Título: Queda das commodities é novo sinal de mudanças
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Fonte: Valor Econômico, 14/09/2006, Opinião, p. A12

Em maio e junho, o redirecionamento dos ativos de investidores internacionais deu um tombo nas principais bolsas do mundo. Agora, foi a vez das commodities assustarem produtores e investidores, com o início de uma onda de baixa cuja profundidade ou duração são incertas. Ambos os movimentos são prenúncios de mudanças, que podem ou não ser turbulentas, na velocidade de crescimento da maior economia do mundo, os Estados Unidos, e de seus efeitos sobre a expansão global. Enquanto as alterações de portfólio não tiveram efeitos significativos sobre o Brasil, uma virada nas commodities pode ser fator moderado de contenção das exportações e da atividade interna.

A maior onda de crescimento da economia mundial dos últimos 30 anos pode estar perto do fim. Ela produziu um salto nas cotações dos metais e do petróleo, que ensaiam agora um refluxo diante das preocupações com a possibilidade de uma recessão nos EUA. No Panorama da Economia Mundial, divulgado pelo Fundo Monetário Internacional, os técnicos da instituição consideram insustentável a manutenção das atuais cotações dos metais, separando seus destinos do das commodities agrícolas e do petróleo, que têm rumos distintos. Excluído o petróleo, as commodities perfazem 14% do comércio mundial - com ele, o número sobe para 21%. Os preços dos bens agrícolas, embora tenham subido no atual ciclo de expansão, tiveram alta moderada e, em alguns casos, recuo em relação a 2002. Já os metais, segundo índice do FMI, subiram 180% em termos reais na comparação de 2006 com 2002.

Não há consenso quanto à direção das cotações dos metais porque novos atores agiram na disparada atual. A China foi o principal deles. Desde 2000, o apetite chinês foi o responsável por todo o aumento do consumo mundial de zinco e chumbo e mais de 50% no consumo de alumínio, cobre e aço, com efeitos óbvios sobre os preços. O efeito China sobre as commodities agrícolas não foi tão intenso. Parte do mercado hoje aposta que a China não vai parar de crescer tão cedo - logo o consumo continuará sendo sustentado pela demanda chinesa, coadjuvada pela indiana. A avaliação é que o desenvolvimento acelerado da Ásia, puxado pela China, se transformou em um fator praticamente estrutural para o mercado no médio prazo. Esse cenário pressupõe ainda que os EUA não desacelerem drasticamente.

Já as perspectivas traçadas pelos economistas do FMI levam em conta que os preços altos criaram um aumento da oferta que logo levará o mercado a derrubar as cotações. Sem traumas na economia americana, o FMI prevê, por exemplo, que o consumo de alumínio e cobre vá crescer 5,6% e 4,8% entre 2006 e 2010, mas seus preços recuarão 35% e 57% até o fim da década, basicamente pela elevação da produção desses insumos. Os preços podem não cair tanto quanto deveriam, alerta o estudo, porque dependem dos altos preços da energia, um importante componente de seu custo produtivo. O FMI atribui boa parte da alta dos metais aos baixos investimentos nos períodos de vacas magras a partir da metade dos anos 90 até o início do novo século, que abriram um fosso entre procura e demanda que será preenchido com a maturação de projetos impulsionados pela recuperação do mercado. Em suas simulações, o Fundo constata que o papel da especulação nos mercados de commodities foi praticamente irrelevante para a alta das cotações, embora aponte a maior presença de investidores institucionais nesses mercados.

Há mais dúvidas que certezas no horizonte. É possível que a recente redução do ritmo de crescimento industrial e dos investimentos na China levem o país a um crescimento mais moderado, reforçando os efeitos da desaceleração americana e puxando para baixo os preços das commodities. Por outro lado, uma desaceleração mais forte dos EUA retirará ímpeto das demais economias e também da China, que se apóia pesadamente nas exportações. O que parece certo é que o boom dos preços ficou para trás e isso afetará ao longo do tempo as exportações brasileiras. O país exportou US$ 20 bilhões em 2005 de minérios (US$ 12 bilhões) e metais. A maior fatia, a de minério de ferro, está garantida até 2007 por contratos, que tiveram dois anos de reajustes espetaculares - 72% e 19%. O futuro tende agora a ser menos promissor para esses setores.