Título: Receita cobra mais R$ 39 milhões de Ratinho e provoca um debate tributário
Autor: Watanabe, Marta
Fonte: Valor Econômico, 13/09/2006, Brasil, p. A2

O apresentador Carlos Roberto Massa, o Ratinho, provavelmente nunca imaginou que seria protagonista de uma das mais novas discussões tributárias, suscitada pela lei derivada da chamada "MP do Bem". O apresentador foi autuado em R$ 39 milhões por suposta falta de recolhimento de Imposto de Renda. Trata-se da segunda autuação contra Ratinho. A anterior foi de R$ 26 milhões.

A lei 11.196, de 2005, trouxe um dispositivo que autoriza as empresas a contratar pessoas jurídicas para exercer atividades intelectuais e de caráter personalíssimo. A previsão acendeu a luz verde para um velho planejamento, pelo qual as empresas contratam serviços de pessoas físicas por meio de empresas. A vantagem para as empresas é a menor carga tributária.

Essa contratação era coibida pela fiscalização previdenciária e da Receita Federal, que exigiam os tributos como se a contratação fosse de pessoa física. A fiscalização fazia mais diferença nos setores em que dificilmente a contratação de pessoas jurídicas se torna um litígio trabalhista.

Em pareceres a empresas, alguns escritórios passaram a defender, porém, que o artigo que legaliza a situação para fins fiscais tinha caráter interpretativo, o que permitia a sua retroatividade. Ou seja, o dispositivo seria aplicável para períodos anteriores à lei.

Foi o que argumentou o advogado Diego Muñoz, que representa Ratinho na defesa do apresentador contra a autuação fiscao. A Quarta Turma do Primeiro Conselho de Contribuintes, porém, rejeitou a retroatividade e manteve a autuação, que cobra IR do apresentador de 2001 a 2004. A turma concluiu que a Lei do Bem trouxe uma nova norma e não uma interpretação. Segundo os conselheiros, a legislação anterior estipulava claramente que as regras eram contrárias. O conselho permitiu apenas que seja deduzido do valor da autuação o valor já pago de Imposto de Renda pela pessoa jurídica do apresentador.

A Receita Federal considerou que ao contratar a empresa Massa & Massa Ltda, a TV SBT Canal 4 tinha por objetivo contratar os serviços pessoais de Ratinho, já que os contratos previam que a apresentação do programa estipulado só poderia ser feita por Carlos Roberto Massa, chegando a prever como seriam realizados os programas durante as férias do apresentador. A receita alegou, portanto, que a contratação era da pessoa física e não da empresa. Por isso o fisco exigiu os tributos pagos na pessoa física de Ratinho.

Muñoz, advogado do apresentador, diz que ainda não foi intimado da decisão do Conselho. Mas assim que isso acontecer, deverá apresentar um recurso.

Muñoz sustenta que o novo artigo da lei que se originou da "MP do Bem" tem caráter interpretativo e que isso está expresso na própria exposição de motivos de conversão da MP em lei. "O caráter interpretativo não entrou no texto da lei, mas isso não quer dizer que esse caráter não existe."

O advogado aponta ainda um outro argumento. Segundo ele, dispositivos do Código Tributário Nacional dizem que quando uma nova lei diz que uma conduta antes considerada irregular não é mais regular, não deve haver punição. "Em questões fiscais e no caso específico, não poderia mais prevalecer a multa cobrada e que é relevante, de 75%."

O tributarista Maurício Barros, do escritório Zilveti e Sanden Advogados, considera o argumento forte para discutir a retroatividade do novo dispositivo. O argumento pode ser uma solução, principalmente depois do julgamento do caso Ratinho. "Embora seja somente um primeiro julgamento, a decisão é precedente desfavorável para a corrente que defende a retroatividade do artigo."