Título: Descrença causa baixa em ações da Petrobras
Autor: Hessel, Rosana ; Iunes, Ivan
Fonte: Correio Braziliense, 30/10/2010, Política, p. 2

Investidores recebem com desconfiança o potencial das novas reservas. Analistas falam em uso político da empresa O mercado reagiu com ceticismo ao anúncio da nova descoberta de petróleo na camada pré-sal feita ontem pela Agência Nacional do Petróleo (ANP). Apesar de a autarquia anunciar que o volume do poço em área totalmente pertencente à União pode superar as atuais reservas brasileiras, de 14 bilhões de barris, não ocorreu a mesma empolgação de 2006, quando foi anunciada a primeira descoberta de petróleo na camada pré-sal de Tupi, mais próxima à Baixada Santista (SP). ¿Naquela época, as ações da Petrobras chegaram a subir cerca de 30% em um único dia¿, comenta o economista Demetrius Lucindo, da corretora Prosper.

Ontem, as ações preferenciais (sem direito a voto, mas com prioridade no recebimento dos dividendos) da estatal caíram 1,56%, fechando a R$ 25,85, apesar de ter contabilizado alta de 6,73% na semana, especialmente por conta do anúncio de uma descoberta de petróleo na camada pós-sal (mais rasa do que a pré-sal) no litoral dos estados de Sergipe e de Alagoas, mas ainda sem estimativa de capacidade. Esse anúncio elevou os ganhos dos papéis da companhia e ajudou a minimizar a queda do Ibovespa na semana. As ações ordinárias (com direito a voto) fecharam ontem a R$ 28,55, com queda de 0,87% no dia. No ano, os papéis da companhia acumulam uma desvalorização em torno de 30%.

O anúncio da ANP a dois dias das eleições gera ainda mais desconfiança do mercado quanto ao uso da estatal como ferramenta política do governo, avalia Lucindo. A mesma opinião é compartilhada pelo estrategista-chefe do Banco WestLB do Brasil, Roberto Padovani. ¿A queda nas ações da Petrobras é reflexo de que as dúvidas em torno do futuro da empresa permanecem, uma vez que o risco do papel só aumenta¿, diz ele. ¿O resultado da companhia não é favorável e o risco político também tem crescido e só tende a desvalorizar os papéis da Petrobras¿, completa o executivo do banco alemão.

Outra dúvida que paira no mercado é sobre a real capacidade desse novo poço. A estimativa da ANP é que o volume de Libra varie entre 3,7 bilhões a 15 bilhões de barris (espaçamento muito grande na percepção dos analistas). Entretanto, o mais provável é que Libra some 7,9 bilhões de barris, de acordo com um comunicado da ANP citando a avaliação da certificadora Gaffney, Cline & Associates.

Contraponto Nem todos estão pessimistas. O RBC Capital Markets informou em nota que a sequência de descobertas de grandes reservas no Brasil funcionará como um catalisador positivo para o crescimento econômico do país, com a atração de investimentos para o país.

LEQUE DE INCERTEZAS Se atingir 15 bilhões de barris, a nova descoberta de petróleo da camada pré-sal no litoral brasileiro pode ser a maior do mundo desde 2000, quando o Cazaquistão descobriu 17,2 bilhões de barris na área de Kashagan. No entanto, o novo poço em Libra, na bacia de Santos, abre um leque de dúvidas sobre como serão as próximas capitalizações da Petrobras orquestradas pela União. A estatal tem um plano de investimentos ambicioso, de US$ 224 bilhões até 2014, e os últimos balanços têm mostrado que a companhia não tem tanto fôlego para bancar esse investimento, pois o caixa da empresa vem encolhendo. ¿O endividamento da Petrobras só aumenta, o que compromete o futuro e a possibilidade de uma elevação nos preços das ações da empresa¿, alerta o estrategista-chefe do Banco WestLB do Brasil, Roberto Padovani.

A megaoferta de ações da Petrobras, realizada no fim de setembro, gerou uma série de críticas do mercado, especialmente pela demora na realização do processo no qual a União aumentou sua fatia e diluiu a participação dos acionistas minoritários. Nesse período, o valor da companhia foi corroído e hoje acumula uma desvalorização de 30% desde o início do ano.

Além disso, a capitalização levou para o caixa da estatal cerca de R$ 40,2 bilhões e não os R$ 120,2 bilhões anunciados pelo governo com a operação. Isso porque a maior parte dos R$ 80 bilhões injetados pela União, seja via Fundo Soberano ou BNDES, foi proveniente da cessão onerosa, ou seja, do contrato no qual o governo cedeu 5 bilhões de barris do pré-sal ainda não explorados para a estatal. Vários bancos nacionais e estrangeiros já reduziram a classificação das ações da Petrobras após a capitalização. Ontem foi a vez da corretora Link, do banco suíço UBS, fazer o mesmo. (RH)