Título: O peso das incertezas
Autor: Camba, Daniele e Vieira, Catherine
Fonte: Valor Econômico, 14/09/2006, EU & Investimentos, p. D1

Brigas societárias, insegurança regulatória, competição acirrada e altos custos para atualização tecnológica estão afastando o investidor das ações do setor de telecomunicações. Nem bem a poeira baixou na polêmica envolvendo a reestruturação da Telemar, veio o anúncio da possibilidade de a Telecom Itália se desfazer da TIM no Brasil.

O menor interesse pelos papéis aparece na queda da participação do setor de telecom no Ibovespa e no mercado de opções de ações. O setor, que teve seu auge na época que antecedeu a privatização da Telebrás, com peso de 50% no Ibovespa, hoje responde por 15,5% do índice. As opções foram pelo mesmo caminho. Em 2003 e 2004, as opções das ações preferenciais (sem direito a voto) da Telemar respondiam por 85,6% do total de negócios com opções. Em 2005, as opções continuavam na liderança, mas já tinham caído para 74,7%. Em janeiro deste ano, as opções da Telemar passaram a representar apenas 21,23%, perdendo o posto das mais negociadas para as preferenciais da Petrobras, com participação de 58,33%. Em agosto, estavam em quarto lugar - atrás de Petrobras, Vale do Rio Doce e do Ibovespa -, com participação de apenas 3,96%.

O reflexo das incertezas se mostra no bolso do investidor, já que as ações do segmento há muito estão longe de ser as principais recomendações dos analistas. No ano, o Índice de Telefonia (Itel) registra uma queda de 8,94% frente a uma alta de 9,25% do Ibovespa. "Muita coisa mudou depois da privatização da Telebrás e as teles dificilmente voltarão a ser as 'blue chips' da Bovespa, como a Telebrás era no passado", diz o analista da Corretora Unibanco André Rocha.

Por melhor que seja o fundamento de uma empresa de telefonia, surge a todo momento um fato novo que muda o cenário, diz o sócio da Fides Asset Management, Roque Sut Ribeiro. "Isso acaba deixando um certo desânimo em relação ao setor". Para ele, questões societárias são hoje os fatores preponderantes no cenário negativo. Até mesmo fundos especializados, como os multimercados de arbitragem long/short estão deixando de especular com os papéis do setor - um de seus preferidos no passado - diante da volatilidade.

A indefinição de como vai ficar a estrutura de controle de empresas importantes como BrT e Telemar é apenas a face mais visível de todo esse processo de mudanças. Os analistas lembram que os grupos brasileiros que entraram na privatização não eram do setor, mas investidores financeiros, e que é natural que queiram agora realizar lucros e partir para novos projetos.

A privatização da Telebrás acabou unindo também investidores com perfis muito diferentes - fundos de pensão, bancos nacionais e estrangeiros e operadoras internacionais de telefonia. Esses investidores em vários momentos decisivos discordam entre si, prejudicando a companhia e, conseqüentemente, suas ações em bolsa. As brigas na Brasil Telecom são um exemplo emblemático com os fundos de pensão, o Citibank, o Opportunity e a Telecom Itália.

Na dúvida do que irá acontecer, o investidor prefere ficar fora do setor todo. A Brasil Telecom contaminou o segmento inteiro e, antes da reestruturação, o investidor já evitava comprar as ações da Telemar, com medo que o mesmo desentendimento entre os controladores visto na BrT ocorresse também na companhia.

Os cenários operacional e regulatório para essas companhias são igualmente complexos. A velocidade das mudanças tecnológicas, por exemplo, cria dúvidas sobre a capacidade de as empresas acompanharem esse movimento. "Essas mudanças tanto podem canibalizar os serviços atualmente prestados quanto agregar muito valor ou complementar o que é feito hoje", avalia Alexandre Garcia, analista da Corretora Ágora.

Os investidores também se decepcionaram com o desempenho das companhias. Depois da privatização, havia uma expectativa enorme de que os resultados cresceriam diante da grande demanda reprimida por telefones. Só que depois que as empresas atenderam as metas de universalização da Anatel, o crescimento minguou e o cenário passou a ser o pior dos mundos para o investidor.

"As empresas não têm nem crescimento e nem dividendos para oferecer aos acionistas, pois usam os recursos para reduzir dívida", lembra Rocha, do Unibanco. A exceção é a Telesp Fixa que distribui bons dividendos para remunerar o controlador, que possui 90% do capital. Já na BrT e Telemar, por exemplo, os controladores possuem apenas 18%, portanto, o dividendo não os beneficia na mesma proporção. Mas a expectativa é de que a situação do setor mude, pelo menos na linha de um aumento de dividendos. "As teles fixas estão num cenário de estabilidade ou queda nos investimentos e tendem a gerar caixa e pagar dividendos muito mais do que ter um grande crescimento", diz Garcia da Ágora. As teles fixas representam muitas vezes cerca de 80% do negócio das empresas de telecom e são as que adicionam mais lucro.

A saída para o crescimento é a convergência dos serviços, transformando as companhias em grandes provedoras de telefonia fixa, móvel, banda larga, TV a cabo e transmissão de dados. Nisso, diz Rocha, do Unibanco, a Telemar está mais bem posicionada que a BrT. "O Brasil tem espaço para três companhias que atuem em todos os segmentos e que assim conseguirão ter resultados melhores em todas as áreas", diz a analista da Fator Corretora Jacqueline Lison.