. Apenas o PT, o PCdoB, o PSB e o PPS estão de fora, mas num eventual segundo mandato do governador, que lidera as pesquisas de intenção de voto, a reprodução da aliança tende a ficar um pouco mais "complicada", acredita a chefe do departamento de ciência política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Maria Izabel Noll.

Os demais partidos também poderão se descolar do governador em caso de reeleição para construir alternativas próprias para o pleito seguinte, diz Maria Izabel. O PSDB, que em 2002 já concorreu coligado com o PMDB, por exemplo, desta vez está na disputa com a candidatura da deputada federal Yeda Crusius, que aparece em terceiro lugar nas pesquisas, atrás de Rigotto e de Olívio Dutra (PT).

Mesmo assim, na opinião da professora, a situação de Rigotto reeleito tenderia a ser mais confortável do que a de Olívio, caso seja ele o eleito. Aí, segundo ela, é provável que os partidos que hoje apóiam o PMDB migrem para a oposição, como já ocorreu no governo do PT entre 1999 e 2002, deixando os petistas apenas com o apoio de siglas menores como o PCdoB, que tem a candidata a vice, a atual deputada estadual Jussara Cony, e o PSB. (Cristiane Agostine, de São Paulo; Marli Lima, de Curitiba; Vanessa Jurgenfeld, de Florianópolis; Janaina Vilella, do Rio; Patrick Cruz, de Salvador; e Sérgio Bueno, de Porto Alegre)