Título: Governança é a luz no fim do túnel
Autor: Camba, Daniele e Vieira, Catherine
Fonte: Valor Econômico, 14/09/2006, EU & Investimentos, p. D1

Depois de tantos problemas desde a privatização da Telebrás, que causaram prejuízos aos bolsos de muitos investidores, só um choque de governança corporativa pode fazer com que as empresas de telefonia voltem a ter ao menos parte do brilho que um dia tiveram no mercado de capitais brasileiro.

Apesar de toda a polêmica - com fatores como a relação de troca entre ordinárias (com direito a voto) e preferenciais (sem direito a voto) e o direito de voto das ordinárias na assembléia que aprovará o assunto -, a reestruturação da Telemar é vista como o pontapé inicial para essa nova fase do setor.

A operação consiste em transformar todas as ações preferenciais em ordinárias. Assim, a empresa iniciaria o processo de pulverização do seu capital. A idéia é incorporar todas as companhias do grupo na Oi Participações e migrar para o Novo Mercado da Bovespa - aderindo aos padrões máximos de governança. Entre eles, o direito dos minoritários receberem o mesmo valor pago ao controlador no caso de troca de controle ("tag along" de 100%) e adesão à Câmara de Arbitragem para resolver conflitos, em substituição à Justiça Comum.

"Independente dos problemas da operação, ela coloca a Telemar num nível muito superior de governança, possibilitando que as ações, que há três anos estão abaixo do Ibovespa, finalmente andem", diz a analista da Fator Corretora, Jacqueline Lison. Além do prêmio pela governança, as ações devem ter um potencial maior de valorização devido ao aumento de liquidez em bolsa e por causa da distribuição maior de dividendos que a empresa divulgou que fará.

Com a valorização dos papéis, a relação entre o valor da empresa e a geração de caixa operacional (o EV/Ebitda) - que dá uma idéia do prazo de retorno do investimento - da Telemar iria aumentar e seria, no mínimo, de 4,5 vezes para 2007, passando o da Telesp, uma das melhores do setor, de 4,3 vezes, segundo projeções do analista da Corretora Unibanco, André Rocha. Já o retorno obtido apenas com a distribuição de dividendos (o "dividend yield") subiria dos atuais 7% para algo em torno de 16%.

Os analistas, no entanto, não deixam de ressaltar os problemas que existem na operação. "Tudo isso só vale com uma relação de troca melhor aos preferencialistas", completa Rocha.

A falta de governança é o calcanhar-de-aquiles do setor de telefonia e é o que permite que as empresas façam operações no mínimo duvidosas quanto ao tratamento dado aos minoritários. Esse tipo de operação vem afugentando principalmente grandes investidores estrangeiros. Apenas a Brasil Telecom faz parte do Nível 1 da Bovespa - o mais brando entre os três degraus de boas práticas da bolsa - que exige, por exemplo, 25% do capital em circulação no mercado ("free float") e reuniões periódicas com analistas. Mas o Nível 1 não exige "tag along" adicional ao que já está previsto na Lei das S.A. (de 80% para as ordinárias) e nem adesão à arbitragem.

Além de controladores resistentes em dividir poder e direitos com os demais acionistas, a decisão tardia das teles em aderir as boas práticas tem a ver com as condições do mercado. "Como a bolsa não era um veículo de captação de recursos, as empresas não se preocupavam em ter boas práticas, mas com o reaquecimento do mercado tiveram que mudar de postura", diz Rocha.

"A bolsa caminha para as melhores práticas e quem ficar de fora terá suas ações cada vez mais prejudicadas", diz Jacqueline. O problema é a forma com as empresas estão se reestruturando para entrar no Novo Mercado. (DC e CV)