Título: Banco médio recupera captação
Autor: Carvalho, Maria Christina
Fonte: Valor Econômico, 15/09/2006, Financas, p. C1

Os bancos médios abalados pela crise de liquidez que se seguiu à quebra do Banco Santos já se recuperaram em sua grande maioria. Oito de doze bancos médios examinados fecharam o primeiro semestre com um volume de depósitos a prazo igual ou superior ao patamar de junho de 2004, antes portanto da quebra do Banco Santos, que foi em novembro. E nove têm depósitos a prazo superior ao que possuíam em dezembro daquele ano. Em conseqüência do alívio, a carteira de crédito de dez já está acima de junho de 2004.

"Os bancos médios já superaram os problemas de liquidez que surgiram após a quebra do Banco Santos. Os recursos voltaram em boa parte. Quem conseguiu mudar a estrutura de captação, sobreviveu. Os bancos se reinventaram", afirmou o presidente da Austin Ratings, Erivelto Rodrigues.

Os mais afetados, lembrou Rodrigues, tinham carteiras de mais longo prazo, com operações de financiamento de veículos e crédito consignado, por exemplo. A quebra do Banco Santos retraiu muitos aplicadores, especialmente investidores institucionais, que preferiram canalizar seus recursos para os grandes bancos. Como as captações venciam a cada 30 dias esses bancos se viram, de repente, sem funding para bancar as carteiras de crédito.

Não sofreram tanto os bancos que tinham carteiras mais curtas. As operações de middle market, por exemplo, giram a cada 45 dias. Foi só reduzir a carteira para se adaptar.

A estratégia, nos dois casos, foi mudar a estrutura de funding. Uma alternativa foi trocar os depósitos a prazo por cessões de carteira para os grandes bancos de varejo e, mais recentemente, inclusive bancos de investimento estrangeiro. Outros bancos lançaram fundos de investimento em direitos creditórios (FDICs), muitos deles lastreados em crédito consignado. E, nos últimos meses, aproveitando a maré favorável no mercado internacional, os bancos médios estão realizando captações no exterior.

Em alguns casos, o ajuste teve que ser mais drástico como foi o caso do Banco Rural, cuja carteira de crédito era em junho um terço do tamanho de dois anos antes, saindo de R$ 3,8 bilhões para R$ 1,2 bilhão. Além do aperto de liquidez causado pelo Banco Santos, o Rural teve a imagem afetada pelo seu envolvimento na crise do mensalão. Mas, ressaltou Rodrigues, "o banco se enxugou e hoje superou os problemas".

A recuperação dos depósitos não quer dizer que o céu é de brigadeiro para os bancos médios. Os grandes bancos estão criando departamentos para entrar nos nichos típicos das instituições de médio porte, acirrando a competição. O teto para o consignado também vai na mesma direção.

"Para concorrer com os grandes bancos e sobreviver, os bancos médios terão que ser muito eficientes", disse Rodrigues.

Os balanços do primeiro semestre deste ano refletem a nova fase dos bancos médios. O forte aumento das operações de crédito alavancou os resultados do primeiro semestre do BicBanco, que teve um lucro líquido de R$ 52 milhões no período, 18,4% superior ao do primeiro semestre de 2005. A carteira de crédito cresceu 43,7% na comparação entre junho de 2005 e junho passado, passando de R$ 2,511 bilhões para R$ 3,609 bilhões; e 30% apenas neste ano. A previsão é que o crédito crescerá mais 30% no segundo semestre.

Ao contrário de boa parte dos outros bancos médios, o BicBanco não está alavancando sua expansão no crédito consignado. O banco é especializado no crédito para empresas médias, que concentram cerca de 90% da carteira. O Bic não pretende que o consignado supere os 10% da carteira total por uma estratégia de distribuição de risco. Se o volume superar o percentual, a intenção é vender o excedente.

Para sustentar a expansão, o BicBanco diversificou as fontes de captação. Atualmente, 46% do funding é externo, incluindo recursos para o comércio exterior. Nesta semana, anunciou nova captação externa de US$ 150 milhões.

O resultado de alguns bancos especializados no consignado explodiu com a cessão de carteira porque quando essa operação é feita é apropriado de uma só vez o ganho que seria obtido ao longo do prazo do empréstimo. Para manter os resultados exuberantes, porém, a produção deve continuar a todo vapor.

Nem todos querem pedalar indefinidamente a bicicleta. O Banco BMC é um deles. O BMC teve um lucro líquido de R$ 63,8 milhões no primeiro semestre, resultado seis vezes superior ao de R$ 10,1 milhões obtido no primeiro semestre de 2005. Parte do resultado veio do ganho não recorrente com uma ação tributária referente à Cofins. O retorno anualizado sobre o patrimônio líquido médio atingiu 52,2%.

De acordo com nota explicativa do balanço a ação tributária ganha pelo banco aumentou o resultado bruto em R$ 64,802 milhões e o líquido, em R$ 47,613 milhões. O ganho é resultado de reversão de provisão recolhida por conta de Cofins questionada na justiça. O acórdão da Primeira Turma do STJ, publicado em junho de 2006 e transitado em julgado em agosto, decidiu que o BMC tem o direito de continuar recolhendo Cofins somente sobre o faturamento estabelecido pelo artigo 2º da Lei Complementar nº 7.091. Também com base nesse acórdão, o banco pôde reverter da conta de provisão a Cofins excedente à alíquota de 3% sobre o faturamento.

A vice-presidente do BMC, Andrea Pinheiro, informou que, mesmo excluindo esse ganho, o resultado recorrente teria dobrado. Andrea informou que o balanço do semestre foi positivamente influenciado pelo aumento do crédito e pela redução da cessão da carteira.

A carteira de crédito do Banco BMC atingiu R$ 775,1 milhões ao final do semestre, dos quais 51,7% para pessoa jurídica e o restante para pessoa física. A carteira de pessoas jurídicas cresceu 13% sobre dezembro para R$ 389,1 milhões, compreendendo basicamente capital de giro com garantia de recebíveis. Já a carteira de pessoas físicas deu um salto de 46,3% sobre dezembro para R$ 385,9 milhões. Mais de um terço (37%) dessa carteira é composta por financiamento de veículos e 11,5% são empréstimos com garantia de veículos. A grande fatia (51,1%) é de crédito consignado.

No primeiro semestre, o BMC cedeu R$ 396 milhões em crédito para pessoa física entre consignado e financiamento de veículos para o Bradesco, com o qual possui um acordo operacional, outras instituições financeiras e para o Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FDIC) BMC Premium. No semestre anterior, o volume cedido havia sido de R$ 531 milhões. "A diminuição da cessão cria um colchão de rentabilidade para o futuro", explicou Andréa.

O BMC também está recorrendo a captações externas, para diversificar o funding. Nesta semana vendeu US$ 15 milhões ao banco de investimento americano Goldman Sachs. Em maio, já havia captado US$ 35 milhões, completando US$ 50 milhões de um programa de US$ 200 milhões em notas de médio prazo.